Copom mantém Selic em 11% ao ano (Valor)

    Coerente com os acenos dados por seu presidente e diretores, o Banco CENTRAL (BC) manteve a taxa Selic em 11% ao ano no encontro de ontem. A decisão foi unânime e alinhada às expectativas do mercado e dos departamentos econômicos.

    O que não parece coerente com a postura do BC de esperar pelos efeitos cumulativos e defasados da alta de juros sobre a inflação, foi a manutenção no comunicado, da expressão neste momento , que é associada a possíveis mudanças na atitude do Comitê de política monetária (Copom).

    Essa estratégia dá mais graus de liberdade à autoridade monetária e também deve tirar o mercado da zona de conforto com a maioria das apostas calcadas na manutenção do juro básico em 11% até o fim de 2014. A questão é que o uso do termo neste momento incita a formação de teses tanto por parte daqueles que esperam novas altas na Selic, quanto do grupo que não descarta uma redução da taxa básica como forma de lidar com um quadro de acentuada deterioração da atividade.

    O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, por exemplo, considera que o Copom abriu espaço para apostas de corte da taxa básica de juros até o fim deste ano. Essa expressão sugere que a decisão foi algo pontual e que, mais adiante, pode ser diferente.

    Segundo ele, se o mercado se convencer de que o BC pode cortar a Selic porque, dada a fraqueza da atividade, a inflação tende a perder força, os juros futuros tendem a se acomodar em níveis mais baixos. Caso haja descrença no arrefecimento da inflação e prevaleça a leitura de que o BC está mais preocupado com a atividade, haverá um aumento da percepção de risco. Eu acho a segunda hipótese mais provável.

    Como no encontro de maio, o ruído causado pela expressão neste momento deve perdurar até a divulgação da ata, na quinta-feira que vem. Em maio, a ata acabou com a visão de que novas altas poderiam ocorrer e o mercado migrou para a estabilidade dos juros.

    Ao repetir o comunicado de maio, o Copom quis evitar se comprometer com uma direção específica para os juros, diz Camila Abdelmalack, economista da CM Capital Markets. Com isso, o BC se protege das especulações do mercado e pode esperar os próximos indicadores para tomar sua decisão.

    Para o economista Mansueto Almeida, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a manutenção da Selic sem nenhum ajuste no texto pós-encontro permite duas leituras. A boa notícia é que o BC está visando combater a inflação, mas a má notícia é que ele não pode fazer o trabalho sozinho. O governo gasta demais e pressiona a demanda. Além disso, o controle dos preços administrados tem contribuído para as pressões inflacionárias ainda altas. Independente da política do BC, o mercado espera uma correção desses preços.

    O colegiado do BC volta a se encontrar em 2 e 3 de setembro, dias depois de anunciado o Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, para o qual não se descarta variação negativa. Depois disso, o Copom se reúne no fim de outubro e começo de dezembro já ciente do vencedor das eleições para presidente da República.

    O economista-chefe do Banco Fibra, Cristiano Oliveira, acredita que com o crescimento baixo do PIB brasileiro nos últimos trimestres, cresceu a probabilidade de o BC iniciar um corte de juros.

    O BC está olhando para o balanço de risco entre inflação e crescimento e, me sugere que, ao pesar essas duas variáveis, tende a dar atenção à atividade, podendo iniciar novo ciclo de corte de juros no ano que vem , afirma o economista do Fibra, que prevê um avanço de 0,5% do PIB em 2014, devendo ficar estável em 2015. Embora o Banco ainda mantenha um cenário base de manutenção da taxa Selic em 2015, Oliveira já vê 40% de chance de um corte da taxa no ano que vem.

    O economista do Banco Fator não vê espaço para perda de fôlego dos preços. Mesmo que o desaquecimento da atividade reduza o ritmo de alta dos preços livres, o IPCA será pressionado pela perspectiva de depreciação do real e o reajuste dos preços de combustíveis e energia. O próprio TOMBINI [ALEXANDRE TOMBINI, presidente do BC] alertou para esses dois processos na ata do Copom e em entrevista a órgão interno do BC. Por isso, essa manutenção do neste momento me surpreende , diz. Como não vê desaceleração significativa da inflação, Gonçalves mantém projeção de Selic a 11,25% no fim de 2014.

    No curto prazo, a inflação mês a mês vem em trajetória de queda. O preço dos alimentos recua e a desinflação dos preços no atacado é transmitida ao varejo. Em 12 meses, no entanto, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que baliza o regime de metas, seguirá rondando o teto de 6,5%. Em junho, a inflação oficial ficou em 6,52%. Tecnicamente não houve estouro da meta, pois em função do arredondamento, o BC teria entregue inflação de 6,5%, ainda dentro do limite de tolerância.

    Para julho, a inflação mensal deve recuar ainda mais, rodando abaixo dos 0,20%, mas seguirá batendo no teto de 6,5% no acumulado em 12 meses. No lado das expectativas, não há refresco mesmo com uma sistemática revisão para baixo no crescimento da economia. O BC trabalha com avanço do PIB de 1,6% para 2014. O Focus mostra 1,05%, mas algumas instituições, como o Itaú, trabalham com avanço de 0,7%.

    Para Mansueto, apesar da fraqueza da economia, o espaço para recuo dos preços até o fim do ano é limitado. Há fatores que ainda pressionam a inflação. O déficit em conta corrente continua elevado. Se não fosse as intervenções do BC no câmbio, o real estaria mais desvalorizado. Além disso, o aumento dos preços administrados previstos para o próximo ano, como de energia, devem trazer um aumento de custo para a indústria e o comércio.

    A senha definitiva para a aposta na manutenção no encontro de ontem veio de recente entrevista de TOMBINI, dada para órgão de comunicação do próprio BC, de que mantidas as condições monetárias, a inflação tende a entrar em trajetória de convergência para a meta ao longo do horizonte relevante para a política monetária . Com a manutenção do comunicado há de se esperar que tal mensagem do presidente segue válida para as próximas reuniões do Copom.

    Tanto na ata da última reunião, como no Relatório de Inflação e na recente entrevista de TOMBINI, a percepção é de que o BC está confortável com o trabalho já realizado e agora é questão de tempo até a inflação convergir.

     

    Fonte: Valor Econômico

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