Cenário fiscal domina reunião de BC com analistas

    A preocupação com a deterioração do quadro fiscal e a eficácia da política monetária nesse cenário dominou os dois encontros de economistas com o diretor de Política Econômica do Banco Central, Altamir Lopes, ontem em São Paulo. As reuniões fazem parte da agenda do BC e servem de subsídios para a autoridade monetária preparar o Relatório Trimestral de Inflação (RTI).

    Diferentemente da primeira reunião em que mais ouviu do que falou, Lopes chegou questionar os economistas no segundo encontro sobre a não revisão das projeções de inflação apesar de o câmbio ter recuado para a casa dos R$ 3,80. Segundo os agentes, a perspectiva de novas altas de impostos, como a da Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) – que incide sobre os preços dos combustíveis – e a leitura de que esse nível de câmbio é transitório fazem com que as expectativas de inflação sigam elevadas.

    De acordo com dois participantes do encontro, a visão geral foi de que a esperança cada vez menor de uma resolução para o desequilíbrio das contas públicas tem aumentado os riscos para a inflação, que deve chegar à meta apenas depois de 2017. “Ninguém está vendo ambiente político para reformas. Simplesmente não se enxerga caminho para resolver a situação que o país vive hoje”, relata um participante do encontro.

    Para alguns economistas, a desancoragem das expectativas de inflação reflete a piora da política fiscal e enquanto não houver uma melhora desse quadro, a eficácia da política monetária é restringida. “Ficou claro que não se acredita que estamos em dominância fiscal, mas que estamos caminhando a passos largos para essa situação.”

    Parte dos agentes de mercado, no entanto, defende que é necessário um aumento de juros para ajudar a ancorar as expectativas.

    De acordo com um participante do segundo encontro, o diretor do BC deu a entender que a autoridade monetária ainda não acredita que o país esteja numa situação de dominância fiscal, quando aumentos de juros são ineficazes para controlar a inflação.

    Alguns economistas presentes nos encontros já preveem uma inflação acima do teto da meta, de 6,5% para o ano que vem, apesar da piora da perspectiva para a atividade econômica.

    Pesquisa Focus, divulgada ontem, mostra que a mediana das projeções para o IPCA deste ano subiu de 9,91% para 9,99%, enquanto a estimativa para 2016 avançou de 6,29% para 6,47%.

    Em relação ao debate sobre como o BC deve lidar com a deterioração das expectativas de inflação, Lopes disse que o tema foi abordado no parágrafo 31 da ata do Comitê de Política Monetária (Copom), divulgada em 29 de outubro. Na ata, o Comitê ressalta que “há incertezas associadas ao balanço de riscos, principalmente, quanto à velocidade do processo de recuperação dos resultados fiscais e à sua composição, e que o processo de realinhamento de preços relativos mostra-se mais demorado e mais intenso que o previsto. Nesse contexto, o Comitê entende que, independentemente do contorno das demais políticas, a política monetária deve se manter vigilante, de forma a assegurar o cumprimento dos objetivos do regime de metas e a convergência da inflação para a meta de 4,5% no horizonte relevante.”

    O diretor do BC ainda questionou os economistas sobre a previsão para atividade no ano que vem, e o quadro foi de muito pessimismo, com alguns deles já prevendo queda de 3% do PIB para 2016.

    De forma geral espera-se que o PIB deste ano decline em torno de 3,5% e caia de 1,5% a 2,5% em 2016. A mediana das projeções na pesquisa Focus para 2015 aponta para queda de 3,10% neste ano e recuo de 1,9% em 2016. “Com a economia ainda mais fraca, o desemprego deve aumentar, derrubando a renda e impedindo a reação do consumo”, disse um participante da primeira reunião.

    Sobre o cenário externo, o destaque foi a preocupação com a economia chinesa. Em relação à política monetária americana, um participante não descartou o risco de um ajuste mais rápido nas taxas de juros, diante da recuperação consistente da economia dos EUA.

    Fonte: Valor Econômico

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