Bancos dizem que não houve vencedores

    Para advogados de instituições que podem perder R$ 150 bilhões, inflação alta prejudicou todo mundo

    PAULO SILVA PINTO
    VICTOR MARTINS

    O embate entre os advogados de bancos e seus clientes se intensificou no final da sessão de ontem do Supremo Tribunal Federal (STF), em que foram discutidas ações sobre a remuneração das cadernetas de poupança nas décadas de 1980 e 1990. Diante de números diferentes apresentados, o presidente da Corte, Joaquim Barbosa, irritou-se. Disse que os advogados deveriam apresentar dados de auditorias independentes e fazer uma sustentação com fundamentos. “Os advogados deveriam se ater a números verificados por peritos”, afirmou.

    O advogado do banco Santander, Marcos Cavalcanti de Oliveira, enfatizou em plenário que não houve vencedores na regra aplicada durante os planos econômicos. “Somos todos perdedores para a inflação”, salientou. A correção foi a mesma para os depósitos em poupança e para os empréstimos do Sistema Financeiro de Habitação (SFH).
    Essa neutralidade, porém, foi contestada pelo único advogado dos poupadores a falar, Luiz Fernando Casagrande Pereira. Segundo ele, estudo realizado pelo economista Luís Roberto Troster, que já trabalhou para a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), demonstra que metade dos recursos da poupança não foram aplicados no SFH na época dos planos econômicos. “Isso aumentou o faturamento dos bancos em R$ 420 bilhões. Se 20% disso foi lucro, eles ganharam R$ 90 bilhões”, argumentou.

    Indagado pelo Correio sobre o peso desse descasamento entre o volume financeiro dos depósitos da poupança e dos empréstimos do SFH, o procurador do Banco Central, Isaac Sidney Ferreira, minimizou o problema. “Não é isso que está em questão neste julgamento. O que importa é que ambos tiveram a mesma correção: poupança e SFH”.
    Casagrande afirmou também que os bancos já fizeram provisionamento dos valores reivindicados pelos clientes nos processos, ou seja, já reservaram recursos para esse pagamento, contando com o risco de perder a batalha judicial. Segundo o advogado, a Caixa separou R$ 1 bilhão para as ações de planos econômicos, um terço do total de provisionamentos. Aplicando a mesma proporção para outros bancos, que não entram nesses detalhes nos balanços, o total reservado seria de R$ 6 bilhões. Cavalcanti, do Santander, contestou a conta. “Não se pode aplicar regra de três para isso”. Ferreira, do BC, disse que os bancos só podem provisionar ações já julgadas, não processos em andamento, do contrário acabariam pagando menos impostos.

    Os bancos alegam que os poupadores, em vez de recuperar perdas, buscam ganhos extraordinários. Segundo a Febraban, no Plano Bresser, o investidor que deixou o dinheiro na poupança apenas em junho de 1987, teve correção de 18%, enquanto o Índice Nacional de Preços (INPC) variou 26,1%. Mas, em quatro meses, até setembro, o INPC foi de 46%, enquanto a poupança rendeu 47,8%, tendo subido acima da inflação nos três meses posteriores a junho. O índice pleiteado pelos poupadores nas ações no Supremo é de 57,9%.

    Além da discussão econômica, há outra institucional, quase filosófica. “Se o Supremo decidir que é inconstitucional o governo tomar decisões sobre a moeda, as consequências para o país serão muito complicadas”, disse o ex-ministro da Justiça Márcio Tomas Bastos, que defende os bancos.

    O ministro Marco Aurélio de Mello disse, no início da sessão, que “não estão em discussão apenas valores pecuniários”. Casagrande, advogado dos poupadores, discorda, afirmando que a matéria é infraconstitucional. “Os bancos escolheram uma forma ilegal de corrigir a poupança.”

    Rombo bilionário (Em R$ bilhões)
    Confira o impacto no caixa das maiores instituições, segundo o governo:

    Planos Caixa Outros bancos Total
    Bresser (junho de 1987) 7,63 12,85 20,49
    Verão (janeiro de 1989) 16,10 31,95 48,05
    Collor I (março de 1990) 23,94 50,15 74,09
    Collor II (fevereiro de 1991) 2,15 5,11 7,27
    Total geral 49,83 100,07 150,0

    Fontes: Banco Central, Ministério da Fazenda e Idec

     

    Fonte: Correio Braziliense

     

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