Incerteza política faz dólar encostar nos R$4

    O temor de que o Congresso Nacional derrube os vetos presidenciais às propostas que podem aumentar as despesas públicas em R$ 127,8 bilhões até 2019 fez a Bolsa de Valores de São Paulo (BM&FBovespa) desabar 1,43% no pregão de ontem, aos 46.590 pontos. O mercado de capitais brasileiro ainda foi afetado pelos rumores de que o Federal Reserve (Fed), o banco central norte-americano, aumentará os juros em dezembro, o que provocará uma fuga de capitais para a economia norte-americana. Esses boatos, que repercutiram durante o fim de semana, levaram o dólar a encerrar o dia cotado a R$ 3,981, uma alta de 0,57%, depois de ter atingido R$ 3,99 no início da tarde. 

    No mercado futuro, a divisa norte-americana ultrapassou os R$ 4. Pelas contas do economista chefe da TOV Corretora, Pedro Paulo Silveira, o real é a segunda moeda que mais se desvalorizou em relação ao dólar nos últimos 12 meses, com queda de 67,29%. Somente o rublo, da Rússia, teve uma perda de valor maior: de 72,37%. Ele explicou que os rumores de que o Fed aumentará os juros dos Estados Unidos em dezembro afetaram mercado global de câmbio. “Mesmo se o Brasil não enfrentasse uma crise tão severa, sentiríamos os efeitos dos boatos aqui”, comentou. 

    Silveira ainda ressaltou que sem a perspectiva de que o governo aprove no Congresso o ajuste fiscal, os investidores mantêm a percepção de risco em relação ao país e se desfazem das posições no mercado acionário brasileiro.Oeconomista alertou que todo esse imbróglio mantém o nível de atividade em baixa, retarda as expectativas em relação à economia e as decisões de gastos das famílias e das empresas. Isso levará a uma piora da arrecadação,que ampliará o deficit público. “Esse cenário eleva a chance de a Moody”s ou a Fitch rebaixar a nota de crédito do Brasil, seguindo a decisão recente da S&P. Com a nota rebaixada, ainda mais investidores estrangeiros sairão do país, desvalorizando mais o real. O dólar pode terminar o ano cotado aR$ 4,50”, explicou. 

    O economista-chefe da TOV Corretora destacou que os sinais de que a perda do grau de investimentos deve ocorrer ainda este ano se materializaram após o governo divulgar o resultado da arrecadação de agosto. Ele afirmou que a queda 10% relação a julho e de 9% em termos reais em relação ao mesmo mês do ano passado mostramqueopaísnãotemcomo reagir à crise semaltade impostos. “Esse dado aumentou a expectativadepioradodeficitpúblicoe,por consequência, de piora da relação dívida /PIB, que indica a sustentabilidade de longo prazo das finan- çaspúblicas”, afirmou.

     

    Nas alturas 

    Na avaliação do gerente de investimentos da BullMark Financial Group, Hugo Monteiro, as incertezas em relação ao mercado externo e a crise política foram os principais fatores que levaram o dólar a encerrar o dia cotado a R$ 3,98. “O mercado está preocupado com o cenário internacional, principalmente com a China e a sinalização de aumento dos juros nos Estados Unidos. No curto prazo, as preocupações em relação às pautas bombas recolocaram a moeda norte-americana em valorização”, detalhou 

    Para ele, nem a intervenção do Banco Central no mercado cambial com leilões de linha com compromisso de recompra ou com a rolagem de swaps são suficientes para conter a volatilidade da divisa norte-americana. Monteiro ainda ponderou que sem a aprovação do ajuste fiscal e de reformas estruturais o Brasil permanecerá exposto a crises. “Não há espaço para que o dólar pare de subir. Acreditamos que a moeda ultrapassará os R$ 4 nas próximas semanas. E a bolsa de valores vai continuar sofrendo no curto prazo enquanto o governo não estancar a crise política”, acrescentou. 

    O analista ainda comentou se os vetospresidenciais aosprojetos que aumentam os gastos públicos forem derrubados pelo Congresso, o governo não terá condições de tirar a economia brasileira do atoleiro. “O mercado teme que todas as tentativas de acerto do Executivo de arrumar a casa sejam frustradas comomais aumentode despesas. O pior de tudo é constatar que não existe no país qualquer sinal de que a crise política será contornada e haverá consenso para aprovação de medidas para tirar oBrasil do atoleiro”,disse

     

    Risco Brasil 

    O analista da XP Investimentos Ricardo Kim comentou que o excesso de volatilidade no mercado cambial e as quedas constantes na Bolsa de Valores estão precificadas pelo mercado, que espera uma queda da nota de crédito do país até o fim do ano.Conforme ele, os Credit Default Swaps (CDS) brasileiros, espécie de seguro que mede o risco de um país dar calote,registrou a marca recorde de 428 pontos, mais que o dobro em relação aos 202 pontos observados no fim de 2014. “Esse patamar é maior do que o da Rússia, que já perdeu o grau de investimentos e está em uma crise profunda”, sinalizou. 

    Kim ainda ponderou que se os vetos presidenciais forem derrubados pelo Congresso na sessão de hoje a tendência é de mais queda da Bolsa deValores e de alta do dólar. O analista destacou que a crise econômica brasileira pode ser potencializada com uma alta de juros nos Estados Unidos. “Vivemos um momento crítico no cenário interno e no cenário externo. E a tendência é de que as coisas piorem nos pró- ximos meses se o ajuste fiscal não sair do papel”, finalizou.

     

    Perda disseminada 

     Entre as principais ações do Ibovespa, a alta das ordinárias da Fibria, de 2,51%, e a queda nas preferenciais da Gol, de 9,87%, tiveram um fator em comum: o encarecimento do dólar. A moeda americana favorece as receitas da exportadora de celulose, mas aumenta os custos da companhia aérea, especialmente com combustível e arrendamento de aviões.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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