A promessa de votações no primeiro dia do esforço concentrado não passou de bravata. Apenas 47% dos deputados apareceram em Brasília na segunda-feira. Ideia é apreciar propostas até sexta porque durante a Copa serão somente duas sessões
Se os deputados e senadores resolverem começar a votar hoje algum item da pauta prevista esta semana, isso não significa que o resultado necessariamente será bom para o país. Estão previstas uma série de iniciativas legislativas que produzem “bondades eleitorais” ou que, simplesmente, corroem a já combalida saúde fiscal brasileira. No fim do ano passado, a presidente Dilma Rousseff convocou os líderes da base aliada para que, juntos, se comprometessem a não aprovar a chamada pauta bomba que provocasse rombos nos cofres públicos.
A proximidade do ano eleitoral e a relação conturbada do Palácio do Planalto com a própria base de apoio coloca sob ameaça esse acordo. “O governo terá que se alinhar com a base aliada. Esse desalinhamento em ano eleitoral nunca é bom”, alertou o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), um dos que não tem muitas razões para se regozijar na relação com o governo federal.
Pelo menos dois projetos causam extrema preocupação ao Planalto e faz com que os articuladores políticos do governo se esforcem para tentar evitar a aprovação: o que estabelece jornada de trabalho de 30 horas para enfermeiros e a PEC da Magistratura, que concede uma gratificação por tempo de serviço. O primeiro causaria um rombo financeiro estimado em
R$ 27 bilhões por ano, enquanto o segundo teria um impacto de aproximadamente R$ 450 milhões. O governo é contra a aprovação de ambos.
Mas existem outras iniciativas que colocam em risco a estabilidade econômica. Cálculos feitos pela consultoria do orçamento mostram que o projeto que aprova a criação e fusão de municípios, que está na pauta de votações da Câmara (leia quadro), traria um gasto extra para os cofres públicos de
R$ 397,8 milhões. No ano que vem, esse valor sobe para R$ 529 milhões. A MP editada para criar funções comissionadas para a Copa do Mundo custará R$ 5,2 milhões em 2015.
Já aprovada por Câmara e Senado, a proposta que aumenta o piso salarial dos agentes comunitários de saúde também estava incluída na chamada pauta bomba do ano passado, mas o governo, pressionado pela própria base e acuado diante do calendário eleitoral, acabou cedendo, refez os cálculos e concordou com a aprovação da medida, que representará, em 2015, um gasto extra para estados e municípios na ordem de R$ 700 milhões.
Previdência
Ontem, servidores públicos aposentados circulavam pelo Salão Verde pressionando os deputados para que incluíssem novamente na pauta de votações a PEC que derruba a contribuição de 10% dos inativos, aprovada durante a reforma da Previdência de 2003, primeiro ano do governo Lula. O tema havia sido incluído por Henrique Alves no rol de assuntos para serem votados, mas o governo conseguiu agir rápido, aproveitando a relação de parentesco entre o presidente da Câmara e o ministro da Previdência, Garibaldi Alves, e retirou a matéria do plenário.
O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), reconheceu que não será fácil votar uma pauta extensa durante o esforço concentrado. “Neste momento, há mais temas que são complicados do que aqueles em que há consenso e que sejam essenciais para o país que sejam votados rapidamente”, reconheceu. “É preciso passar um pente-fino nessa pauta. O avanço não será tão expressivo quanto todos nós gostaríamos que fosse pelo grau de polêmica que muitos desses itens têm”, completou Costa.
O petista joga para o colo da oposição a responsabilidade pela aprovação de projetos que venham a comprometer a estabilidade econômica do país. “Foram aprovados vários projetos que beneficiam determinadas categorias profissionais, com apoio integral da oposição. Se a oposição estivesse com o olho no interesse do país, não só não teria votado, como estaria articulando conosco para que outras matérias não fossem analisadas”, cobrou o líder do PT.
O deputado Luiz Carlos Haully (PSDB-PR), que, após a aprovação do texto-base do Plano Nacional de Educação (PNE), na semana passada, afirmou ter visto o plenário da Câmara gastar mais do que durante todo o período da Constituinte, reclamou que a equipe econômica resolveu afrouxar o compromisso fiscal. “Tanto no mérito quanto no planejamento de longo prazo, o PNE é 10. Não tem de onde tirar esse dinheiro. Mas quem deve zelar pela austeridade é o governo. Não adianta pedir isso para o Congresso em ano eleitoral”, justificou Haully.
Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) disse que a decisão de não votar ontem foi um “cuidado preventivo”, já que as matérias em pauta são consideradas polêmicas. “Eu esperava um comparecimento maior”, lamentou.
Em discussão
Confira alguns dos itens da pauta do “esforço concentrado”
no Congresso. Senado definiu 17 propostas. Na Câmara, são outras 37 na fila do plenário
Na Câmara
Destaques do Plano Nacional de Educação
Entre outros pontos, os congressistas ainda têm de decidir se a União aportará recursos para os estados e os municípios cumprirem o investimento mínimo por aluno e se os 10% do PIB serão direcionados somente para o ensino público
PEC dos Cartórios
Dá posse aos atuais ocupantes das funções de tabelião, mesmo que tenham entrado sem concurso ou em caráter provisório
PEC do Orçamento Impositivo
Insere na Constituição a obrigação da União de empenhar os recursos previstos nas emendas parlamentares. A regra foi inserida na LDO de 2014, e vai valer para este ano. Já foi aprovada em primeiro turno
Novos municípios
Altera as regras atuais para a criação e a fusão dos municípios. O projeto permitiria o surgimento de até 188 cidades, sem aumento direto de custos para a União
No Senado
Projeto que altera a “Lei do Descanso”
Permite a ampliação da jornada de trabalho dos caminhoneiros para até 12 horas e aumenta o tempo máximo ao volante
“Lei da Palmada”
Estabelece punições mais duras para os maus-tratos contra crianças e adolescentes, inclusive quando praticados pelos pais
Reforma do Código de Defesa do Consumidor
Pretende dar mais segurança para as compras on-line e criar regras para evitar o superendividamento, entre outras mudanças
Projeto que torna obrigatório o ensino de artes no ensino básico
Fonte: Correio Braziliense