Por Juliano Basile e Maíra Magro | De Brasília
Lewandowski: “O Judiciário só deve atuar, para suprir eventual lacuna normativa ou inércia administrativa, em caráter excepcional e provisório”
Ao tomar posse ontem como presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Ricardo Lewandowski defendeu o aumento de salário para juízes e criticou o chamado ativismo do Judiciário, com decisões que interferem em outros Poderes.
Ausente da cerimônia, o ex-presidente do STF Joaquim Barbosa – que protagonizou discussões ríspidas com Lewandowski no julgamento do mensalão e manteve uma relação conflituosa com a magistratura – foi lembrado diversas vezes, por meio de críticas indiretas em discursos de homenagem ao novo chefe do Supremo.
Com o olhar voltado para a presidente Dilma Rousseff, que acompanhava a cerimônia a seu lado, Lewandowski indicou em seu discurso que lutará pelas demandas da carreira: “Particular atenção será dada à recuperação de suas perdas salariais, de modo a garantir-lhes uma remuneração condigna, bem como assegurar-lhes adequadas condições materiais de trabalho.”
Ele chegou a citar Martin Luther King, líder da causa dos direitos civis nos Estados Unidos, para defender a valorização dos juízes no Brasil. “Nós também temos um sonho: ver um Judiciário forte, unido e prestigiado, que possa ocupar o lugar que merece no cenário social e político deste país”, declarou.
Lewandowski avaliou que o Judiciário passa por uma crise e propôs uma série de metas para enfrentá-las. Primeiro, apontou que o STF vem sendo criticado por um “extravasamento indevido” de suas competências e disse que estimulará os juízes a adotar uma “atitude de autocontenção”.
“O Judiciário só deve atuar, para suprir eventual lacuna normativa ou inércia administrativa, em caráter excepcional e provisório, permitindo como regra que o Legislativo ou o Executivo – representantes diretos da soberania popular – possam concluir as suas deliberações no tempo que considerem politicamente mais adequado para o país.”
Em resposta à lentidão dos processos no Judiciário, defendeu a ampliação do uso de meios eletrônicos para tomar decisões e a restrição de medidas processuais que atrasam o andamento das ações.
Prometeu focar no julgamento de recursos extraordinários com repercussão geral (aqueles que suspendem o andamento de ações semelhantes em todo o país e, depois de julgados pelo STF, passam a servir de parâmetro para os demais tribunais). Segundo Lewandowski, tramitam no Supremo atualmente 333 recursos extraordinários com repercussão geral reconhecida. Enquanto não são decididos, eles mantêm suspensos cerca de 700 mil processos em todo o país.
Adiantou também que pretende ampliar a edição das súmulas vinculantes, que oferecem diretrizes de julgamento aos demais tribunais e ao próprio Supremo. Outra proposta foi estimular as formas alternativas de solução de conflitos, como conciliação, mediação e arbitragem.
Para concluir, falou que encaminhará ao Congresso o novo Estatuto da Magistratura e fará uma atualização do regimento interno do STF.
O discurso de homenagem dos colegas coube ao ministro Marco Aurélio Mello, por escolha do próprio Lewandowski. Marco Aurélio fez uma série de referências indiretas aos confrontos entre Joaquim Barbosa e Lewandowski e aos estilos diferentes de ambos, com críticas implícitas ao primeiro.
“Compete ao presidente por força de caráter velar pela harmonia do colegiado. Como sempre digo, ele deve ser um algodão entre cristais. Deve ser exemplo maior de tolerância entre as óticas predominantes”, disse Marco Aurélio. “Na magistratura, mesmo nos momentos mais delicados, vossa excelência comportou-se com altivez e a independência dos grandes juízes”, continuou, em referência à atuação de Lewandowski durante o mensalão.
E voltou a se referir a Barbosa, sem mencionar seu nome, defendendo que os juízes ouçam os advogados – algo que o ministro, agora aposentado, não costumava fazer com frequência: “Independência não implica em arrogância”, alfinetou.
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Marcus Vinicius Furtado Coelho, seguiu a mesma linha de criticar indiretamente o anterior presidente do STF: “O magistrado não deve buscar popularidade, mas credibilidade.”
Já o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, defendeu o fortalecimento do diálogo entre o Judiciário, o Executivo e o Legislativo e opinou que é preciso ter estabilidade institucional para que haja avanço democrático.
Além da presidente Dilma Rousseff, estavam presentes à cerimônia os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN), o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, entre outras personalidades.
Fonte: Valor Econômico