André Lara Resende, ex-BNDES: “Autonomia financeira do BC é um regresso de 100 anos”

    “O risco à autonomia do BC é uma questão de sua dotação orçamentária. Para resolver isso, não precisamos de uma PEC tocando em assuntos tão difíceis, complexos e potencialmente problemáticos”, afirmou o economista
    André Lara Resende, ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)
    André Lara Resende, ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) (Foto: Geraldo Magela/Agência Senado)

    Embora tenha defendido a necessidade de se aprimorar o “quadro institucional” das autoridades monetárias no Brasil e no mundo, o economista e banqueiro André Lara Resende, ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), afirmou que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 65/2023, que concede autonomia financeira e orçamentária ao Banco Central (BC), é um enorme retrocesso.

    Lara Resende, de 73 anos, participou, nesta terça-feira (18), de uma audiência pública que debateu o tema na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Em linhas gerais, a PEC transformaria o BC, uma autarquia federal com orçamento vinculado à União, em empresa pública com total autonomia financeira e orçamentária, sob supervisão do Congresso Nacional.

    “O BC tem sido um órgão extraordinariamente competente. O BC precisa ter recursos em seu orçamento para manter um quadro bem remunerado e fazer investimentos necessários para a melhoria do sistema de pagamentos, que está em rápida mudança”, reconheceu Lara Resende.

    Segundo o economista, “o BC tem hoje autonomia operacional, algo que está consolidado na teoria e na prática”. “Essa autonomia, mesmo antes de estar formalizada em lei, já era respeitada mesmo antes do governo Lula. O BC do Brasil, portanto, é e sempre foi independente”, afirmou.

    “O aprimoramento do quadro institucional das autoridades monetárias e fiscais de um país precisa estar em permanente revisão. Dito isso, eu vejo inúmeras dificuldades jurídicas e criação de problemas jurídicos para frente”, ponderou o economista. “O que parece é que o risco à autonomia do BC é uma questão de sua dotação orçamentária. Para resolver isso, não precisamos de uma PEC tocando em assuntos tão difíceis, complexos e potencialmente problemáticos.”

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    “O Brasil não pode ficar dependente do compromisso de cada presidente eleito. É fundamental ter a garantia de perenidade dessa autonomia”, disse Henrique Meirelles, ex-chefe do BC, em audiência na CCJ do Senado

    De acordo com Lara Resende, a PEC “retira o orçamento do BC do orçamento da União, da LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias]”. “Você tira o orçamento do BC da LDO e abre um espaço, inclusive, para gastar na LDO. Que fontes são essas que financiariam o BC? Veja o que nós estamos abrindo de potencial de gastos no setor”, observa.

    Para Lara Resende, “o BC terá um estímulo perverso” caso o projeto seja aprovado. “Quanto mais alta for a Selic, maior a remuneração de seu orçamento”, afirma.

    “Se o problema é que o orçamento da União está apertado, nós precisamos rever o orçamento da União, revisar isso. E não jogar o problema para baixo do tapete”, opinou o economista.

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    “Em larga medida, o BC fixa as metas para si mesmo. Ele é mais independente do que se imagina”, afirma o economista Paulo Nogueira Batista Júnior, que participou de audiência pública na CCJ do Senado

    “A PEC 65, como ela está, não é um avanço institucional. É um profundo regresso. É uma volta à ideia das atribuições do BC executadas por um banco público-privado, pré-1945. São anos de cuidadosa evolução na organização do sistema financeiro brasileiro, e a PEC, como está, é claramente um regresso de mais de 70 anos, de 100 anos atrás”, complementou Lara Resende.

    “Nós podemos voltar a um quadro de fragmentação fiscal, de balcanização fiscal, em que o orçamento da União se torna, mais uma vez, uma peça de ficção, algo completamente irrelevante.”

    Fonte: InfoMoney

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