Crescimento do número de demissões nas empresas reduz contribuições ao INSS, que terá deficit de R$ 72,8 bilhões neste ano. Até o segmento de trabalhadores urbanos, tradicionalmente superavitário, fechará no vermelho
Notícia Gráfico
ANTONIO TEMÓTEO
O aumento do desemprego está atingindo em cheio as contas da Previdência Social. De janeiro a abril, segundo o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), 162.735 trabalhadores foram dispensados e, portanto, deixaram de fazer contribuições ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Se forem adicionados os demitidos em dezembro, a conta sobe para 718.243 pessoas. Com mais desocupação, menos receita e expectativa de elevação de gastos com benefícios, o governo estima um rombo previdenciário de R$ 72,8 bilhões em 2015.
Para piorar a situação, especialistas avaliam que há risco de que a Previdência urbana, tradicionalmente superavitária, fique no vermelho nos próximos meses. Dados do Ministério da Previdência Social apontam que, excluindo os trabalhadores rurais, o saldo entre a arrecadação e as despesas com benefícios foi positivo em apenas R$ 1,06 bilhão em janeiro, o que significou uma retração de 32,5% em relação ao mesmo período do ano passado. Em março, o superavit despencou para R$ 554,9 milhões, uma queda de 47,6% na comparação com janeiro e de 65,1% com igual mês de 2014. A tendência é que a situação piore em abril, já que, somente no quarto mês do ano, 97.828 pessoas foram demitidas, conforme dados do MTE. Os resultados, porém, ainda não foram divulgados pela Previdência, mesmo após o Tesouro Nacional ter publicado os números das contas públicas com o desempenho do INSS.
Deterioração
Com mais desemprego, as contas da Previdência Social, já combalidas, sofrerão um baque ainda maior. Pelas projeções atuariais do governo, será gasto um montante que corresponde a 9,26% do Produto Interno Bruto (PIB) para custear benefícios previdenciários, se além de empregados da iniciativa privada forem considerados servidores públicos federais e militares. Como a arrecadação do Executivo é insuficiente para honrar essas despesas, o rombo chegará a pelo menos R$ 144,2 bilhões em 2015. Essa necessidade de financiamento corresponde a 2,47% da geração de riquezas no país e seria suficiente para bancar o Bolsa Família por quase cinco anos. As estimativas fazem parte do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2016 e do relatório de avaliação de gastos do Ministério do Planejamento.
Para o economista-chefe da GO Associados, Alexandre Andrade, a deterioração do mercado de trabalho será forte em 2015 e se intensificará em 2016. Nas contas dele, a taxa de desocupação encerrará este ano em 6,2% e chegará a 7,5% no próximo, considerando apenas a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), que veriricaa taxa de desocupação em seis regiões metropolitanas. Pela Pesquisa Nacional por amostras de Domicílio Contínua (Pnad Contínua), o desemprego chegou a 8% no trimestre encerrado em abril.
Segundo Andrade, em 2014, mesmo com a atividade econômica fraca, o desemprego permanecia em patamares historicamente baixos porque a população economicamente ativa também estava em baixa. Ele explicou que muitas pessoas deixaram de procurar uma vaga no mercado formal porque o aumento da renda, sobretudo dos chefes de família, deu conforto para que os filhos se dedicassem somente aos estudos. Com a retração da economia e as dispensas em massa, a quantidade de pessoas em busca de um posto tende a disparar.
O economista ainda alertou que, desde dezembro de 2014, a contratação de trabalhadores com carteira assinada tem encolhido na comparação com o mesmo mês do ano anterior. “Dessa forma, o número de pessoas trabalhando por conta própria cresceu muito. Há uma deterioração do mercado de trabalho. As pessoas vão abrir o próprio negócio ou cairão na informalidade. O resultado é que elas não estarão protegidas pela Previdência Social porque não farão contribuições, e a tendência é de que a arrecadação do INSS diminua”, comentou.
Os dados do Ministério do Trabalho apontam que os setores que mais dispensaram mão de obra, de janeiro a abril, foram o comércio, com 142.286 desligamentos, a construção civil, com 76.165 dispensas, e a indústria de transformação, com o fechamento de 37.611 postos.
Sobrevivência
Na avaliação do especialista em previdência do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Marcelo Caetano, a tendência é que o desemprego aumente a deterioração das contas do INSS. Além disso, ele ressaltou que aqueles brasileiros que prorrogariam a aposentadoria para se manter no mercado em busca de um benefício maior, com mais tempo de contribuição, podem antecipar o requerimento porque foram dispensados e precisam de uma renda para sobreviver. “Esses dois efeitos vão pressionar as contas do governo. Não há expectativa de que o quadro macroeconômico mude pelo menos até 2017, e teremos o desemprego em alta nos próximos dois anos. Logo, os gastos previdenciários vão aumentar”, disse.
“As pessoas vão abrir o próprio negócio ou cairão na informalidade. O resultado é que elas não estarão protegidas pela Previdência Social porque não farão contribuições”
Alexandre Andrade, economista-chefe da GO Associados
Melhora só em 2017
Para o ex-secretario de Políticas de Previdência Social Leonardo Rolim, o aumento do deficit previdenciário será substancial em 2015 com a elevação do desemprego e a redução das contribuições ao INSS. Se confirmadas as previsões do governo, o rombo terá um aumento de 28,3% e passará de R$ 56,7 bilhões para R$ 72,8 bilhões. Rolim, no entanto, estima que a necessidade de financiamento ultrapassará os R$ 73 bilhões.
“Nos próximos meses, a previdência urbana deve ficar superavitária. Em agosto, quando há antecipação do 13º dos segurados, certamente o resultado será ruim, mas deve ser potencializado com o aumento do desemprego. Uma melhora só deve ocorrer em 2017 porque o ajuste fiscal deve surtir efeito e o país voltará a crescer e a gerar postos de trabalho.”
Segundo Rolim, o gasto previdenciário pressionará as contas públicas e dificultará o cumprimento da meta de superavit primário, a economia que o governo precisa fazer para pagar juros e evitar o descontrole da dívida. Com dificuldade de aumentar a arrecadação, o Executivo terá de destinar um montante ainda maior para cobrir a necessidade de financiamento da Previdência Social. Assim, o superavit primário ficará comprometido. Não à toa, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, defende a revisão das desonerações da folha de pagamento a fim de que as empresas aumentem o montante recolhido ao INSS para arcar com os benefícios.
Peritos
Na opinião de Rolim, as mudanças na Medida Provisória nº 664, que altera a concessão de benefícios previdenciários, comprometeram significativamente a economia que se pretendia fazer. Ele ressaltou que as regras de auxílio-doença, sobretudo, deveriam ter sido aprovadas como foram enviadas ao Legislativo. “O governo propôs que os primeiros 30 dias de afastamento fossem custeados pelo empregador. Pelo texto aprovado, fica como está. Só os primeiros 15 dias são pagos pelo patrão. Se a mudança tivesse passado, além de o INSS fazer uma economia significativa nos próximos anos, os peritos médicos diminuiriam significativamente a carga de trabalho porque muito tempo é dedicado à realização dos exames para a concessão do seguro por doença”, destacou.]
Fonte: Correio Braziliense