Objetivo seria sinalizar rumo da política de um eventual segundo mandato e acalmar mercado
Por isso, já há até quem patrocine a ideia de que ela coloque suas propostas numa nova Carta ao Povo Brasileiro, nos mesmos moldes da divulgada por Lula na campanha eleitoral de 2002, quando o PT firmou um compromisso com o combate à inflação e o equilíbrio das contas públicas.
A reedição do documento teria a mesma finalidade de 12 anos atrás: acalmar o mercado financeiro, que já não acredita numa equipe econômica que deixou a inflação se acomodar perto do teto da meta, de 6,5%, e ainda lançou mão da chamada contabilidade criativa para conseguir pagar parte dos juros da dívida pública. Alguns interlocutores do Palácio do Planalto chegam a defender que a presidente vá além e revele logo quem será o responsável pela condução da economia caso ela seja reeleita.
O argumento dos aliados é que, como a atual equipe já está bastante desgastada, uma indicação mais amigável para o mercado teria reflexos positivos nos investimentos. Algumas corretoras já deixaram de recomendar o Brasil para seus clientes após os dados mais recentes da economia de inflação persistente e generalizada e de crescimento baixo.
– Não precisava anunciar oficialmente quem seria ministro, mas pelo menos deixar vazar para a imprensa os nomes – disse uma fonte sob a condição de anonimato.
– Podia deixar, por exemplo, os fotógrafos dos jornais verem o Nelson Barbosa (ex-secretário-executivo da Fazenda, que tem mais simpatia do mercado) entrando no Planalto para uma reunião – brincou um economista, que também pediu que seu nome não fosse divulgado.
Interlocutores dão como certa a troca na equipe econômica se Dilma se reeleger, o que significa que Guido Mantega não pode ser o principal interlocutor com o mercado se o assunto é a economia no segundo mandato. Assim, o mais provável é que a própria Dilma acabe se tornando a portavoz da futura política econômica quando a campanha esquentar. Até porque, brincam os técnicos, ela sempre achou que sabe mais do que seus subordinados quando o assunto é economia.
– Ela não acha que é a melhor economista deste país; ela tem certeza disso – afirma um interlocutor da presidente.
Analistas, no entanto, dividem-se quanto ao efeito que uma nova Carta ao Povo Brasileiro teria no mercado. O economista-chefe da corretora Gradual, André Perfeito, argumenta que Dilma deixou claro que seu maior desejo era deixar a taxa de juros real no Brasil em 2%. Tentou. Usou todas as armas para pressionar os bancos e não conseguiu.
Por isso, o mercado quer saber o que vem agora. Um documento poderia dirimir dúvidas. E afastar ruídos sobre a condução da política fiscal e do salário-mínimo.
Já Carlos Kawall, ex-secretário do Tesouro, acha que um documento não é necessário, porque o cenário é completamente diferente do conturbado ano de 2002. Dilma não é desconhecida da administração pública. Segundo ele, é muito mais importante cumprir promessas antigas do que fazer novas. E ainda diz que anunciar novo ministro da Fazenda não traria resultados.
– Seria deselegante com o ministro Mantega e ainda criaria dúvidas – alerta. – O que convenceria o mercado é dar sinais claros de mudança, como autorizar o reajuste da gasolina. Outro ponto é barrar a mudança do indexador da dívida dos estados.
– Do ponto de vista político, uma carta seria admitir que tudo o que fez está errado. O que importa não é fazer mais discurso – diz o ex-diretor do BC Alexandre Schwartsman. – Lembra-se de Davos (no Fórum Econômico Mundial, quando a fala de Dilma não convenceu o mercado)? Como dizem os americanos: “Talk is cheap!” (“Falar é fácil”).
A oposição sabe que a política econômica é a maior fragilidade do governo, mas não está disposta a explorá-la logo. No PSDB e no PSB, há a percepção de que, se todos os argumentos da má condução da economia forem explorados agora, haveria queda mais acentuada de Dilma nas pesquisas. E isso poderia engrossar o movimento “Volta, Lula”. l
Fonte: O Globo – RJ