Dólar ultrapassa R$ 4,05 e fecha no maior nível da história

    Logo no início do pregão, o dólar rompeu a barreira dos R$ 4 e se manteve nesse patamar durante todo o dia. A expressiva deterioração da moeda, notadamente desde agosto, levou a cotação a um nível nunca atingido na história do real. Com a alta de 1,84% registrada ontem, o dólar terminou as operações a R$ 4,053. Apenas neste mês, a apreciação da moeda americana alcança 11,73%; no ano, chega a 52,39%.

    Mesmo com a nova escalada de ontem – a moeda bateu em R$ 4,0666 na máxima do pregão -, o Banco Central permaneceu fora do mercado, sem anunciar nenhuma intervenção adicional. 

    O contínuo fortalecimento da moeda americana frente ao real nas últimas semanas reflete a falta de perspectiva de uma melhora do quadro fiscal e a preocupação com a possibilidade de rebaixamento da nota de crédito do Brasil para grau especulativo por uma segunda agência de classificação de risco, em meio a um cenário externo já desfavorável para as moedas emergente. 

    A alta do dólar e a incerteza fiscal também pressionam os futuros de juros. Ontem, a taxa do contrato DI (Depósito Interfinanceiro) para janeiro de 2021 fechou no maior patamar desde o início de sua negociação na BM&F, a 16,14%.

    Segundo Alberto Ramos, diretor do grupo de pesquisas econômicas para América Latina do Goldman Sachs, o câmbio reflete as incertezas em relação ao cenário político e fiscal, que aumentam a chance de o país perder o grau de investimento por uma segunda agência de risco. 

    Isso poderia provocar uma saída de recursos do Brasil, uma vez que muitos fundos não podem aplicar em países que tenham a nota de crédito rebaixada para grau especulativo por duas agências. “Por enquanto, não estamos vendo uma saída de recursos, mas a piora do sentimento em relação ao Brasil faz com que os investidores reduzam sua posição e esse processo é contínuo”, afirma. 

    Na avaliação de Ramos, o patamar acima de R$ 4 já supera o nível de equilíbrio, que estaria mais próximo de R$ 3,40 a R$ 3,50. “O real está barato, mas dada a deterioração dos fundamentos macroeconômicos, o câmbio deveria estar acima do nível do valor justo”, diz.

    “O mercado está demandando proteção porque não vê perspectiva de ajuste fiscal de curto prazo nem de longo prazo”, diz o economista-chefe e gestor de investimentos da INVX Capital Asset, Eduardo Velho. Dessa forma, diz o especialista, o comportamento não pode ser chamado de exagerado. 

    Ontem a agência de classificação de risco Fitch Ratings esteve reunida com a equipe econômica para avaliar as contas públicas do país. A Fitch mantém a nota de crédito do Brasil dois níveis acima do grau de investimento. 

    A expectativa pela votação dos vetos às chamadas “pautas-bomba”, que implicariam em um aumento dos gastos do governo, também ajudou a aumentar a apreensão no mercado. 

    Além das questões domésticas, o câmbio sofre pressão do ambiente externo. A preocupação com o rumo da política monetária americana e com a desaceleração da China provocaram a desvalorização das moedas emergentes ontem, especialmente as atreladas a commodities. 

    Nesse cenário, analistas não esperam que o BC atue por meio da oferta de dólar físico, sob o risco de gerar ainda mais pressão no mercado. “Às vezes, oferecer muito ´hedge´ só aumenta a demanda do mercado por esse instrumento”, diz Velho. Mas, mesmo a oferta de linhas de câmbio, ressalta, tem consequências fiscais negativas, pois o BC acaba ampliando a liquidez em reais ao usar esse instrumento. “Acho que o BC terá de ser muito prudente e observar mais o mercado antes de voltar a atuar.” 

    O BC tem ressaltado que a desvalorização do câmbio contribui para o ajuste do déficit em conta corrente. Apesar do efeito do câmbio na balança comercial ser mais demorado, Ramos, do Goldman, lembra que em termos reais a desvalorização foi muito menor, dada a inflação alta no Brasil, que acumula avanço de 9,53% em 12 meses até agosto.

    De acordo com o BC, a taxa real de câmbio efetiva do Brasil – que corresponde a uma média da cotação da moeda brasileira em relação a uma cesta de moedas ponderada pela participação dessas divisas no total das exportações – acumula depreciação de 11,55% no ano, até julho, último dado disponível, comparada a uma desvalorização nominal de 28,75% no período. Em relação ao pico de outubro de 2002 – quando a moeda alcançou R$ 3,99 -, a taxa real de câmbio ainda está 37,34% abaixo do alcançado naquele período. 

    Com a alta do dólar, crescem as dúvidas se o BC deve retomar a alta de juros. O economista do Barclays especialista em Brasil, Bruno Rovai, não acredita que o BC deve subir a taxa básica de juros no curto prazo. “Não é um movimento especulativo contra a moeda brasileira que precisa ser combatido por juros”, diz Rovai, que prevê um câmbio a R$ 4,20 no fim de 2015 e de R$ 4,50 no fim de 2016. 

    “Sem o fiscal em ordem, o aperto monetário poderia até dar um alívio para as projeções no curto prazo, mas não traria a confiança de volta”, afirma Solange Srour, economista-chefe da ARX Investimentos. 

    Para o sócio e gestor da Quantitas, Rogério Braga, os prêmios de risco na parte curta da curva de juros, que reflete a aposta em um alta de 2,5 pontos percentuais da taxa Selic até o meio do ano que vem, parecem exagerados. Ontem, o DI para janeiro de 2016 subiu de 14,54% para 14,58%, enquanto o DI para janeiro de 2017 avançou de 15,64% para 15,75%. 

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    Fonte: Valor Econômico

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