Maioria de cargos comissionados são ocupados por servidores escolhidos sem qualquer critério de eficiência ou produtividade. Nomeações ocorrem, muitas vezes, apenas para turbinar salários
A falta de normas e critérios para que servidores ocupem funções comissionadas e de chefia nos três Poderes tem criado castas e distorções salariais no Executivo, no Legislativo e no Judiciário. Para piorar a situação, o trabalho desenvolvido por quem recebe uma gratificação não é avaliado para que seja possível monitorar resultados ou para apurar o nível de produtividade de uma determinada equipe. Especialistas ainda alertam que falta transparência na divulgação dos gastos com esses trabalhadores é outro problema.
Somente no Executivo, existem 22.823 postos de Direção de Assessoramento Superior (DAS). Desse total, 16.952, ou 74,2%, são ocupados por servidores, conforme o Boletim Estatístico de Pessoal e Informações Organizacionais do Ministério do Planejamento. Eles recebem 60% da gratificação e têm um salário médio de R$ 11.462,59. Quem não tem vínculo com a administração pública recebe, em média, R$ 4.502,61 com o DAS. O documento, entretanto, não aponta quanto o governo gasta com os DAS e última publicação disponível é de fevereiro. Os ocupantes desses postos não são avaliados para que seja possível medir a eficiência do trabalho realizado ou a produtividade de uma equipe. A única diretriz explícita é um decreto presidencial que dispõe sobre o provimento desses cargos.
Pelo dispositivo legal, dos DAS de nível 1 a 3, 75% devem ser ocupados por servidores. Nos de nível 4, metade deve ser destinado a concursados. Existem ainda no Executivo, outras 76.694 funções comissionadas. Um levantamento da União dos Advogados Públicos Federais (Unafe) aponta que, na Câmara dos Deputados, 1.650 funções comissionadas são ocupadas por servidores. No Senado Federal, 1.603 estão preenchidos por quem passou em um concurso público.
No Supremo Tribunal Federal, dos 2.880 servidores, 1.603 ocupam funções comissionadas. Para Alessandra Minadakis, diretora da Unafe, o número elevado de funções comissionadas na administração pública federal é um problema. Ela explica que na carreira dos advogados públicos existem quase 2 mil postos, entre funções de confiança e DAS. E a maioria desses cargos não significa chefia, apenas um acréscimo salarial dado a quem o chefe escolhe. Mais de 1,3 mil dessas funções foram colocadas à disposição do governo pelos ocupantes.
Segundo Alessandra, a categoria avaliou que o pagamento desses valores adicionais para apenas parte dos servidores cria uma casta dentro do serviço público. A Unafe é favorável a extinção desses postos e a equiparação salarial com membros do Ministério Público Federal a partir de 2019. Essa mudança tramita no Congresso Nacional por meio da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 432. “As funções de chefia poderiam ser decidas por meio de eleições ou por meio de revezamento entre integrantes de uma equipe”, explicou.
Objetivos
Para Raul Velloso, consultor econômico e especialista em finanças públicas, a administração pública precisa de alguma flexibilidade para a contratação de pessoal a fim de atingir os objetivos traçados e atender à população da melhor maneira possível. Para ele, o problema é a falta de planejamento, monitoramento e avaliação das ações. De acordo com ele, sem esse acompanhamento é impossível apurar resultados. “A cobrança não deve ser feita por meio de restrições aos servidores. A dimensão desse trabalho é setorial. A partir do monitoramento de uma área é possível cobrar as pessoas por resultados. Isso não existe atualmente”, comentou.
Na avaliação do especialista em finanças públicas José Matias-Pereira, na administração pública não existem critérios básicos como meritocracia e postura ética dos servidores. Ele comentou que, nos últimos anos, o governo aparelhou a máquina pública e travou o desenvolvimento do trabalho. “O governo se exime de discutir que as funções comissionadas mais altas da República tÊm sido ocupadas por pessoas com baixo nível de competência. E esses ocupantes são escolhidos por meio de critérios políticos e não técnicos, que condenam o trabalho. Não importa se o posto é ocupado ou não por um servidor”, comentou.
Mais 1,5 mil vagas abrem hoje
Com a decisão do governo de suspender os concurso em 2016, as seleções estaduais e municipais ganharam força entre os concurseiros. Hoje, pelo menos 14 órgãos públicos abrem inscrições para novas seleções. Ao todo, são 1.526 vagas, para todos os níveis de escolaridade, com salários que chegam a R$ 14.220,16. O com remuneração mais atrativa é o certame para a Amazônia Azul Tecnologias de Defesa, órgão federal que cuida do desenvolvimento do submarino nuclear brasileiro, que oferece contratação de 18 profissionais temporários de níveis técnico e superior. Também fazem parte da lista as prefeituras de Balsas (MA), de Ibicuitinga (CE), de Iperó (SP), de Naque (MG), de Poços de Caldas (MG), de São José da Lapa (MG), de Setubinha (MG), a Serviço Autônomo de Água e Esgosto de Formiga (MG), o Tribunal de Contas do Rio Grande do Norte, o Tribunal Regional Eleitoral do Amapá (AM), a Universidade do Estado da Bahia, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Farra dos comissionados
Veja o total de cargos ocupadas por servidores
No Executivo
Cargos comissionados Com vínculo Sem vínculo total
DAS-1 5.506 1.786 7.291
DAS-2 4.735 1.533 6.268
DAS-3 3.153 1.243 4.396
DAS-4 2.629 959 3.588
DAS-5 794 281 1.075
DAS-6 136 69 205
TOTAL 16.953 4.085 22.823
No Legislativo
Câmara dos Deputados
Total de servidores Funções ocupadas por servidores
3.324 1.650
Senado Federal
Total de servidores Funções ocupadas por servidores
2.880 1.603
No Judiciário
Supremo Tribunal Federal (STF)
Total de servidores Funções ocupadas por servidores
1.129 689
Superior Tribunal de Justiça (STJ)
Total de servidores Funções ocupadas por servidores
2.870 1.817
Falta de transparência
» Cargos são ocupados sem critérios e avaliação de competências
» Além dos 22.823 DAS, existem 99.517 funções comissionadas no Executivo Federal ocupadas exclusivamente por servidores
» Não existem no Executivo normas que definam quais são os critérios para que os servidores recebam uma função. Essa realidade se estende ao Legislativo e ao Judiciário
» No caso dos DAS de nível 1 a 4, o Decreto Presidencial nº 5.497, de 21 de julho de 2005, fixa apenas o percentual de cargos que devem ser ocupados por servidores.
» Dos DAS de nível 1 a 3, 75% são destinados a servidores. E dos de nível 4, 50%. A norma não trata sobre os níveis 5 e 6.
Fonte: Boletim Estatístico de Pessoal de fevereiro de 2015 e sites dos respectivos órgãos
Fonte: Correio Braziliense