O Banco Central e o “forward guidance”

    Agora, a mensagem do Banco CENTRAL ficou clara. Não está nos seus planos baixar a taxa básica de juros tão logo, mas suas decisões futuras dependem da evolução dos dados. Qual é a chance de o Banco CENTRAL mudar a sua estratégia?

    Uma parte relevante do mercado financeiro apostava que o Banco CENTRAL iria cortar os juros já em setembro, repetindo o cavalo-de-pau que promovera em 2011. A semelhança entre os dois períodos é a inflação corrente na vizinhança do teto da meta, de 6,5%, mas há diferenças.

    Três anos atrás, o Banco CENTRAL reagiu a uma forte desaceleração da economia mundial, produzida pela crise na Europa e pelo impasse no aumento do teto da dívida americana. O cenário passou a ser de queda da inflação, que de fato recuou e chegou ao redor de 5% em meados de 2012. Depois, subiu, mas essa é outra história. Hoje, não se vive nada parecido. A notícia de ontem foi a recuperação acima da esperado dos Estados Unidos. O cenário inflacionário ainda não está nada tranquilo.

    BC tenta sinalizar trajetória de juros e sua função reação

    O que parece ser realmente diferente em relação a 2011 é que, agora, o Banco CENTRAL tem procurado guiar o mercado, numa abordagem, pelo menos na intenção, completamente oposta à do cavalo-de-pau . Houve um esforço para sinalizar amplamente o fim do ciclo de aperto monetário, assim como os passos seguintes, ainda que essa comunicação tenha gerado ruídos no mercado.

    A estratégia começou a ser comunicada num discurso do presidente do Banco CENTRALALEXANDRE TOMBINI, no seminário de metas de inflação, em 16 de maio, que indicou que um possível uso do forward guidance estava no radar.

    O forward guidance pode representar mais uma etapa no processo de aperfeiçoamento da comunicação dos bancos centrais, ao sinalizar com mais clareza a expectativa da trajetória da taxa de política , disse. Segundo ele, é um instrumento que pode reduzir a incerteza em relação à função de reação dos bancos centrais.

    Duas semanas depois, o Comitê de política monetária (Copom) manteve, pela primeira vez, os juros básicos da economia em 11% ao ano, mas incorporou pela primeira vez no comunicado a expressão neste momento . Aparentemente, estava aí a indicação do BancoCENTRAL de uma função reação com a qual pretendia trabalhar. Na época, o Valor publicou o significado da mensagem: O BC não jogou a toalha, continuará alerta e voltará a subir os juros se for preciso.

    Na ata dessa reunião, o Banco CENTRAL basicamente explicou por que havia parado de subir os juros (a frase-chave do documento foi que o ritmo de expansão da atividade doméstica tende a ser menos intenso este ano ) e deixou o detalhamento de seu forward guidance para o relatório de inflação de junho.

    O comitê antecipa cenário que contempla inflação resistente nos próximos trimestres, mas, que, mantidas as condições monetárias, tende a entrar em trajetória de convergência para a meta nos trimestres finais do horizonte de projeção , diz o relatório.

    Aqui, o Banco CENTRAL deu uma sinalização mais clara da expectativa da trajetória da taxa de política, em linha com a descrição de forward guidance feita por TOMBINI. Também detalhou o cenário em que essa previsão seria válida: enquanto os juros de 11% forem necessários para vencer a resistência da inflação e fazê-la caminhar para a meta.

    Na entrevista coletiva em que explicou o Relatório de Inflação, o diretor de Política Econômica do Banco CENTRAL, Carlos Hamilton Araújo, foi questionado sobre o tempo que achava que os juros teriam que se manter estáveis para atingir os objetivos desejados, e sobre as hipóteses que poderiam fazê-lo mudar de estratégia.

    Na resposta, Hamilton deixou claro que os riscos no cenário inflacionário pendiam para o lado negativo: A projeção de inflação não mostra uma convergência da inflação à meta. Mostra que entra numa tendência de convergência, mas no ponto final [de nossas projeções, em junho de 2016, a inflação] está em torno de 5%. Uma semana depois, TOMBINI reforçou a mesma mensagem, numa entrevista a uma publicação interna do BC: A política monetária deve se manter vigilante para mitigar riscos . Na reunião de julho, o Copom repetiu o comunicado anterior.

    O mercado financeiro entendeu que os dados mais recentes de fraca atividade econômica poderiam fazer o Banco CENTRAL mudar de ideia. O cenário com que o Banco CENTRAL trabalha, porém, é de que a demanda agregada tende a se apresentar relativamente robusta , porque seguem presentes fatores que vão ajudar a sustentá-la.

    Um deles é o crédito, cuja expansão neste ano está prevista em 12%, que está longe de ser baixa. O chefe do Departamento Econômico do Banco CENTRAL, Túlio Maciel, disse que as medidas de estímulo ao crédito anunciadas na semana passada reduzem as chances de que a projeção do BC para o crédito sejam revistas para baixo. Outro fator é o desemprego historicamente baixo, com salários crescendo em termos reais. O consumo do governo segue alto e tem um peso importante na demanda. O quantum exportado se expande. O ponto de interrogação é a queda dos índices de confiança. Em dezembro de 2013, o BC publicou um estudo no seu Relatório de Inflação mostrando vínculo importante de alguns desses indicadores com a atividade econômica, mas em alguns casos, como o do Indice de Confiança do Consumidor, essa relação ainda não ficou bem estabelecida.

    Do lado da inflação, o ponto central é a resistência. O Banco CENTRAL vislumbra um cenário de crescimento da economia abaixo do potencial e de redução das pressões salariais, que puxa o índices de preços para baixo. Mas a resultante segue desfavorável, porque as expectativas de inflação do mercado não cedem, diante das incertezas sobre reajustes de preços monitorados e sobre a evolução da taxa de câmbio. A aposta é que, assim que essas incertezas sejam superadas, a inflação convirja para a meta, não como resultado de uma lei natural, mas da manutenção dos juros básicos.

    Alex Ribeiro é repórter especial. Hoje, excepcionalmente, deixamos de publicar a coluna de Ribamar Oliveira.

    E-mail: alex.ribeiro@valor.com.br

     

    Fonte: Valor Econômico

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