Contradição econômica

    Ao incentivar crédito logo após ter preferido não cortar juros, Banco CENTRAL reforça o capítulo das confusões na atual administração

    Duas medidas consecutivas e com o sinal trocado reforçaram, na semana passada, os questionamentos sobre a independência do Banco CENTRAL e sua clareza ao tomar decisões relevantes para o futuro da economia brasileira.

    Na última quinta-feira, o Copom (Comitê de política monetária) reconheceu que há importante desaceleração da atividade econômica, mas optou por não diminuir a taxa básica de juros (Selic), hoje em 11%. Ou seja, o órgão indicou que por ora não pretende estimular um fluxo maior de dinheiro na praça.

    A justificativa foi a inflação persistente, que, nas projeções do comitê, só convergirá para a meta de 4,5% em 2016 (atualmente está em torno de 6,5%, o limite máximo estabelecido pelo próprio governo).

    No dia seguinte, contudo, o Banco CENTRAL veio à carga com medidas de incentivo ao crédito, para surpresa geral dos analistas. A parcela dos recursos de clientes retida na autoridade monetária (os depósitos compulsórios) será menor. Com isso, haverá mais verba disponível para novos empréstimos.

    O BC, ademais, reduziu o montante de capital exigido para empréstimos de prazo longo em modalidades como consignado (desconto em folha), compra de veículos e outros bens de consumo.

    As novas regras aliviam principalmente os bancos públicos. Com a expansão acelerada na concessão de crédito nos últimos anos, começavam a esbarrar em limitações patrimoniais que os impediam de manter a mesma orientação.

    Na prática, o BC reverte as restrições prudenciais que adotou em 2010, quando havia o temor de que os bancos exagerassem no volume de financiamentos e se envolvessem numa bolha –o aperto, entretanto, deixou de ser necessário.

    Em conjunto, as medidas injetam cerca de R$ 45 bilhões na economia, ou perto de 3% do total de crédito existente. Nada colossal, portanto. Alguns nichos até podem melhorar, mas, ao contrário da euforia de quatro anos atrás, agora o clima é de desalento. Com clientes endividados, a demanda por crédito anda baixa.

    Ainda que defensável tecnicamente, a ação do Banco CENTRAL para incentivar o crédito logo após ter deixado claro que não via espaço para juros menores soou contraditória, sobretudo por sua rapidez.

    Não chega a ser surpresa. Reportagem desta Folha publicada no domingo apontou cinco ocasiões, todas nos últimos sete meses, em que o Ministério da Fazenda acabou recuando de decisões tomadas e tornadas públicas.

    Banco CENTRAL, na melhor das hipóteses, contaminou-se pelo ambiente de confusão na gestão da economia. Na pior, não consegue resistir às pressões do Planalto.

     

    Fonte: Folha de S. Paulo

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