Para analistas, superávit primário de 1,2% é meta possível, mas vai exigir ajuste forte
Com o cobertor curto e a meta anunciada de elevar o superávit primário para 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015, o esforço fiscal sinalizado pela nova equipe econômica para o próximo ano deve incluir, inevitavelmente, uma “lista de maldades”.
Economistas dão como certa a elevação da Cide sobre combustíveis, que foi zerada em 2012, o que pode elevar a arrecadação em 2015 entre R$ 4 bilhões e R$ 13 bilhões, de acordo com as estimativas de economistas ouvidos pelo Valor. A reversão do desconto de IPI para automóveis, já anunciada, pode render cerca de R$ 4 bilhões, mas para completar o ajuste, será preciso criar ou elevar alíquotas de outros impostos.
Os investimentos federais, que devem encerrar este ano em 1,2% do PIB, também devem entrar na linha de corte, com redução de até 0,5% do PIB. Ainda do lado do gasto, restrições maiores para concessão do abono, seguro-desemprego e pensões por morte podem levar a economia de 0,2% do PIB em 2015.
O ajuste deve contar com contenção no ritmo de alta das despesas, mas a maior parte do esforço adicional ocorrerá no lado da receita, estima o Itaú. Para o economista Luka Barbosa, o superávit primário de 2015 deve ser de 1,2% do PIB, em linha com o anunciado pelo novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. É um esforço adicional de 1% do PIB em relação ao superávit primário de 0,2% projetado para este ano. O aumento de receita deve responder por 0,52 ponto dessa alta, estima ele. O aumento do IPI para automóveis de 3% para 5% deve render R$ 4 bilhões a mais ao cofres públicos em 2015, enquanto a recomposição parcial da Cide elevaria a arrecadação em outros R$ 5 bilhões. O ajuste ainda exigiria receita de R$ 15 bilhões, ou 0,3% do PIB, adicional em 2015.
Do lado da despesa, a rigidez orçamentária torna a contenção de gastos mais difícil. O economista avalia que o corte deve recair sobre o gasto mais flexível, o investimento público, que teria redução de 0,34% do PIB em relação a 2014. A implementação de alterações nas regras de concessões de benefícios como seguro-desemprego, abono e pensão por morte, que vêm sendo discutidas pelo Ministério da Fazenda, reduziria a despesa em 0,2% do PIB, o suficiente apenas para compensar o aumento do gasto com benefícios sociais corrigidos pelo salário mínimo, que terá alta real de 2,5% no ano que vem.
Em conjunto, o aumento da receita e o corte no investimento, somados a um superávit primário de 0,3% dos Estados e municípios, seriam suficientes para alcançar a meta do ano que vem, diz o Itaú.
Alcançar um esforço fiscal de 1,2% do PIB, como sinalizado, é possível, mas dependerá de uma série de fatores, diz Gabriel Leal de Barros, pesquisador do Ibre-FGV.
“Nenhuma medida pontual é suficiente para reduzir o problema do ajuste. Há um mosaico de decisões que, se bem amarradas e bem comunicadas, pode contribuir para reequilibrar as contas”, afirma.
Nesse cenário, estariam o corte de investimentos, a redução tímida do abono e do seguro-desemprego – a reforma do sistema de pensão por morte teria efeito apenas no longo prazo – e a aumento da receita líquida de 0,35% do PIB.
Para tanto, o governo voltaria com o “combo IPI”, o que significa recomposição de alíquotas para automóveis, linha branca, móveis e construção civil, além do IOF sobre crédito pessoal, com arrecadação de R$ 15 bilhões. A Cide subiria gradativamente, para não afetar a inflação. “A estratégia de reversão das desonerações teria que conversar com a política monetária“, diz.
Felipe Salto, economista da Tendências Consultoria, conta com aumento da Cide e do IPI de forma integral já no primeiro ano, pois seria mais fácil elevar alíquotas de impostos existentes do que criar novos tributos. Outras opções seriam reverter renúncias sobre itens da cesta básica e o IOF. Além disso, diz, o contingenciamento de 2015 deve chegar a R$ 65 bilhões, sendo que desse total R$ 40 bilhões são do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). “Parece muito, mas o Orçamento está inflado. Esse corte só faz com que despesa cresça menos”.
Reduzir o gasto como proporção do PIB nominal, em um momento em que o crescimento é baixo e a inflação não deve superar o patamar atual, é tarefa complexa.
“Sem aumento de carga tributária, acho difícil fazer o ajuste proposto”, diz Mansueto Almeida, especialista em contas públicas.
Mesmo com esforço fiscal maior em 2015, a dívida bruta vai continuar a subir. O superávit primário necessário para manter o endividamento estável está hoje entre 2% e 2,5%, considerando PIB potencial de 2,5% e juro real de 4% no longo prazo, segundo o Itaú. Para reduzir o endividamento, será preciso também olhar para a política parafiscal.
Aumentar a TJLP, atualmente em 5% ao ano, seria um bom passo para reduzir o custo do Tesouro com os subsídios ao BNDES, diz Mansueto. “É uma alta líquida e certa”, já que foi proposta defendida pelo novo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa.
Fonte: Valor Econômico