Governo começa a preencher cargos

    O ministro da Aviação Civil, no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, despacha no gabinete do ministro da Secretaria de Relações Institucionais (SRI) e o centro nervoso da coordenação política do governo é o Palácio do Jaburu, a residência do vice-presidente, não o Palácio do Planalto, onde despacha a presidente da República. A mudança nos endereços de poder em Brasília tem um mês, nem todas as peças do novo quebra-cabeças foram encaixadas, mas o governo voltou a respirar no Congresso. Prova disso é a aprovação das duas medidas provisórias do ajuste fiscal, apesar do tropeço do fator previdenciário. 

    “São os primeiros passos, é um trabalho que tem muito pela frente mas já tem alguma sustentação”, diz Eliseu Padilha, o ministro da Aviação Civil que despacha na SRI. Padilha é o encarregado de negociar com os partidos que integram a base aliada uma planilha com 1,2 mil cargos do governo. Até agora foram publicados no “Diário Oficial da União” cerca de 30, mas o ministro de dupla militância tem uma certeza: “Voltou-se a ter alguma para a previsão do que vai acontecer”, diz o ministro. Na manhã da última quarta-feira, Padilha cravou que a MP 664 seria aprovada com alguma coisa entre 276 e 278 votos. Foram 277. 

    No comando da articulação política está o morador do Palácio do Jaburu, o vice Michel Temer. A interlocutores, Temer manifestou nos últimos dias que o pior já passou. A reorganização da base do governo evidentemente não está consolidada, mas o vice está certo que as últimas votações mostraram que o governo é capaz de articular maiorias no Congresso. Num primeiro momento, está afastada a ideia de impeachment da presidente da República. Mais tarde, Temer espera que a reorganização da base não só dê tranquilidade ao governo nas votações de seu interesse, como também permita ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy, lançar a agenda pós-ajuste. 

    Nos próximos dias, cerca de 100 cargos devem ser preenchidos por indicações políticas, na previsão da coordenação política. Temer, Padilha e até o mais influente ministro do governo, Aloizio Mercadante (Casa Civil) assumiram o discurso de que a base aliada deve governar junto. Padilha diz que é assim nos EUA. Mercadante, que não deve retaliar quem vota contra, mas governar com quem está junto. “Isso não é barganha. Barack Obama montou o governo com os quadros dele”, diz Padilha. “Nas democracias republicanas se constitui o governo com os quadros que apoiam o governo”. 

    Todos afirmam que o importante é a qualificação técnica do indicado. O que não pode é o político disfarçado de técnico, como seria o caso de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras apanhado nas malhas da Lava-Jato. “A Petrobras foi um ponto fora da curva”, assegura Padilha. Nas negociações atuais, nenhum partido fez indicações para a estatal. 

    De certa forma, a roubalheira na Petrobras serve para justificar a demora nas nomeações. Segundo fontes da Casa Civil e da SRI a triagem dos indicados ficou muito mais rigorosa. Há casos como o de um ex-prefeito do PT que já abrilhantou as rodas de Brasília, mas que hoje não consegue ser nomeado para um cargo do primeiro escalão por ter pendências a ajustar com o Tribunal de Contas da União. Trata-se de um cuidado novo, uma vez que o governo Dilma algumas vezes nomeou pessoas com dúvidas curriculares, caso do ex-presidente do Banco do Brasil e atual comandante da Petrobras, Aldemir Bendine, por exemplo, cuja gestão no BB é questionada por um empréstimo a uma amiga. 

    Por enquanto, as principais indicações acertadas na nova coordenação política foram de conselheiros para as agências de Transporte Terrestre, Saúde, Vigilância Sanitária, de Águas e para o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), algumas das quais com vagas abertas há mais de ano. As indicações estão no Senado para aprovação. Outra nomeação expressiva foi a do economista Márcio Holanda para a presidência do Banco do Nordeste (BNB), disputada pelo líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), o atual e o ex-governador do Ceará Camilo Santana (PT) e Cid Gomes (Pros), respectivamente, e líder da bancada do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE). Venceu o PMDB. Outras diretorias devem ser usadas para a composição nos Estados. 

    A nomeação de Holanda para o BNB é um parâmetro para as indicações para a área financeira. Apesar de indicado por Eunício, o presidente do Banco é um economista reconhecido e amigo do ministro da Fazenda, desde os bancos escolares. As vice-presidências financeiras do Bancodo Brasil e da Caixa Econômica Federal foram blindadas pela equipe de Levy. “O Banco do Brasil tem grande limitação, a Caixa tem limitações e o BNDES nem pensar”, afirma Eliseu Padilha sobre vices dos bancos federais. 

    Na Casa Civil, a qual pemedebistas atribuem o atraso das nomeações, existe o reconhecimento de que mudou o clima das reuniões da base aliada do governo. Há menos recriminações, sobretudo dos partidos menores da base como PP e PTB, para citar apenas dois exemplos. “Nós reabrimos o diálogo com todas as bancadas. Havia muitas expectativas que não tinham sido externadas”, conta Padilha. O PP já fechou acordo para ficar com a Companhia de Desenvolvimento Vale do São Francisco (Codevasf), enquanto o PTB, que já tem a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), está com as mãos numa vice-presidência do BB. 

    A composição dos cargos obedece a uma fórmula: as nomeações nacionais ficam com as bancadas federais e as bancadas regionais com os cargos nos Estados. Às vezes um deputado é um diligente aliado do governo federal em Brasília, mas aliado da oposição no Estado. Um bom exemplo é o deputado Ricardo Barros (PP). No Congresso costuma votar com a presidente Dilma Rousseff no Paraná sua aliança é com o governador Beto Richa. A instrução dada à bancada é abrir espaço para Barros no Paraná. “Tem que incluir os que votam sistematicamente com o governo. Ou vamos arbitrar, o que preferimos não fazer”, diz Padilha. 

    O PMDB ocupou a coordenação política, mas quando chega a hora de bater o martelo das nomeações, Mercadante e o ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini designados por Dilma, participam da decisão, ao lado de Temer e Padilha. No novo mapa da coordenação política, o ex-secretário-geral da Câmara, Mozart Viana, faz o acompanhamento do processo legislativo; o ex-deputado Rocha Loures é o encarregado da primeira triagem dos pedidos dos deputados. Padilha cuida da negociação para o preenchimento de cada uma das 1,2 mil células da planilha de cargos do governo.

    O governo federal dispõe de uma máquina muito grande de nomeações discricionárias, algo em torno de 22 mil cargos. Desses, cerca de três quartos ocupados por servidores; de 30% a 40% estão vagos. O trabalho político se dá em torno de 1.200 lugares. Até Dilma deve colaborar. “A presidente está com o sistema elétrico. É uma questão pessoal dela”, diz Padilha. Mas para a Eletrosul deve ir um irmão do senador Dario Berger (PMDB-SC), o que já estava acertado desde antes da nova coordenação política. Falta alguém avisar o ministro Juca Ferreira, que já avisou que não abre mão dos demandados cargos na Cultura. 

    O tropeço na votação do fator previdenciário não deve passar em branco. Há uma reunião dos partidos da base convocada para a noite de segunda-feira no Palácio do Jaburu para “discutir a relação”. O deputado Carlos Zarattini tirou a proposta de seu relatório da MP 664 mas encaminhou a favor da votação de uma emenda que o governo condenava. O PCdoB votou inteiro contra o governo. Se o fator for preservado no Senado, como se espera, Dilma deve vetar a lei e deixar que o assunto seja resolvido num fórum técnico-parlamentar. Padilha acha que a derrota não “machucou” o trabalho de reorganização da base, o tema era de apelo eleitoral, mas adverte: “Se houver passividade, pode constituir problema mais adiante”. 

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    Fonte: Valor Econômico

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