Ao confirmar Ilan Goldfajn para a presidência do Banco Central, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse que a instituição passará a ter autonomia técnica decisória e que o atual presidente da autoridade monetária, Alexandre Tombini, continuará integrando a alta cúpula da administração federal em outra posição. Meirelles, contudo, esclareceu que mandatos fixos para o presidente e diretores da instituição não serão propostos agora, pois isso depende de um arranjo político mais abrangente.
“Nossa proposta é de autonomia técnica de decisão e já um avanço enorme ao que hoje é um acordo verbal. Nos oito anos que passei no BC era um acordo meramente verbal e funcionou muito bem porque foi cumprido”.
Meirelles explicou que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que vai dar prerrogativa de foro para o presidente do BC – que perde o status de ministro – e para a diretoria da instituição também trará artigo propondo a autonomia técnica para o BC.
“Isso é muito importante, pois mantém aquilo que prevalece do ponto de vista prático. Isto é, autonomia de decisão”, disse. Segundo o ministro, essa é uma decisão “já amadurecida”.
Segundo Meirelles, esse é um ganho “enorme”, pois haverá uma formalização constitucional de algo que era antes apenas um “acordo verbal”.
Antes de assumir o BC, Ilan será sabatinado pela Comissão de Assuntos Econômicos no Senado (CAE), que atualmente é presidida pela senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). Segundo Meirelles, enquanto os trâmites legais não forem cumpridos, Tombini segue como presidente do BC.
Meirelles disse, ainda, que Tombini continuará integrando a administração federal, mas terá outra missão. “Não temos ainda como anunciar qual é a posição em função de situação institucional diversa. Mas continuaremos com o concurso do Tombini, não mais no BC”.
O ministro da Fazenda disse também que conversará com Ilan sobre possíveis substituições nas diretorias no BC “se for o caso”.
Enquanto Meirelles dava sua entrevista, o presidente Tombini divulgou nota à imprensa apontando que Ilan Goldfajn “é profissional reconhecido, com larga experiência no setor financeiro brasileiro, ampla visão da economia nacional e internacional, além de já ter passagem pela diretoria colegiada dessa instituição. Suas qualidades e sua formação o credenciam a uma bem sucedida gestão frente à autoridade monetária brasileira”.
A proposta de garantir autonomia técnica para o BC é um bom meio termo para um governo de transição, avalia Cristiano Oliveira, economista-chefe do Banco Fibra. “Acho que, neste momento, discutir autonomia formal do Banco Central poderia ser mais complicado, pois não houve ampla discussão com a sociedade, mas acho necessário ter um arcabouço mais sólido”, afirmou o economista. Ele lembra que, nos governos de Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula da Silva, o BC teve autonomia operacional, ainda que por acordo verbal, mas que essa “independência” foi perdida na gestão da presidente afastada Dilma Rousseff.
Para Oliveira, a PEC garantirá situação melhor do que o arranjo informal de autonomia de decisão para o BC. “Na prática, acredito que funcionaria bem. Acho que dificilmente o Ilan aceitaria o posto se não houvesse essa garantia”, afirma.
O “ideal” seria a independência formal do BC, mas é positiva a proposta de “autonomia técnica” porque confia que Meirelles manterá sua postura contra ingerências sobre o BC, diz o economista-chefe do Santander Brasil, Maurício Molan. Para ele, ainda está muito viva no mercado a memória de Meirelles defendendo a autonomia do BC para tomar suas decisões de política monetária.
“À frente do BC, Meirelles valorizou a não interferência. O BC pode ter agora formalizada a autonomia ´de facto´. O ideal é a autonomia de direito, mas que exige uma discussão mais profunda e mudança na lei”, diz Molan.
Para o economista-chefe para mercados emergentes da Capital Economics, Neil Shearing, o projeto que garante a autonomia do BC, embora não signifique a independência da autoridade monetária, é um passo “importante” e uma “rápida vitória” para o governo. “Isso deve ajudar a ancorar as expectativas de inflação de longo prazo”, afirma.
Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos, diz esperar a autonomia de fato. “Entendo que diante de tantas outras prioridades, o governo não queira gastar capital político com essa questão”. “O fato é que sem arrumar a macroeconomia, a crise política também se prolonga”, diz.
Fonte: Valor Econômico