Sindicato quer que BC exclua bancos investigados por formação de cartel

    A Superintendência do Cade apurou que as práticas desleais à concorrência teriam ocorrido de 2007 até, pelo menos, 2013

    Agencia Estado

    O Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (Sinal) quer que a autarquia exclua de sua lista de dealers os bancos investigados pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) por suposta formação de cartel na manipulação de taxas de câmbio. O temor do presidente do Sinal, Daro Marcos Piffer, é o de que haja também irregularidades ainda não detectadas pela instituição e que estejam influenciando as cotações domésticas. O Cade também apura a manipulação de índices de referência de mercado de câmbio, como o do Banco Central do Brasil (Ptax), do WM/Reuters e do Banco Central Europeu (BCE). Os dealers são os bancos por meio dos quais o BC atua no mercado de câmbio. São 14 instituições escolhidas de acordo com o volume de negócios e a prestação de informações enviadas ao regulador.

    “A Ptax é uma taxa calculada pelo Banco Central e que acaba virando uma taxa real”, ressaltou Piffer em entrevista ao Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado. A Ptax é a taxa de referência para o valor do dólar colhida diariamente pela autarquia com as principais instituições que atuam nesse mercado. “Se existe um cartel desse tamanho em âmbito internacional, por que não existiria alguma coisa aqui no Brasil também?”, questionou o sindicalista.

    A Superintendência do Cade apurou que as práticas desleais à concorrência teriam ocorrido de 2007 até, pelo menos, 2013. Quando o órgão anunciou o início das investigações, o BC brasileiro informou que, “no uso de suas competências legais, está mantendo interlocução com o Ministério Público e o Cade, visando à atuação coordenada”. Procurado nesta quarta-feira, 15, novamente sobre a pressão do sindicato, o BC ainda não se pronunciou.

    Além do receio com a possível influência sobre as cotações do dólar, o sindicato também tem preocupação com as implicações do câmbio sobre outras variáveis importantes da economia, como, por exemplo, inflação e decisões sobre a taxa básica de juros. Atualmente, a Selic está em 13,75% ao ano. O Sinal promete mandar uma carta às autoridades do BC explicitando suas preocupações e pedindo a saída dos dealers cujos nomes apareçam no processo administrativo do Cade.

    As empresas investigadas no processo administrativo do Cade são Banco Standard de Investimentos, Banco Tokyo-Mitsubishi UFJ, Barclays, Citigroup, Credit Suisse, Deutsche Bank, HSBC, JP Morgan Chase, Merril Lynch, Morgan Stanley, Nomura, Royal Bank of Canada, Royal Bank of Scotland, Standard Chartered e UBS, além de trinta pessoas físicas. De acordo com o Cade, não há nenhuma instituição financeira brasileira nas investigações. De qualquer forma, o sindicato considera mais sensato, para evitar problemas posteriores, que seus pares no Brasil deixem de ser referência para a cotação doméstica do dólar.

    Já a lista de junho de dealers de câmbio do BC é composta pelas 14 seguintes instituições: Banco do Brasil, Banco BNP Paribas, Bradesco, Citibank, Banco de Investimentos Credit Suisse (Brasil), Goldman Sachs do Brasil, HSBC Bank Brasil, Itaú Unibanco, Banco JP Morgan, Bank Of America Merrill Lynch, Banco Morgan Stanley, BTG Pactual, Banco Safra e Santander (Brasil). As instituições que aparecem nas duas listas, portanto, são Citi Credit, HSBC, JM Morgan, Merrill e Morgan Stanley.

    Mudança
    Em setembro de 2010, o diretor de Política Monetária do BC, Aldo Mendes, anunciou mudança no critério de cálculo da Ptax, que é a média das cotações de compra das taxas de câmbio usadas no mercado interbancário ao longo do dia e que era divulgada diariamente por volta das 17h30. A fase de testes da mudança teve início em janeiro de 2011 e a substituição passou a valer em julho.

    Desde então, o cálculo da Ptax passou a ser feito com base em quatro consultas diárias às instituições credenciadas como dealers de câmbio (10h, 11h, 12h e 13h). Os resultados de cada consulta passaram a ser definidos pela média das cotações, excluindo as duas maiores e as duas menores informadas. A taxa Ptax, que começou a ser divulgada diariamente pouco depois das 13 horas, agora é formada pela média aritmética simples das quatro consultas.

    Na ocasião do anúncio das mudanças, Aldo Mendes argumentou que, com a nova forma de apuração da taxa, o BC procurava modernizar o mercado de câmbio brasileiro, já que a avaliação era de que essa nova forma de coleta seria mais representativa do mercado e teria divulgação também mais “tempestiva”. Antes das mudanças, a Ptax era obtida por meio de uma média ponderada das cotações realizadas ao longo do dia pelo mercado. Atualmente a consulta é feita por meio de um telefonema.

    Mendes não falou disso abertamente, mas sabe-se que a intenção do BC com a mudança era a de evitar “operações Zé com Zé” do mercado feitas para influenciar o rumo da cotação num determinado dia. Essas operações, difíceis de serem detectadas como tais, seriam realizadas entre algumas instituições, que compravam e vendiam moeda entre si elevando ou baixando a cotação de acordo com os interesses dos envolvidos. Como era um acordo entre as partes, ninguém saía perdendo com essas operações específicas, mas todas teriam benefício potencial com a cotação fechada mais para cima ou mais para baixo.

    Investigação
    O parecer da Superintendência do Cade aponta para “fortes indícios” de práticas anticompetitivas de fixação de preços e condições comerciais entre as instituições financeiras concorrentes. As instituições financeiras acusadas também teriam se coordenado para influenciar índices de referência dos mercados cambiais, por meio do alinhamento de suas compras e vendas de moeda.

    Foram encontrados ainda, conforme o órgão antitruste, indícios adicionais de práticas anticompetitivas de compartilhamento de informações comercialmente sensíveis sobre o mercado de câmbio, como informações sobre negociações, contratos e preços futuros; ordens de clientes; estratégias e objetivos de negociação; posições confidenciais em operações e ordens específicas; e o montante de operações realizadas (fluxos de entrada e saída).

    Os acusados têm 30 dias para apresentar defesa, contados a partir do dia 2 de julho, quando a instauração do processo de investigação foi formalizada no Diário Oficial da União. A decisão final sobre o caso caberá ao tribunal do Cade.

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