Não está fácil a vida do Banco CENTRAL. A despeito do discurso enfático do presidente da instituição, ALEXANDRE TOMBINI, de que não haverá trégua no combate à inflação, o governo terá de arcar com um custo significativo se o Comitê de política monetária (Copom) pesar demais a mão sobre a taxa básica de juros (Selic) para tentar restabelecer a confiança dos agentes econômicos. Não se pode esquecer que a economia está no chão – o Produto Interno Bruto (PIB) deve fechar o ano com avanço de 0,19% -, e juros mais altos contribuem para travar o ritmo da atividade. Para completar, quanto mais os encargos da dívida subirem, pior ficará a situação fiscal.
Neste ano, até outubro, o setor público acumulou um rombo de R$ 11,6 bilhões no caixa. Ou seja, não economizou nada para pagar seus credores. Como a conta de juros bateu, no mesmo período, em R$ 230,6 bilhões, o saldo final foi um deficit de R$ 242,2 bilhões, correspondente a 5,7% do PIB. Não foi só: com esse buraco nas finanças, a dívida bruta saltou para 62% do PIB. Isso significa dizer que, em apenas 10 meses, o endividamento total aumentou 8,4 pontos percentuais, já que, em dezembro de 2013, representava 53,6% de todas as riquezas produzidas pelo país.
Diante desse quadro, mesmo que o futuro ministro da Fazenda, Joaquim Levy, entregue um superavit primário de 1,2% do PIB no ano que vem e de 2% nos três anos seguinte, o endividamento do setor público continuará piorando. Além de essa economia não ser suficiente para cobrir os atuais gastos com juros, a elevação da Selic ampliará a fatura. “Por isso, o BC tenderá a ser mais cauteloso em suas ações para levar a inflação ao centro da meta, de 4,5%, até o fim de 2016”, diz o economista Carlos Thadeu de Freitas Gomes, que foi diretor da instituição. “Minha aposta é de alta de 0,25 ponto na Selic amanhã, de 11,25% para 11,50% ao ano”, emenda.
No entender de Thadeu, o mais importante neste momento para o governo é resgatar a credibilidade da política fiscal. É isso que fará com que a economia volte a crescer puxada pelos investimentos produtivos. O BC, destaca ele, fará uma ação complementar, mostrando uma sintonia que há anos não se vê com o Ministério da Fazenda. “Tudo indica que veremos um processo mais gradual e prolongado de aumento dos juros. O BC precisará ter a certeza de que a política fiscal jogará a favor do combate à inflação”, ressalta.
Há, ainda, outra razão para o Copom ser mais gradualista: o comportamento do dólar. Como os Estados Unidos terão, mais cedo, mais tarde, que aumentar os juros, o BC precisa ter munição para agir no caso de uma desvalorização mais forte da moeda norte-americana. Quer dizer: de nada adiantará jogar rapidamente a Selic para 12% ou 12,50%, se, mais à frente, precisará agir novamente para conter o repasse do dólar para os demais preços da economia. “Sabemos que o BC terá que aceitar um dólar mais caro. Mas a instituição precisa ter margem de manobra para agir quando o horizonte estiver menos nebuloso. Hoje, há muitas dúvidas no ar, a começar pelo cumprimento da meta fiscal”, frisa Thadeu.
Conta só fecha com mais impostos
No mercado, vários economistas destrincharam as contas públicas e chegaram à conclusão de que, mesmo com todo o esforço de Joaquim “mãos de tesoura” Levy, será muito difícil cumprir a meta fiscal de 1,2% do PIB no ano que vem. A conta, acreditam Affonso Celso Pastore, ex-presidente do BC, e Eduardo Loyo, do BTG Pactual, só fechará se houver aumento de impostos. Todos acreditam, porém, que a presidente Dilma não se furtará de avançar um pouco mais sobre o bolso dos trabalhadores e o caixa das empresas. Ela sabe que não pode falhar na promessa de arrumar as finanças públicas.
Ruim de
qualquer jeito
» O economista-chefe do Banco suíço Julius Baer, Janwillem Acket, diz que o processo de aumento dos juros conduzidos pelo BC será ruim para a economia. “Claro que um Banco CENTRAL deve se preocupar com a inflação, mas se você acerta de um lado, erra do outro. Em quase todo o mundo, a ordem é não prejudicar a fraca recuperação econômica. O Brasil já tem taxa de juros de dois dígitos. Assim como neste ano, em 2105, dificilmente conseguirá taxa de crescimento que melhore a situação fiscal”, afirma.
Como a
seleção
» Acket vai além e ressalta que o Brasil é hoje um ponto fraco entre os emergentes, assim como outros dois Brics, a África do Sul e a Rússia. Na avaliação dele, não é possível culpar apenas a economia global por isso. “A metáfora perfeita para o Brasil de hoje é a seleção da Copa do Mundo: excelentes jogadores, grandes talentos, mas que não conseguem jogar bem como um time”.
Indústria
ainda fraca
» O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulga hoje a produção industrial de outubro. A média das projeções aponta para um avanço de 0,3%, nada que indique uma recuperação mais consistente do setor. As fábricas continuam trabalhando com elevada capacidade ociosa e os estoques permanecem altos.
Muito por
fazer
» Para a diretora de Desenvolvimento Econômico da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), Luciana de Sá, o primeiro passo para o setor sair do atoleiro é a retomada da confiança na política econômica. Mas será preciso muito mais do que boas ações de Joaquim Levy. “A indústria precisa urgente de um plano que amplie sua competitividade. Até agora, não vimos isso”, diz.
Com Paulo Silva Pinto
Fonte: Correio Braziliense