Por A. Gary Shilling | Bloomberg
Quase todas as moedas do mundo estão caindo em relação ao dólar. A queda vem sendo induzida principalmente por governos e bancos centrais empenhados em desvalorizar suas moedas para ganhar vantagem no comércio global e estimular suas economias enfraquecidas.
Desde dezembro, 22 grandes moedas tiveram desvalorização média de 4,5% em relação ao dólar. Uma moeda mais depreciada barateia as exportações e essas ficam mais atraentes para os compradores estrangeiros. Uma moeda desvalorizada também leva ao aumento dos preços dos produtos importados, o que desencoraja os gastos dos consumidores domésticos com esses produtos.
Recentemente, autoridades do G-20, o grupo dos 20 países mais desenvolvidos do mundo, declararam que a desvalorização deliberada de uma determinada moeda em busca do crescimento doméstico é uma coisa aceitável, enquanto que a desvalorização para ganhar vantagem no comércio exterior não é. Não consigo ver a diferença, mas Janet Yellen, a presidente do Federal Reserve (Fed), consegue.
No testemunho que deu ao Senado americano em 24 de fevereiro, Yellen se opôs aos esforços do Congresso para acrescentar aos acordos comerciais sanções legais contra países que manipulam suas moedas, porque elas poderiam prejudicar o Fed. “A política monetária pode ter repercussões sobre as taxas de câmbio, mas eu realmente acho que não é certo chamar isso de manipulação cambial e colocar no mesmo balaio das intervenções nos mercados de câmbio, que realmente são voltadas para mudar o cenário competitivo em vantagem de um país”, disse.
Mas o Fed enfrenta um dilema: com outros países desvalorizando suas moedas em relação ao dólar, os EUA não podem derrubar o dólar de propósito. Como moeda mundial de reserva, contra o que ele poderia ser desvalorizado? O dólar mais forte torna as importações americanas mais baratas, o que força os produtores domésticos a permanecerem competitivos reduzindo os preços e demitindo funcionários para reduzir os custos. Então, a valorização do dólar trabalha contra o objetivo do Fed de manter a estabilidade dos preços e o pleno emprego.
As oscilações cambiais também estão confundindo outros bancos centrais. O Swiss National bank (o BC suíço) claramente esteve entre os manipuladores do câmbio quando atrelou o franco suíço na paridade de 1,20 franco por euro, em 2011. Para manter a âncora, o Banco CENTRALsuíço teve que vender continuamente francos para comprar euros. Em dezembro, 42% dos ativos do Swiss National bank estavam em euros, o equivalente a 36% do PIB suíço.
Mas ele de repente acabou com a âncora cambial em 15 de janeiro, uma semana antes de o Banco CENTRAL Europeu (BCE) anunciar que em breve começaria a comprar títulos de dívidas soberanas como parte de um programa de estímulo à economia. Rapidamente o franco suíço teve uma valorização de 30% em relação ao euro. Os problemas econômicos da zona do euro e a condição de porto seguro da Suíça atraíram muito dinheiro para o país. Isso valorizou o franco em relação ao euro, em detrimento das exportações suíças. A economia suíça está agora pagando o preço: em janeiro o índice de preços ao consumidor (CPI, na sigla em inglês) caiu 0,5% em relação ao mesmo período do ano passado.
Então, porque o Banco CENTRAL suíço parou com a âncora? Seu presidente, Thomas Jordan, disse que a âncora já serviu aos seus propósitos e, além disso, mantê-la não seria sensato no longo prazo. Não acho essas explicações convincentes. Os cortes nas taxas de juros que acompanharam o anúncio do fim da âncora foram bem pequenos e não deverão manter o dinheiro fora da Suíça.
Terá sido o Banco CENTRAL suíço pressionado por seus pares para parar de manipular o franco? Certamente os clientes estrangeiros das instituições financeiras suíças não ficariam satisfeitos se o franco seguisse a queda do euro após o anúncio do afrouxamento quantitativo pelo BCE, que o Banco CENTRAL suíço certamente sabia que estava para acontecer.
A Dinamarca também tem a coroa atrelada ao euro. As exportações chegaram a 54% do PIB no quarto trimestre de 2014, sendo que grande parte delas foi para países da zona do euro. Com o euro em queda antes e depois do anúncio do BCE em janeiro, e a Suíça acabando com sua âncora cambial, o BC da Dinamarca está lutando para impedir que a coroa dinamarquesa tenha uma valorização acima dos 7,6 coroas por euro (ela pode flutuar 2,25% acima e abaixo disso).
Em 5 de fevereiro, o Banco CENTRAL dinamarquês cortou as taxas de juros pela quarta vez em três semanas, para -0,75%. Em janeiro, a autoridade vendeu um volume recorde de coroas – o equivalente a 9% da economia da Dinamarca. No mês passado, as reservas internacionais do Banco CENTRAL aumentaram 173 bilhões de coroas, para 737 bilhões de coroas (US$ 111 bilhões). Seu presidente, Lars Rohde, disse que o Banco CENTRAL “tem os instrumentos necessários para defender a política de câmbio fixo pelo tempo que for necessário”.
Ao contrário da Suíça, a Dinamarca não tem um setor financeiro internacional enorme com que se preocupar, na medida em que sua moeda perde valor juntamente com o euro. Portanto, imagino que os dinamarqueses vão favorecer seu setor exportador e manter a coroa indexada.
Chame isso de manipulação do câmbio ou política econômica doméstica, mas a Dinamarca e quase todos os países do mundo querem que suas moedas fiquem mais baratas.
Fonte: Valor Econômico