Edição 132 – 1/9/2015

Swap cambial: o que temos a ver com isso?


Nunca antes na história deste país o sistema financeiro ganhou tanto dinheiro em tão pouco tempo. E não estamos falando, ainda, dos gastos com os juros da dívida mobiliária federal. Desde 2002, ano da sua introdução no mercado financeiro, o swap cambial tem sido motivo de críticas e denúncias, mas que não haviam tido, ainda, maiores repercussões. Contudo, este ano, a forte desvalorização do real elevou muito os gastos com o uso desse instrumento, chamando a atenção de jornalistas e especialistas. 

Quanto tem custado o swap cambial? 

O Banco Central do Brasil divulgou, na última quarta-feira, o valor pago como ajuste devido a operações com derivativos no mês de julho: R$ 23,9 bilhões. Esse valor nem representa a maior despesa paga através dessa rubrica este ano. Em março, o BCB pagou R$ 34,5 bilhões por conta do swap cambial. Em doze meses, o custo acumulado para o Tesouro Nacional com o pagamento de ajuste aos credores no ambiente da BM&F chegou a R$ 92 bilhões. 

O setor público tem por meta um superávit fiscal primário de 0,15% do PIB este ano, ou R$ 8,7 bilhões. As despesas com o ajuste de swap cambial em 12 meses superam a meta em mais de dez vezes. Essa meta de superávit primário corresponde a praticamente a metade dos gastos com ajuste de swap cambial no ano de 2014. Esses gastos chegaram a R$ 17,3 bilhões e afetaram fortemente as contas públicas daquele ano. 

Destaque-se que esse cálculo não considera as atualizações monetárias, ou mesmo o custo de o BCB retirar o excesso de liquidez resultante do pagamento dos ajustes do swap cambial. Explicando melhor, o BCB “enxuga” o mercado através da venda de títulos públicos, que pagam níveis de taxas de juros que nós conhecemos muito bem. O cálculo dos R$ 92 bilhões gastos com swap cambial considera apenas o pagamento simples, feito na BM&F, com valores acumulados em doze meses até julho. Além desse aspecto, outros envolvem o uso de um instrumento não ortodoxo por parte de um agente que deveria ser o mais cuidadoso possível em suas ações. Todavia, deixemos essa discussão para outra oportunidade. 

Chamam a nossa atenção, as recentemente divulgadas demonstrações financeiras semestrais do BCB: nos primeiros seis meses deste ano, as perdas líquidas com juros (operações com títulos públicos) somaram R$ 37,6 bilhões. Essas perdas foram compensadas pela valorização em reais dos ativos no exterior, que atende pela singela denominação de “Ganhos (perdas) com instrumentos financeiros classificados como Valor Justo por Meio do Resultado, destinados à negociação”, que totalizaram R$ 61,7 bilhões. Incluem-se aí as perdas de R$ 37 bilhões como resultado das operações de swap cambial. A soma de outras rubricas permitiu um resultado positivo de R$ 35,2 bilhões, que a autoridade monetária deverá repassar ao Tesouro Nacional. Ou seja, o BCB usou, na formalização do seu balanço, ganhos de variação de preço de ativo como sendo resultado operacional. 

A contabilidade do BCB deve receber uma análise mais detalhada em próximo Apito Brasil. Porém, antes disso, já podemos pontuar alguns questionamentos. 

Há quem alegue que a despesa com o swap cambial possa ser compensada pela valorização em reais das reservas internacionais. Porém, esse argumento não resiste a 10 minutos de conversa. O uso do ganho de detenção de um ativo – associado à contabilidade de estoque – como fluxo efetivo de resultado, não é prática padrão da contabilidade, para dizer o mínimo. 

A contabilização da valorização das reservas em moeda doméstica como se recebimento de juros fosse, parece ser uma forma de melhorar o resultado contábil devido ao efetivo pagamento do ajuste do swap cambial. Ademais, para ser coerente ao argumento, o mesmo procedimento deveria ser realizado com as contas de patrimônio pelo lado do passivo. No caso, o estoque total da dívida externa do governo também deveria ser valorado e transformado em despesa, com lançamento nas contas do Tesouro Nacional.
 

Como isso afeta a Sociedade? 

Reportagem recente da Folha de São Paulo aponta que o BCB “acumula prejuízo de R$ 86 bi desde agosto de 2013, quando começou a oferecer ‘swap’ cambial para conter moeda. [Essa] intervenção começou a ser usada por FHC em 2002, quando houve perdas de R$ 24 bi, em valores atualizados”. Esse valor equivaleria ao gasto com três Bolsas Família; e é da ordem do orçamento anual da Educação , hoje ligeiramente superior a R$ 100 bilhões.

Poderíamos até estimar quantas famílias a mais poderiam ser atendidas por esse programa social, ou quantos hospitais poderiam ter sidos construídos se o BCB não tivesse perdido tanto dinheiro na BM&F. 

Devemos refletir como esse tipo de transferência de renda está afetando a vida de todos no nosso país, em especial os mais necessitados. Em como os serviços públicos estão deixando de ser prestados porque a autoridade monetária caiu em uma armadilha da qual não consegue se desvencilhar.
 

E nós, servidores do Banco Central, o que temos a ver com isso? 

O aprimoramento do serviço público, no sentido de elevar o bem-estar da Sociedade, é pauta primaz de um sindicato de servidores, que deseje cobrar a justa retribuição pecuniária pelos serviços prestados por seus representados. No nosso caso, ele deve apontar o que pode não ser a melhor prática de atuação da autoridade monetária. O Sinal já o fez em outras ocasiões. 

Além desse papel, a luta sindical funda-se na valorização das atribuições do servidor do BCB. Essa valorização passa pelo melhor aproveitamento da sua capacidade intelectual e criativa, buscando-se atribuições desafiadoras e uma administração da atividade de trabalho mais autônoma. Desse modo, permite-se plena realização profissional dos indivíduos e o melhor uso dos escassos recursos públicos, priorizando-se melhor o interesse da sociedade. 

Atualmente, o processo decisório no Banco Central do Brasil está excessivamente centrado em poucos, que formulam e decidem o que se faz na instituição. Gostaríamos de crer que o BCB usou toda a sua inteligência, constituída por um dos quadros técnicos mais bem qualificados da República, quando decidiu adotar o swap em sua caixa de ferramentas para a política cambial. Infelizmente, os resultados parecem díspares com o que era esperado. 

O desprestígio atual do Banco Central do Brasil talvez tenha no swap cambial uma de suas principais causas. Os dirigentes governamentais e os políticos olham e sabem o que acontece aqui. A indignação com o que pode estar errado e a proposição de alternativas mais eficazes, discutidas no ambiente de trabalho, são práticas que a sociedade espera e as autoridades deveriam cobrar de nós. Provavelmente, tenhamos que lutar muito ainda para mudar essa estrutura decisória do BCB. Mas, certamente, essa é uma boa luta. 

Devemos ousar lutar. Devemos ousar vencer. 

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