Banco Central avisa que não jogou a toalha

    Banco CENTRAL não jogou a toalha. Continuará alerta. E voltará a subir os juros se for preciso. Essa é a mensagem principal do lacônico comunicado divulgado pelo Comitê de política monetária (Copom) do BC após sua reunião de anteontem, que manteve os juros básicos em 11% ao ano. Com ela, o comitê diz que vai perseverar no trabalho para trazer a inflação para a trajetória das metas. E também reafirma que a sua ação é pautada por critérios técnicos, num momento em que parte relevante do mercado financeiro acha que o ciclo de aperto monetário foi abortado para ajudar a reeleição da presidente Dilma Rousseff.

    A confusão entre os ciclos políticos e monetários é típica de países em que o Banco CENTRAL não é formalmente independente. Desde que o regime de metas de inflação foi adotado pelo Brasil, em 1999, ocorreram três eleições presidenciais. Há suspeitas de que, em duas delas, em 2002 e em 2010, o Banco CENTRAL agiu politicamente, cortando juros ou deixando de subir, apesar de banqueiros centrais dessas épocas sustentarem que as suas decisões reproduzem as melhores práticas. O Banco CENTRAL de agora parece querer se distanciar desses episódios, ao deixar implícito no comunicado que não estará preso ao calendário eleitoral.

    Se vai ser bem-sucedido, é ainda uma questão em aberto. Em setembro de 2010, depois de interromper o ciclo de alta, o Banco CENTRAL também informou que poderia voltar subir os juros, numa ata do Copom divulgada uma semana depois. Como agora, argumentou que a política monetária atua com defasagem sobre a atividade e a inflação, e que o aperto ainda não havia surtido efeito. No fim das contas, o aperto ocorreu apenas depois de Dilma ser eleita.

    Copom subirá os juros básicos de novo se for preciso

    Há diferenças substantivas entre o atual ciclo de aperto monetário e o de 2010. Naquela oportunidade, foram feitos apenas três movimentos de alta, que somaram 2 pontos percentuais. O ciclo atual dura mais de um ano, com início em janeiro de 2013, quando a comunicação mais dura do BancoCENTRAL mudou as condições financeiras da economia, e acumula 3,75 pontos percentuais, o que o faz um dos maiores do regime de metas de inflação. Uma boa parte desse ajuste já está se transmitindo pela economia, diferentemente de 2010, quando isso era um cenário distante. O que se verá daqui por diante é o acúmulo do efeito das altas mais recentes dos juros às anteriores.

    Em 2010, eram fartos os sinais de superaquecimento da economia, que levou a uma expansão do Produto Interno Bruto (PIB) de 7,53%. Agora, é provável que os números do PIB do primeiro trimestre, que serão divulgados hoje pelo IBGE, confirmem que já está ocorrendo uma desaceleração da economia. Analistas trabalham com o risco de, em algum trimestre neste ano, o PIB ter variação negativa, muito provavelmente no período entre abril e junho.

    Os dados mais recentes que medem o pulso da economia sustentam a tese da desaceleração. O Índice de Confiança dos Empresários Industriais (Icei) ficou em 48 em maio, no segundo mês seguido em que esse termômetro fica abaixo do limiar de 50 que aponta falta de confiança na economia. A isso, soma-se a queda na confiança dos consumidores nos últimos meses, que, apesar de ainda seguir no território positivo, está em patamares bem mais modestos do que em 2013.

    Baixos níveis de confiança costumam potencializar os efeitos de apertos na política monetária, e isso parece já estar ocorrendo no canal do crédito. Segundo dados divulgados ontem pelo BC, os juros médios do crédito livre subiram de 26,2% ao ano para 31,7% ao ano entre janeiro de 2013 e abril de 2014. Ao mesmo tempo, há uma queda de oferta de crédito pelos bancos, como sinaliza o Indicador de Condições de Crédito do Banco CENTRAL. Bancos federais, que vinham sustentando boa parte do mercado de crédito, relatam que caiu a demanda por financiamentos para a aquisição de bens duráveis. Assim, o crédito livre cresceu apenas 6,2% nos 12 meses terminados em abril.

    Também está ruindo a hipótese levantada pelo Banco CENTRAL de que a demanda externa vai se tornar um dos motores do crescimento, depois que a atividade econômica em países desenvolvidos mostrou vigor abaixo do esperado. O PIB americano registrou uma contração de 1% no primeiro trimestre, mais aguda que o 0,6% esperado pelo mercado, conforme dados divulgados ontem. Os juros estão caindo no mercado internacional, aumentando o diferencial de juros interno e externo e acelerando a transmissão da política monetária pelo canal da taxa de câmbio.

    O cenário inflacionário, porém, não mudou e inspira preocupação. No fim, é a inflação que importa. O IPCA acumulado em 12 meses chegou a 6,28% em abril, e tende a subir nos próximos meses, superando o teto da meta, de 6,5%, antes de cair. As projeções de inflação do mercado para 2014, de 6,47%, e para 2015, de 6%, estão desancoradas. O adiamento de reajustes de preços administrados, como energia elétrica, torna mais difícil coordenar as expectativas. Os mais recentes sinais do lado fiscal não são bons. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anunciou nesta semana que irá tornar permanente a desoneração da folha de pagamentos para 55 setores da economia, com um custo de R$ 21,6 bilhões anuais. A arrecadação cresceu 1,4% (aumento real) em abril, a uma velocidade menor que a esperada. Foram adiadas ou cancelados aumentos de impostos que, segundo promessas do governo, ajudariam a cobrir as contas, como para o setor de cosméticos, importados e de bebidas. O governo segue se valendo de receitas extraordinárias, como dividendos, para cumprir as metas de superávit primário.

    Banco CENTRAL tem insistido que a alta de juros demora para se transmitir, mas ainda vai chegar aos preços, depois de passar por canais como a atividade. E que a política fiscal é neutra e não impede o controle da carestia. Muitos analistas duvidavam do acerto desses diagnósticos, por isso já contavam com um aumento de juros após as eleições. O BC tem mostrado certa confiança no seu cenário, mas comunicou anteontem que não está preso a ele. Se as coisas não saírem como o esperado, pretende agir.

    Alex Ribeiro é repórter especial. A colunista Claudia Safatle está em férias.

    E-mail: alex.ribeiro@valor.com.br

     

    Fonte: Valor Econômico

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