Dilma volta dos EUA com a tarefa de definir as mudanças administrativas na Esplanada. Principal problema é relação entre PT e PMDB
A presidente Dilma Rousseff retoma hoje as conversas na tentativa de concluir a mudança na equipe ministerial dentro do prazo inicialmente previsto por ela própria: o fim do mês de setembro. Depois de quatro dias em Nova York, Dilma precisa fechar a equação com PMDB e PT para salvar a reforma administrativa que ficará muito aquém da imaginada para reduzir os gastos e que obrigou a petista a entregar ao PMDB o Ministério da Saúde.
Esta, inclusive, parece ser a única certeza nas mudanças desenhadas até o momento, com a ida do deputado Manoel Júnior (PMDB-PB) para substituir o petista Arthur Chioro. Chioro, que desde a semana passada tem feito reuniões internas para despedir-se dos subordinados, deu entrevista ontem afirmando que, com os cortes orçamentários previstos para 2016, os recursos para financiar ações de média e alta complexidade do ministério só chegam até setembro, deixando três meses a descoberto.
Ciente da fragilidade da presidente Dilma e da explícita dependência do apoio do PMDB para se manter no cargo, os peemedebistas expõem suas faturas. Apoiado pelas bancadas de ambas as Casas do Congresso, o ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves, praticamente assegurou a permanência no cargo. Os caciques da legenda também impuseram outras condições ao Planalto.
Eles fizeram, por exemplo, com que a presidente desistisse de fundir as secretarias nacionais de Aviação Civil e Portos em uma única pasta de infraestrutura, para que todos os apadrinhados fossem contemplados. Nas hostes peemedebistas, a expectativa é de que os deputados, além de Manoel Junior, emplaquem Celso Pansera (PMDB-RJ) na Secretaria Nacional de Aviação Civil.
Já os senadores mantêm Eduardo Braga em Minas e Energia, Kátia Abreu na Agricultura e devem conseguir nomear Helder Barbalho, filho do senador Jader Barbalho, na Secretaria de Portos. “Portos ou Aeroportos, praticamente, tanto faz. O importante é a garantia de que Helder fica na Esplanada”, disse um cacique peemedebista.
Pansera é visto com maus olhos fora do PMDB. Durante depoimento à Justiça Federal no Paraná e em audiência da CPI da Petrobras no Congresso, o doleiro Alberto Youssef, um dos principais operadores do esquema de corrupção investigado na Operação Lava-Jato, acusou Pansera de ser “pau mandado de Cunha (Eduardo Cunha, presidente da Câmara) e de ameaçar a família do doleiro. “Youssef deveria ter saído algemado da CPI por ter desacatado um parlamentar”, disse um dirigente do PMDB. Para contemporizar, logo em seguida. “Se formos fazer uma análise crítica da bancada da Câmara, sobram poucos nomes para indicar”, divertiu-se o peemedebista.
Todas as demais mudanças continuam nebulosas. Dilma deixou ordens expressas, ao deixar o país, para que o ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini; o assessor especial da Presidência Giles de Azevedo; e o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, continuassem as conversas com os aliados para evoluir nas negociações. “Nada andou sem a presidente no país. Vamos esperar que o retorno dela acelere esse processo”, disse um interlocutor de uma legenda aliada.
Estigma
Diante da enxurrada de especulação que fervilha a bolsa de apostas do governo federal, voltaram os rumores de que Aloizio Mercadante poderá deixar o cargo. A saída do principal ministro do governo é uma hipótese que sempre surge, mas que ninguém crava como verdadeira. “Ele está em uma situação complicada porque ficou estigmatizado. Todos os problemas do governo são atribuídos a ele, mesmo aqueles com os quais Mercadante não tem nenhuma relação”, brincou um negociador partidário.
Outro aliado tem plena convicção de que Mercadante fica onde está. “Ele apenas foi alijado desta reforma”, disse o líder partidário, jurando que o chefe da Casa Civil não foi substituído por outros petistas na articulação política. “Quem está conduzindo a reforma é a Dilma. Berzoini e Giles ficam ao lado dela, mas calados, sem dar palpites”, disse o parlamentar, mostrando que o estilo centralizador da presidente continua presente.
Críticas das centrais sindicais
As centrais sindicais consideram um “retrocesso político” o plano do governo Dilma Rousseff de fundir o Ministério do Trabalho com o Ministério da Previdência. Em nota conjunta assinada pelas seis maiores centrais do país, a que a reportagem teve acesso, os sindicalistas afirmam que a ideia vai gerar “enormes prejuízos aos trabalhadores e à sociedade em geral”. A nota será divulgada nesta terça-feira. “A ideia da fusão destes ministérios já foi levantada antes, resultando, por força da realidade, no modelo atual, com dois ministérios distintos. Os ministérios do Trabalho e da Previdência Social são responsáveis por zelar de direitos inalienáveis dos trabalhadores, e o processo de fusão pode resultar em enormes danos a suas já combalidas estruturas administrativas”, dizem os sindicalistas.
Defesa da CGU
Os servidores da Controladoria-Geral da União (CGU) farão hoje uma nova manifestação contra a ideia do governo de tirar da pasta status de ministério. Eles distribuíram um panfleto apropriando-se de uma frase entoada durante as manifestações de junho de 2013 “hoje vai ser maior”, convocando uma concentração em frente ao prédio da pasta, no Setor de Autarquias Sul. Ontem, eles fizeram uma caminhada na Esplanada dos Ministérios. Além da perda do status, eles temem os boatos de que as atribuições da CGU serão desmembradas entre os Ministérios da Justiça, da Casa Civil e do futuro Ministério da Cidadania.
Análise da notícia
Pouca chance de dar certo
Uma reforma ministerial que começou atravessada, decidida de sopetão em uma reunião reduzida no Palácio da Alvorada, anunciada de surpresa após uma coordenação política e que gerou uma crise na estrutura de comunicação de governo, tem poucas chances de ser exitosa. Apesar de todos os elogios feitos por interlocutores de que a presidente Dilma Rousseff resolveu ouvir mais os aliados neste processo de reconstrução do governo, o caminho que se delineia não é muito alvissareiro.
Dilma, muito provavelmente, ficará aquém do imaginado anteriormente. E gerou reclamações estridentes de todos os lados. Por pressão do PMDB, que foi chamado à mesa e, claro, partiu com volúpia sobre o cardápio que lhe foi exposto, as secretarias de Aviação Civil e Portos não serão mais fundidas. Tampouco a nova estrutura será anexada aos Transportes, para não melindrar o PR.
Como não quer desalojar o PDT, Dilma prometeu o Ministério das Comunicações para uma das legendas menos fiéis ao Planalto. Desaloja o PT da pasta e afasta – felizmente, por sinal – as chances do partido conseguir emplacar o processo de regulamentação da mídia. Também não mexeu com os interesses do PP, que segue na Integração Nacional à frente de um dos orçamentos mais polpudos da Esplanada, apesar de estar envolvido dos pés à cabeça nas investigações da Lava-Jato.
Desesperada para escapar do impeachment, Dilma foi obrigada a oferecer ao PMDB o Ministério da Saúde, maior orçamento da Esplanada e responsável pelos principais programas sociais do governo. Ingenuamente, o PSDB ainda exige que a presidente renuncie ao cargo. Precisa? (PTL)
Fonte: Correio Braziliense