O risco de uma apreciação maior do câmbio prejudicar a melhora das contas externas, que tem sido uma das frentes positivas da economia brasileira, reforça a percepção de que um dólar a R$ 3,50 tem sido um piso para o Banco Central intensificar as atuações. Embora o BC enfatize que não mira um nível específico para o câmbio, a autoridade monetária tem ampliado as intervenções por meio da oferta de contratos de swap cambial reverso, que equivalem a uma compra de dólares no mercado futuro, quando a moeda americana cai abaixo desse preço.
De acordo com economistas, o dólar cotado a menos de R$ 3,50 – na sexta fechou a R$ 3,4388 – já começa a ficar sobrevalorizado, próximo ou abaixo da taxa de equilíbrio, aquela que mantém estável o balanço de pagamentos.
Para conter a forte apreciação do real em 2011, na esteira do boom das commodities e aumento do fluxo de capital para o Brasil pós-crise financeira que levou o real ao maior nível da história, o BC atuou fortemente no mercado. A intervenção foi por meio da colocação de swap cambial reverso e de compras de dólares no mercado à vista, que ajudaram a incrementar as reservas internacionais, que hoje somam US$ 375,584 bilhões.
O cenário, hoje, segundo os economistas, é diferente e apesar do câmbio estar sobrevalorizado, os fundamentos ainda fracos limitam uma apreciação mais forte da moeda brasileira. O crescimento da economia mundial segue fraco, o que impede uma valorização maior das commodities, que teria efeito positivo para os termos de troca no Brasil. Além disso, apesar da melhora das expectativas com a mudança de governo, os fundamentos macroeconômicos seguem frágeis, com inflação e dívida pública elevadas e recessão econômica.
Para Alberto Ramos, diretor do grupo de pesquisas econômicas para América Latina do Goldman Sachs, o câmbio hoje está acima da taxa de equilíbrio, que segundo ele, está entre R$ 3,65 e R$ 4, dependendo do modelo usado para o cálculo. “É preciso que o câmbio se mantenha competitivo para cimentar o ajuste da conta corrente e contribuir para a recuperação das exportações.”
Para Ramos, o BC está correto em reduzir o estoque de contratos de swap cambial tradicional, que somava US$ 70,653 bilhões em 28 de abril. No entanto, ele afirma que, assim que liquidar esse saldo, a autoridade não deveria intervir para limitar a apreciação do real. “A medida mais adequada seria melhorar a competitividade da economia promovendo reformas estruturais e o ajuste fiscal”, diz.
A desvalorização de 32,9% do real em 2015 contribuiu para a queda do déficit em conta corrente que passou de 4,17% em dezembro de 2014 para 2,39% em março de 2016, no acumulado em 12 meses. A maior parte desse veio da queda das importações, reflexo da desaceleração da atividade.
Com a economia fraca e a inflação alta, alcançando 9,39% no acumulado de 12 meses até março, Ramos defende que a taxa de câmbio deveria ficar acima da taxa de equilíbrio para tornar a economia brasileira mais competitiva.
Estudo realizado pelo Centro de Estudos em Macroeconomia Aplicada (Cemap) da FGV em São Paulo mostrou que a taxa de câmbio real encerrou o ano passado 15% abaixo da taxa de câmbio real de equilíbrio. “Parte dessa sobredesvalorização já foi revertida e a taxa de câmbio real hoje deve estar bem próxima do equilíbrio”, diz Emerson Fernandes Marçal, do Cemap.
De acordo com dados do Banco de Compensações Internacionais (BIS), a taxa de câmbio real média efetiva acumulou apreciação de 9,08% no primeiro trimestre. Em termos nominais, a valorização do real ante o dólar foi de 10,32%.
Embora intensificada pela mudança no cenário político no Brasil, parte dos ganhos recentes do real foi influenciada pelo cenário externo. Houve recuperação das commodities e sinalização de um aumento mais gradual dos juros nos Estados Unidos, que levaram a uma valorização das moedas emergentes em relação ao dólar. “Para continuar esse movimento de apreciação dessas divisas, os preços de commodities teriam de subir mais, mas prevemos que eles devem se manter baixos por longo período”, diz Ramos.
O economista-chefe da SulAmérica Investimentos, Newton Rosa, não vê a tendência de apreciação das moedas emergentes se estender por muito tempo. “A China vai continuar desacelerando e sendo um risco para essas divisas.”
Por isso, segundo Rosa, o câmbio no Brasil tende a voltar a se depreciar e ficar mais perto da taxa de câmbio “justa”, que levando em conta os fundamentos da economia brasileira, estaria em torno de R$ 3,80. “O que levou à apreciação recente do câmbio não foi fundamento, mas a expectativa com a mudança de governo”, diz.
O sócio da Tendências Nathan Blanche destaca que a valorização do real acompanhou a queda do prêmio de risco do Brasil medido pelo contrato de Credit Default Swap (CDS), uma espécie se seguro contra calote e que mede a chance de default da dívida soberana, que caiu de 515 pontos-base no início do ano para 334 pontos-base. Para ele, a taxa de câmbio, levando em conta os fundamentos, deveria ser mais alta, em torno de R$ 3,75.
De acordo com o Itaú Unibanco, mesmo com a aprovação de reformas que melhorem a dívida pública, o câmbio poderia encerrar o ano entre R$ 3,70 e R$ 3,85. A projeção oficial do banco é de R$ 4 para 2016. “Com um câmbio mais baixo, a queda do déficit em conta corrente vai ser menor, mas isso não deve comprometer o ajuste”, diz Julia Gottlieb, economista do Itaú Unibanco.
Fonte: Valor Econômico