Às vésperas do Fed, emergentes vivem forte tensão

    Por Roberta Costa | De São Paulo

    A poucos dias da reunião do Federal Reserve (banco central dos EUA), que acontece nesta quarta-feira, o clima pesou para alguns países emergentes – como a Argentina, novamente diante de uma crise cambial.

    Mas este não é o único ponto que chama atenção. Tensões políticas exacerbam movimentos de depreciação cambial também na Venezuela, Turquia, Ucrânia, Tailândia e África do Sul.

    Com peso muito maior, a desaceleração da China, embora tão antecipada pelo próprio governo e pelo mercado, tempera um ambiente de aversão ao risco que, de certa forma, não se via desde o “sell-off” (venda generalizada de ativos) de maio a setembro do ano passado.

    Depois que o “tapering” (início da redução dos estímulos monetários) virou realidade, com a sinalização do Fed em maio e o anúncio em dezembro, muitos analistas apostaram que a reação tão comportada dos ativos mostrava um mundo muito mais equilibrado. Portanto, o risco de repetição do mal-estar com perspectiva de que os fluxos internacionais mudariam de rota parecia equalizado. Mas as coisas não são bem assim.

    Nem tanto o processo de redução das compras pelo Fed se insinua caótico, nem tanto tem efeitos pouco perceptíveis. Dependerá da forma econômica em que se encontra a saúde dos países mais dependentes de fluxos internacionais. Uma questão de fundo para o Fed é o quanto esses acontecimentos entrarão na conta de suas ações nos próximos meses, agora sob a administração de Janet Yellen.

    Se, por um aspecto, o crescimento mais robusto dos Estados Unidos contribui indubitavelmente para a performance dos emergentes dado o aumento da demanda mundial decorrente, por outro os fluxos financeiros tomam, em parte, uma nova rota, para os desenvolvidos. O Fed poderá ir mais devagar no corte das compras de ativos?

    O continente europeu ainda está em processo de recuperação distante da reação americana, mas o crescimento do apetite por ativos do continente diz muito sobre o mapa das preferências dos investidores, que pode perdurar ou aumentar ao longo do processo de saída dos estímulos americanos. O BCE, por outro lado, vai em via contrária, e pode ampliar as ações em prol da atividade na região. O Japão está na mesma toada.

    Mas não é sensato dizer que o mundo está às vésperas de assistir a um filme de horror dos emergentes nos moldes da crise asiática.

    A Argentina, bem se sabe, vive sob uma gestão econômica fadada ao fracasso há vários anos, com grandes déficits, inflação galopante, ausência de arcabouço regulatório e isolamento do mercado internacional. Ser um parceiro comercial relevante e estar tão próxima ao Brasil não significa que contagiará o mercado brasileiro como no passado. Ademais, as fragilidades de parte majoritária dos mercados emergentes são muito menores agora.

    Uma questão relevante, todavia, é o quanto esse cenário contamina a confiança dos agentes e quanto pode vir de solavanco daí.

    A queda forte dos rendimentos dos Treasuries (títulos do Tesouro americano) nos últimos dias, em meio ao cenário mais turvo nos emergentes, chamou atenção. Pode-se argumentar que o mercado “comprou”, a poucos dias da reunião do Fed, a expectativa majoritária dos membros da autoridade monetária, de que os juros não serão elevados antes do fim de 2015 ou início de 2016.

    Mas pode também significar uma visão mais pessimista das perspectivas globais de crescimento. Só esperando para ver.

     

    Fonte: Valor Econômico

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