Pnad mostra estagnação da desigualdade no país desde 2011

    Os programas de transferência de renda, a política de aumento do salário mínimo e a força do mercado de trabalho podem estar perdendo efeito como ferramentas de políticas de combate à desigualdade. Além disso, a inflação mais alta também pesa contra. Daqui para frente, se quiser lidar com o problema, o país precisará ir além. Essa é a avaliação quase unânime de especialistas ouvidos pelo Valor, para os quais o caminho para lidar com o problema é investir pesado na educação pública básica.

     

    A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2013, divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostrou que o Índice de Gini que engloba todas as fontes de renda passou de 0,504 em 2012 para 0,505 em 2013, o mesmo patamar de 2011. O indicador mede o grau de concentração da renda e varia de zero (perfeita igualdade) a um (desigualdade máxima). Como estão incluídas todas as fontes de renda, o indicador já contabiliza recursos provenientes de programas de transferência de renda.

     

    Apesar da ligeira elevação no nível de desigualdade, a renda média cresceu mais de 5,1%, considerando os rendimentos de todas as fontes. Essa aparente contradição seria explicada, segundo alguns especialistas, por uma elevação maior na renda dos mais ricos do que a dos mais pobres e, sobretudo, pelo forte aumento de renda observado nas camadas intermediárias, o que seria a classe média . Esse dado foi citado pela presidente Dilma Rousseff ontem, na tentativa de destacar pontos positivos da pesquisa (Ver\u0026nbsp;Dilma destaca os ganhos de renda da classe média). Considerando apenas os rendimentos do trabalho, a renda cresceu ainda mais, 5,7%.

     

    Na avaliação do professor da PUC-Rio e economista-chefe da Opus Investimentos, José Márcio Camargo, a desigualdade no Brasil parou de cair e está estagnada, porque o país não melhorou sua educação básica. Por dez anos, o Brasil se beneficiou com os aumentos dos preços das commodities. Os preços do que o país exportou subiram mais que os preços do que foi importado. Isso deu a possibilidade de ganhos de produção e de redução de desigualdade , afirma. Só tem uma maneira de reduzir de forma sistemática e de longo prazo esse problema: investindo em capital humano, por meio da melhoria do ensino básico , diz. Segundo ele, no Brasil, se investe sete vezes mais na educação superior do que na fundamental.

     

    Os dados da Pnad mostram que, mesmo com programas de transferência de renda, o ritmo de crescimento da renda dos 10% mais pobres do país foi menor do que o dos 10% mais ricos em 2013, na comparação com 2012. A renda média mensal domiciliar, que inclui o Bolsa Família, atingiu R$ 2.983 mensais em 2013, aumento real de 4% sobre 2012. A alta é quase o dobro da taxa de crescimento observada para o mesmo período entre os 10% mais pobres, cuja renda média mensal domiciliar atingiu R$ 470 mensais no ano passado – 2,1% acima da de 2012. Entre os 10% mais ricos, a renda média domiciliar mensal cresceu 4,4% em 2013 em relação a 2012, totalizando R$ 11.758.

     

    É preciso diferenciar política de combate à desigualdade social de política de combate à pobreza. Para combater a desigualdade, é preciso criar a capacidade de gerar renda, ou seja, distribuir ativo. Hoje, esse ativo é o conhecimento, com uma revolução no acesso ao conhecimento , diz o economista Sérgio Besserman, ex-presidente do IBGE. Mesmo a qualificação de nossa elite é baixa, quando comparada à elite de outros países. Precisamos passar uma década pensando apenas em cultura e educação. Essa é nossa única possibilidade de nos tornarmos uma sociedade menos desigual , afirma.

     

    Camargo concorda e acrescenta que, como um todo, os brasileiros não dão à educação a devida importância. As pessoas mais pobres acabam tendo um nível educacional mais baixo, o que resulta em nível de capital humano também mais baixo. O resultado é que eles vão parar em subempregos. Isso só aumenta a desigualdade. O Brasil, por alguma razão, dá pouca importância ao capital humano , diz Camargo.

     

    O economista Jorge Jatobá, sócio da consultoria Ceplan, afirma que, daqui para frente, o país precisa tomar ações estruturais. Tem de fazer mudanças radicais na educação , afirma.

     

    Para o pesquisador do Ipea Marcelo Medeiros, a Pnad mostra que o mercado de trabalho não é mais o motor da queda da desigualdade: A concentração de renda no Brasil é tão grande que o topo concentra uma parte muito grande da renda. O comportamento desse topo determina a desigualdade.

     

    No mercado de trabalho, a Pnad mostrou que o total de trabalhadores crianças e adolescentes no país caiu 12,3% entre 2012 e 2013, para 3,1 milhões. Esse recuo fez com que a participação de crianças e adolescentes de 5 a 17 anos na população ocupada caísse de 8,4% para 7,4%.

     

    No campo educacional, o analfabetismo das pessoas com mais de 15 anos caiu de 8,7% para 8,3%, totalizando 13 milhões. A taxa está longe do compromisso assumido no Acordo de Dacar (Senegal), pelo qual o país deve chegar a 2015 com analfabetismo em 6,7%. Os que não têm instrução passaram de 11,9% para 12,2%, mas também cresceu a fatia dos quem têm superior completo, de 12% para 12,9%.

     

    Fonte: Valor Econômico

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