Reforma de 2015 gera dúvidas sobre eleições

    A reforma política aprovada em 2015 sob o comando do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e sancionada pela presidente Dilma Rousseff em outubro, incluiu uma mudança no Código Eleitoral que poderia dar uma nova interpretação à regra para eleições em caso de vacância dos cargos do Executivo, como presidente, governadores e prefeitos. A alteração, a que estão recorrendo o PT e o Rede na nova campanha por eleições gerais se houver impeachment, permite que, ao contrário do que estabelece o artigo 81 da Constituição, convoquem-se eleições diretas em qualquer tempo da interrupção do mandato.

    Pela Constituição em vigor, a cassação do chefe do Executivo pela Justiça Eleitoral, ou a vacância do cargo por alguma outra razão, provocaria novas eleições diretas apenas se a vaga ocorresse nos primeiros dois anos do mandato. Nos dois últimos anos, a eleição seria indireta, pelo Legislativo. É o que provavelmente ocorreria caso o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidisse cassar a chapa majoritária que elegeu Dilma Rousseff e Michel Temer. Tramitam no TSE quatro ações, impetradas pelo PSDB, para que a Corte promova a cassação da chapa completa. Dificilmente os processos serão concluídos antes de 2017 – quando a eleição passaria a ser indireta, ou seja, pelo Legislativo, o que contraria a postulação dos partidos que agora fazem campanha pelas eleições gerais.

    A emenda sancionada na reforma política do ano passado alterou o Código Eleitoral para que as eleições diretas ocorram nos casos de cassação da chapa majoritária por crimes eleitorais, em que não exista mais possibilidade de recursos, até os últimos seis meses do fim do mandato.

    O texto pretendia regular a questão da eleição de governadores e principalmente prefeitos, diz o relator do projeto na Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ): “Quando fizemos a emenda não pensamos no presidente, até porque cassação de presidente da República não é algo corriqueiro. Não acho que se aplica”. A ideia era reduzir judicialização nas cidades, afirma.

    “Muitos candidatos são derrotados nas urnas e recorrem aos tribunais regionais, que têm muita interferência política dos governadores”, diz. “Quem quiser assumir agora terá que ganhar no voto.”

    Mas, no entendimento de um ministro do TSE ouvido pelo Valor, deverá ser aplicada também ao presidente da República, por se tratar de regra específica para casos eleitorais e não de vacância por impeachment, renúncia ou morte. A questão não é pacífica e deve gerar intensa discussão sobre até que ponto uma regra do Código Eleitoral pode mudar o entendimento da Constituição.

    Em consulta formulada em março, o deputado Carlos Manato (SD-ES), corregedor da Câmara e aliado de Cunha, pede ao TSE que se pronuncie sobre a questão. O parlamentar fez seis perguntas sobre como será aplicada a legislação. “Há um conflito aparente da norma, que foi pouco debatida no mundo jurídico. Vale o artigo 81 da Constituição ou a regra específica do Código Eleitoral?”, questiona o advogado Marcelo Nunes, que elaborou a consulta. “Na minha opinião, é a regra específica.”

    A área técnica do TSE ainda elabora parecer sobre a consulta, que será encaminhado para a ministra Maria Thereza Assis relatar seu voto. Ela também é a relatora das ações contra a chapa Dilma-Temer. O parecer será votado no plenário do TSE, que formará um entendimento a ser aplicado.

    Na avaliação de um ministro do Tribunal, porém, a resposta ainda não será um posicionamento concreto sobre o que ocorreria no caso da cassação da chapa presidencial PT-PMDB porque a chapa foi eleita com as regras eleitorais de 2014 e a mudança foi feita em 2015. Assim, as novas regras valeriam apenas para as eleições a partir de 2016.

    Outro fator de incerteza é a morosidade judicial, pois o TSE só poderá convocar novas eleições após o trânsito em julgado da ação. Ou seja, mesmo se a chapa Dilma-Temer for cassada pelo plenário do TSE, há possibilidade de recorrer no próprio tribunal e depois ao Supremo Tribunal Federal via embargos declaratórios. É um processo demorado e que dificilmente terminaria antes da eleição presidencial de 2018.

    A ideia de PT e PCdoB, além do Rede, porém, é aproveitar o clima de contestação ao mandato de Temer nos tribunais, somado ao discurso de golpe no Congresso e nas ruas, para enfraquecer o pemedebista e forçar outra solução. “O vice-presidente não recebeu votos, ele não foi eleito. Ele é proclamado eleito graças à eleição da presidente”, diz o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), que votou a favor do impeachment de Dilma e defende novas eleições.

    Fonte: Valor Econômico

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