BC segue estratégia apesar do sinal fiscal

    Quando muitos achavam que a escolha de uma equipe econômica mais fiscalista pela presidente Dilma Rousseff permitiria baixar desde já a guarda no front monetário, o presidente do Banco CENTRALALEXANDRE TOMBINI, citou ontem duas expressões-chave de sua comunicação que indicam possível intensificação da alta da taxa básica de juros: o BC “não será complacente com a inflação” e “a política monetária deverá se manter especialmente vigilante”.

    O Valor apurou que o BC reconhece que aumentaram as chances de um ajuste fiscal a partir do ano que vem, o qual considera muito bem-vindo, mas o trabalho de política monetária segue o seu caminho independente para assegurar a convergência da inflação para o centro da meta, de 4,5%, até 2016.

    A inflação acumulada em 12 meses está alta, as expectativas seguem desancoradas e a travessia em 2015 será desafiadora, com a desvalorização cambial e reajustes de preços administrados e um mercado de trabalho ainda bem aquecido. Ontem, o BC indicou uma espécie de “tapering” na oferta de instrumentos cambiais – os estoques que estão em mercado serão renovados, mas não serão aumentados, e deverá voltar a oferta de linhas de empréstimos em moeda estrangeira. A taxa de câmbio voltou a subir, reforçando a necessidade de vigilância para evitar que o dólar caro contamine preços em geral.

    Na essência, seguem válidas as declarações do diretor de Política Econômica do BC, Carlos Hamilton Araújo, durante divulgação do Boletim Regional, em Florianópolis: “O Copom não será complacente com a inflação e, se necessário for, no momento adequado, poderá recalibrar a sua ação de política monetária“.

    Na ocasião, Carlos Hamilton deu uma indicação de que, já na reunião da semana que vem, o Comitê de política monetária (Copom) do BC poderá subir os juros em 0,5 ponto percentual, dos atuais 11,25% ao ano para 11,75% ao ano, em vez do ritmo de 0,25 ponto percentual empregado em outubro, no encontro que reiniciou o ciclo de aperto na taxa básica de juros. “Para bom entendedor, pingo é “i””, alertou.

    Setores do mercado financeiro leram com algum ceticismo a declaração de Carlos Hamilton, achando que era uma opinião pessoal. Na verdade, ele leu na divulgação do Boletim Regional um recado de todo o Copom, como, aliás, tem feito de forma repetida neste ciclo de alta de juros.

    Nos últimos dias, começou a ganhar corpo nos mercados a visão de que, com o clima mais favorável a um ajuste fiscal criado pela escolha da dupla Joaquim Levy na Fazenda e Nelson Barbosa para o Planejamento, confirmada ontem, o BC poderia economizar nos juros.

    TOMBINI, que foi confirmado ontem no cargo na mesma cerimônia em que os futuros ministros foram apresentados, no Palácio do Planalto, reconheceu que a política fiscal deverá facilitar a convergência da inflação à meta de 4,5%, mas ponderou que esse ganho se dará “ao longo do tempo”.

    Na essência, o Banco CENTRAL parece não ter se afastado de sua forma cautelosa de avaliar a evolução fiscal. Desde que TOMBINI assumiu o cargo, em janeiro de 2011, houve apenas três mudanças na leitura que o Copom faz da política fiscal. Até setembro de 2012, o BC era pouco informativo, dizendo que levava em consideração os parâmetros das leis orçamentárias. A partir de outubro de 2012, as atas do Copom começaram a dizer que a política fiscal se tornara expansionista. Pouco menos de um ano depois, em agosto de 2013, o BC passou a dizer que se criavam as condições para que a política fiscal se deslocasse para a zona da neutralidade. Há um mês, reconheceu que a política fiscal se tornara expansionista.

    Ou seja, uma nova mudança na leitura da política fiscal tende a ser feita ao longo do caminho, na medida em que Levy e Barbosa entrarem em ação.

    Não se deve ignorar também que o Banco CENTRAL já vinha contemplando, pelo menos desde o início do ano, que havia um risco favorável de a política fiscal se tornar contracionista em 2015. Carlos Hamilton lembrou, mais de uma vez, que o mercado projetava um superávit primário mais alto no ano que vem do que neste. As projeções colhidas no boletim Focus do BC são um superávit primário de 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2014 e de 1% do PIB em 2015.

    O quanto essa arrumação nas contas públicas, caso se confirme, irá se traduzir numa contração fiscal será objeto de cálculos do mercado e do próprio BC. Ontem, Levy se comprometeu com um superávit primário de 1,2% do PIB em 2015 e de 2% do PIB a partir de 2016, o que significa um esforço de 0,8 ponto percentual por ano.

    Mas é bom lembrar que o impulso fiscal que alimenta os modelos de projeção de inflação do BC é a variação do chamado superávit estrutural.

    Ou seja, o primário tradicional, excluídos efeitos cíclicos e receitas e gastos extraordinários. É possível que o ciclo econômico ajude um pouco no ano que vem, já que a perspectiva do BC é uma pequena aceleração na expansão do PIB.

    Carlos Hamilton, na divulgação do Boletim Regional, pôs em perspectiva o esperado ajuste. “É importante deixar claro que a geração de superávits primários nos próximos anos tende a ser bem menos relevante do ponto de vista de combate à inflação se comparado com a importância que vai ter do ponto de vista da criação de uma percepção positiva para o cenário macroeconômico e redução dos prêmios de risco.”TOMBINI era, desde 2012, um banqueiro central à espera de um ministro da Fazenda que ajudasse a conter a inflação com uma política fiscal austera.

    Levy sempre desejou um banqueiro central que respondesse aos seus esforços.

    Em 2005, quando era secretário do Tesouro, ele liderou um aperto que superou a meta na esperança de os juros subirem menos, mas ficou desapontado porque o BC promoveu naquele ano um dos maiores ciclos de contenção da história. Apesar de a política monetária trilhar um caminho independente da política fiscal, não se pode descartar que haja um encontro feliz entre as duas mais adiante .

    Alex Ribeiro é repórter especial. Hoje, excepcionalmente, deixamos de publicar a coluna de Claudia Safatle E-mail alex.ribeiro@valor.com.br

     

    Fonte: Valor Econômico

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