ROSANA HESSEL
VICTOR MARTINS
O Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, foi o palco escolhido pela presidente Dilma Rousseff para disseminar a ideia de que o modelo econômico do Brasil está mudando. Ontem, no segundo dia do evento, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, deu sinais desse reposicionamento frente ao setor privado, ao indicar mais seriedade nas contas públicas, o que inclui corte de gastos e a interrupção de políticas como a desoneração tributária de setores produtivos. O governo brasileiro assume o risco de tomar medidas inicialmente impopulares baseado na confortável margem de aprovação da chefe do Executivo nas pesquisas feitas com eleitores — em dezembro, a gestão da petista foi considerada boa ou ótima por 41% dos entrevistados.
No encontro, o ministro brasileiro enfatizou que o controle da inflação será sempre uma prioridade e lembrou que uma nova meta de superavit primário para balizar o governo será decidida em fevereiro, paralelamente ao anúncio do montante de contingenciamento dos recursos em 2014. Além disso, Mantega afirmou que as mudanças nacionais vão na direção quase inversa às adotadas pela China, que tem se voltado para o mercado interno. Ele reiterou que, no Brasil, o mercado consumidor é mais “avançado” graças à inclusão de mais de 40 milhões de pessoas na classe média. Apesar disso, ele reconheceu que “o crédito (no país ainda) é escasso”.
“O mais importante agora é o investimento que vai puxar o crescimento da economia brasileira. E é por isso que o governo está estimulando-o no Brasil”, afirmou. O ministro disse que US$ 250 bilhões deverão ser aplicados no país em concessões na área de infraestrutura. Com fala prevista para hoje, a presidente Dilma — que, pela primeira vez, participa do fórum — também deve se empenhar na missão de conquistar o interesse dos empresários pelos próximos leilões. Para isso, ela possivelmente deixará o discurso de esquerda de lado para se ater às temáticas atrativas aos investidores.
Para garantir que o Brasil é atraente, Mantega fez questão de dizer que os indicadores ruins do país e dos demais emergentes dos Brics (que reúne ainda Rússia, Índia, China e África do Sul) são culpa da crise que atingiu as nações desenvolvidas. “Acredito que os Brics continuarão liderando o crescimento da economia mundial. Porém, para que isso ocorra, é preciso que eles façam mudanças importantes nos seus modelos de expansão”, disse ele, durante um painel sobre a crise da meia-idade do grupo. Uma pesquisa da consultoria Accenture divulgada no encontro revelou que 60% das empresas entrevistadas esperam realocar os investimentos feitos nos países incluídos no acrônimo para outros mercados. Foram ouvidos mais de mil executivos.
Doutor em economia pela Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, e coordenador do Movimento Brasil Eficiente, Paulo Rabello de Castro crê que o redirecionamento no discurso do Brasil é resultado de uma estratégia de marketing. “O governo apenas repete o que todos já sabem. Ele quer mostrar para o eleitor que Dilma é capaz de constituir uma descontinuidade dentro da continuidade. Resta saber se as mudanças realmente ocorrerão”, afirmou.
Frágil
O economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, também não espera um resultado prático desse novo posicionamento, pois, segundo diz, o quadro macroeconômico não permitirá mudanças drásticas. “Dilma chega a Davos quando o Brasil está mais para fragile five (os cinco mais frágeis) do que para Brics, ou seja, quando o humor do mercado já mudou radicalmente em relação ao país”, destacou Vale, ao dizer que os demais quatro países em situação delicada são Índia, Indonésia, África do Sul e Turquia. Para Marcos Troyjo, professor da Universidade Columbia, em Nova York, esse discurso mostra que “o Brasil começou a descer do salto alto”, mas ele acredita que estará imobilizado até janeiro de 2015.
Fonte: Correio Braziliense