Por Claudia Safatle, Edna Simão e Leandra Peres | De Brasília
Técnicos do Ministério da Fazenda discutem a possibilidade de o governo estabelecer como meta fiscal, para o resultado consolidado do setor público, para este ano um superávit primário de cerca de 2% do Produto Interno Bruto (PIB).
Para compor esse superávit, que estabiliza a dívida pública como proporção do PIB, o governo central (formado pelo Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central) perseguiria a meta de 1,5% do PIB – equivalente a uma economia de R$ 80 bilhões para pagar juros da dívida pública – ficando 0,5% do PIB a cargo dos Estados e municípios.
Para cumprir a meta de primário de R$ 80 bilhões o governo terá que fazer um corte nos gastos orçamentários de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões, mais intenso do que os R$ 38 bilhões de redução da despesa em 2013.
Todos esses números são preliminares, estão em discussão e foram submetidos à presidente Dilma Rousseff antes de ela embarcar para Davos (Suíça), na semana passada. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciará os objetivos da política fiscal em fevereiro e, muito provavelmente, o fará antes da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), marcada para os dias 25 e 26 de fevereiro. Na última reunião, o Copom elevou os juros em 0,5 ponto percentual, para 10,5% ao ano.
Quanto maior for o reforço fiscal, menor será a necessidade de o Banco Central aumentar a taxa básica de juros (Selic), que já teve alta de 325 pontos-base de abril de 2013 até agora. Na avaliação de interlocutores do mercado junto à área econômica do governo, se Mantega divulgar uma meta crível, o Copom poderia, inclusive, começar a desacelerar as altas da Selic.
Antes de definir o compromisso oficial com a meta fiscal – tendo em conta que este é um ano de eleições presidenciais, o que torna mais difícil cortar gastos públicos – os economistas do Ministério da Fazenda estão se desdobrando em conversas e consultas junto ao mercado financeiro.
Na semana passada, o secretário-executivo do ministério, Dyogo de Oliveira, teve um encontro com economistas de bancos levados por Roberto Padovani, da Votorantim Corretora. Nos últimos dias, assessores que trabalham com o secretário de Política Econômica, Márcio Holland, têm feito sondagens junto a economistas-chefes de instituições financeiras, em uma consulta sobre o que eles esperam e avaliam como factível para a política fiscal este ano.
No discurso que fez em Davos, na sexta feira, a presidente informou que o superávit que seu governo anunciará em breve deve ser consistente com a queda da dívida pública como proporção do Produto Interno Bruto (PIB). O esforço fiscal nesse caso teria que ser maior, acima de 2% do PIB, desconsiderando uma eventual desvalorização da taxa de câmbio. Entre 1,9% e 2% de primário é suficiente, porém, para manter a dívida estável.
A novidade que se recoloca em discussão é se o governo federal compensaria uma eventual frustração dos resultados dos Estados e municípios. Há quem defenda que, embora legalmente o governo possa não fazer essa compensação, que ele se comprometa com ela este ano, se for preciso.
Dados praticamente fechados de 2013 indicam que o superávit primário do governo central foi de 1,6% do PIB “com pedaladas”, ou seja, com a transferência de algumas despesas para este ano. Sem considerar essas manobras, o primário teria sido de 1,5% do PIB, segundo fontes. Como os Estados e municípios estavam com um saldo primário em torno de 0,4% do PIB pouco antes do fim de 2013, supondo que mantiveram esse padrão, o consolidado do setor público encerrou o ano em 1,9% do PIB.
Se o governo realmente levar adiante uma política fiscal este ano semelhante à do ano passado, essa tenderá à neutralidade do ponto de vista da expansão da demanda agregada e, portanto, da inflação. Na ata do Copom de setembro, o Banco Central colocou essa questão que gerou muita polêmica. Dizia que estariam sendo criadas as condições para que a política fiscal, então expansionista da demanda, se deslocasse para a zona da neutralidade no horizonte relevante (2014 e 2015).
Mesmo os economistas que estão em conversas com seus pares no governo, porém, mantêm um certo ceticismo quanto aos propósitos do governo. Querem, primeiro, ver os resultados do primeiro trimestre deste ano para, depois, dar um crédito de confiança ao ministro da Fazenda.
A deterioração fiscal ocorrida de 2012 para cá está na base das desconfianças do mercado e das preocupações com o rebaixamento do grau de investimento conquistado pelo Brasil em 2008. O governo tenta recuperar a credibilidade perdida.
Fonte: Valor Econômico