Legislação eleitoral colide com o Marco Civil da Internet

    Por Renata Batista | Do Rio

    Depois de atrair mais de 2 mil jovens para um camping digital em São José dos Campos no último feriado, o PT se prepara para promover workshops sobre mídias sociais para militantes em Curitiba e Porto Alegre. Entre os três partidos que se preparam para a disputa presidencial, o da presidente Dilma e do ex-presidente Lula é o único disposto a expor sua estratégia. Reuniu, em média, 120 participantes nos workshops que já realizou em São Paulo, Rio, Minas, Bahia e Pernambuco. Trabalha para transformar os voluntários em produtores de conteúdo e disseminadores das informações dos canais oficiais, principalmente o novo site e a nova agência de notícias do partido, que serão lançados dia 1º.

    Atento à legislação eleitoral, porém, o vice-presidente do partido, responsável pela estratégia de comunicação, Alberto Cantalice, garante que não se trata ainda de ação de campanha. “Campanha só em junho. Estamos fazendo oficinas para que os militantes, que sempre participam das atividades do partido, aprendam a fazer memes, vídeos e a compartilhar informações. Queremos que os militantes participem”, afirma Cantalice.

    Cantalice e outros estrategistas aguardam, porém, a definição de regras mais específicas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para o uso das redes sociais em campanhas. O novo Marco Civil da internet pode gerar alguns ruídos. Sancionado na quarta-feira, um de seus artigos conflita com a regra atualmente adotadas pelo TSE para a retirada de conteúdo considerado ofensivo das redes sociais. Enquanto o TSE estabelece que plataformas como Facebook, Youtube e Twitter podem ser responsabilizadas pela manutenção de conteúdos ofensivo desde que fique comprovado que estavam cientes da existência dos mesmos, pela nova lei – inclusive para a proteção das empresas -, a retirada depende de determinação judicial.

    “Antes existia um incentivo para as empresas retirarem mesmo sem ordem judicial por risco de processo. Nesse sentido, a nova regra protege as empresas. Mas o direito eleitoral tem regras específicas para remoção de conteúdo. Estabelece que, a partir do momento que a plataforma está ciente, pode ser responsabilizada”, diz o advogado da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Luiz Fernando Moncau.

    O advogado chama atenção, porém, para o risco de se esterilizar o debate, com uma prática muito restritiva aos conteúdos. Segundo ele, a cultura brasileira tende a proteger mais a personalidade do que a liberdade de expressão e os candidatos acabam tentando importar para o ambiente das redes sociais o modelo de “edição” que usam com outros meios, focado na retirada de conteúdos.

    “A personalidade pública não pode usar a legislação de injúria para esterilizar o debate. Da mesma forma, a liberdade de expressão não pode servir apenas para o discurso agradável. Questionar a competência de um político faz parte do jogo, do debate político”, afirma. “Os candidatos devem acostumar-se à cultura das redes sociais”, completa.

    A preocupação com o uso excessivo de medidas judiciais para restringir a circulação de informações na rede preocupa outros analistas. Em nota, a assessoria do Facebook disse que a plataforma está “preparada para atender à demanda da Justiça Eleitoral, mas não age espontaneamente sobre conteúdo que esteja de acordo com suas políticas e termos da comunidade. Neste caso, é necessária a determinação de uma autoridade que tenha a atribuição de julgar se o conteúdo é legal ou não”.

    Além do bloqueio de conteúdos, os analistas estão atentos também às tentativas de usar o tradicional direito de resposta, comuns nas mídias tradicionais, mas considerados pouco eficazes nas redes sociais. “Por natureza, as redes sociais já são abertas a direito de resposta”, resume o advogado Eduardo Magrani, também da FGV.

    “A lei vai proteger a reputação em casos extremos, mas as redes sociais vão resignificar o direito de resposta porque não adianta responder com 10 linhas o que foi dito em 10 linhas”, afirma a especialista em mídias sociais da FSB PR Digital, Rizzo Miranda.

    Segundo ela, uma estratégia que pode ganhar destaque nessa campanha são as salas antiboato, como a que foi usada pelo presidente americano Barack Obama. “É uma estratégia que ainda não foi usada no Brasil. Ele criou uma rede de apoiadores para divulgar seus posicionamentos. Assim se resignifica o direito de resposta”, afirma Rizzo.

    No Facebook, o ex-presidente Lula é o campeão absoluto de seguidores, com 738 mil curtidas. Já a presidente Dilma está na lanterna, com 443 mil. Na oposição, os pré-candidatos Eduardo Campos (PSB) e Aécio Neves (PSDB) estão a frente de Dilma e até de Marina Silva, cuja campanha nas redes sociais em 2010 é considerada um caso de sucesso. Chama atenção também a velocidade com que Campos avança. Entre terça e sexta-feira, ele adicionou 14 mil seguidores, alcançando 807 mil, enquanto Aécio e Marina somaram 4 mil a mais cada. O tucano totalizou 624 mil e Marina chegou a 620 mil.

    Os perfis falsos estão completamente fora das recomendações dos especialistas, embora tenham sido bastante usados em outras campanhas, inclusive para disseminar boatos falsos.

     

    Fonte: Valor Econômico

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