A REFORMA RETIRA A OBRIGATORIEDADE DA PRESENÇA DOS SINDICATOS EM DISCUSSÕES SOBRE DEMISSÕES COLETIVAS E RESCISÕES CONTRATUAIS. A DICA É QUE TRABALHADORES SE INFORMEM SOBRE OS PRÓPRIOS DIREITOS E PROCUREM ESSAS ASSOCIAÇÕES OU PESSOAS DE CONFIANÇA ANTES DE CONVERSAS COM O PATRÃO
Uma mudança da Reforma trabalhista bastante comemorada foi o fato de a contribuição sindical deixar de ser obrigatória. A nova norma também traz alterações que impactam desligamentos de trabalho e a participação dessas entidades, que não precisarão estar mais presentes durante discussões sobre demissões coletivas ou rescisão de contratos. ‘Os sindicatos existem para proteger o empregado e há várias medidas na nova legislação que enfraquecem essas associações’, afirma Alessandro Costa, professor de direito na UCB.
‘Sem a presença dos sindicatos nas conversas sobre demissão em massa, existe o risco de excessos serem cometidos por parte do patrão, que pode inclusive decidir pela diminuição de salários. O empregador pode dizer: ou aceitam um vencimento menor ou mando todo mundo embora. O lado fraco sai mais prejudicado’, opina. O advogado Gilberto Bento Júnior concorda com esse risco, mas tem uma visão cética.
‘É possível acontecer, mas duvido. O custo da recontratação é muito alto. Não vale a pena deixar de produzir seu produto por causa de uma diferença de 10% ou 20% no salário da equipe’, diz. ‘Já se a empresa está cogitando demissão coletiva porque está em crise e não está se aguentando, mesmo que haja redução salarial, é provável que mande todo mundo embora daqui a pouco. Então, o bom funcionário deve se mandar rapidamente’, afirma. O advogado trabalhista Fernando Damiani defende que a nova legislação inclui na CLT vários itens que consolidam os sindicatos.
‘Há acordos e convenções coletivas que fazem necessária a participação dessas associações para tratar, por exemplo, do intervalo e da jornada de trabalho (12 horas por 36 horas) e isso vai fortalecê-los’, comenta. ‘É preciso que o sindicato se volte para os associados, assim todos ganham. O problema é que, hoje, eles estão mais focados no lado político, o que não é certo. Sem a contribuição sindical obrigatória, o sindicado terá de se esforçar para trazer o empregado para o lado dele e, para isso, terá de oferecer mais coisas boas’, completa.
Damiani também vê com bons olhos a rescisão contratual sem a presença dos sindicatos – pelo menos para os patrões. ‘O lado do empregador fica mais rápido, não se perde tempo tendo que ir ao sindicato’, diz. ‘Já o empregado precisa ter cuidado. Não se recomenda que ele vá desacompanhado porque tem de ver se tudo na rescisão é correto. Procure alguém de confiança para ajudar, do sindicato ou não’, indica.
O juiz do Trabalho Paulo Henrique Blair de Oliveira também crê que as associações de trabalhadores possam se fortalecer após a reforma. ‘O intuito era quebrar os sindicatos porque eles dependem da contribuição, mas eu acredito que, em longo prazo, sendo esperançoso, pode acontecer o que ocorre nos Estados Unidos, que são sindicatos mais fortes porque eles têm que se unir e se agregar’, esclarece.
A lógica da reforma é que, quando o trabalho fica mais barato, há mais contratação, mas essa ideia está completamente errada%u201D Paulo Henrique Blair de Oliveira, juiz do Trabalho
Balanço da reestruturação
De forma geral, o advogado Fernando Damiani, formado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e com mais de 35 anos de experiência, observa que a Reforma trabalhista assusta, mas isso não quer dizer que ela não seja boa para ambas as partes. ‘Não houve supressão de direitos. Claro que existirão algumas injustiças até que tudo fique mais ajustado, mas, aos poucos, as pessoas verão os aspectos positivos’, diz. Já o professor Alessandro Costa, formado em direito pela Universidade Paulista, afirma que a nova legislação favorece muito mais o empresariado do que o trabalhador. ‘É uma reforma dos patrões para os patrões. Infelizmente, ela está aprovada, mas é um retrocesso aos direitos dos trabalhadores que foram conquistados com tanta luta. Ao meu juízo, ela passou goela abaixo, não houve discussão com a sociedade’, critica.
Paulo Henrique Blair de Oliveira alega que a reforma não servirá para o propósito inicialmente pretendido. ‘A lógica da reforma é que, quando o trabalho fica mais barato, há mais contratação, mas essa ideia está completamente errada: se o empresário tem mais dinheiro no caixa, primeiro vai querer melhorar a vida dele’, aponta. Gilberto Bento Júnior avalia que a Reforma trabalhista não trouxe muitas alterações significativas, mesmo assim, crê que ela surtirá efeito na geração de vagas. ‘Ela não vai criar mais emprego por trazer grande economia, mas por proporcionar algumas pequenas economias. Esse sentimento de proteção ao empregador pode estimulá-lo a contratar mais. Afinal, a CLT era uma regra de quase um século atrás, criada quando funcionários precisavam de amparo; hoje, qualquer um tem noção de seus direitos’, pondera. (TM e APL)
Eu acho
‘Trabalho com carteira assinada há pouco tempo. Esse novo tipo de demissão por acordo, na minha opinião, ficou bom e equilibrado. Entendo que o fato de o trabalhador poder sacar até 80% do
FGTS, mas perder o seguro-desemprego pode desafogar a máquina pública, mas não sou 100% a favor. No cenário em que estamos, muita gente vai agradecer; outros, nem tanto. Contudo, não dá pra agradar a todos. Existe temor em torno do assunto. O medo não está em ser demitido, está em ficar sem emprego. Com as antigas ou as novas normas, ficar desempregado é um pesadelo. A opinião geral aqui no meu trabalho é que muitas das mudanças da reforma foram boas, pois tornaram algumas coisas que eram feitas por baixo dos panos legais. Eu destaco a retirada do imposto sindical como algo válido para não ser obrigado a contribuir com um grupo que pouco se manifesta ou pouco se vê em ação.’
Tharlles Caspitana Santos, 21 anos, técnico em informática
na empresa Cast Group há dois anos
‘A maior parte dos pontos da reforma foram ruins. Acredito que foi um retrocesso porque prejudicou alguns direitos. Apesar de o governo dizer que ela veio para melhorar a questão do desemprego, acho que só vai piorar, pois a norma só favorece o patrão. Acredito que, com a reforma, a gente vai trabalhar mais e ganhar menos. No caso do acordo para demissão, ele vai favorecer o empregado, porque mesmo quem for demitido por justa causa, se entrar em consenso, poderá sacar até 80% do FGTS (e, antes da reforma, saía sem nada). Em outras situações, a parte mais fraca sai perdendo porque, numa conversa com o empregador, ele tem mais poder. De certa forma, é bom não ter mais que pagar contribuição sindical obrigatória, mas isso vai enfraquecer os sindicatos e eles estão a nosso favor.’
Andreia Gonçalves Ribeiro, 33 anos, graduada em letras – português, terceirizada no setor de recursos humanos do Ministério dos Transportes há oito anos, tem carteira assinada pelo mesmo período
Palavra de especialista
Quem será afetado pela reforma?
É importante lembrar que quem trabalha de carteira assinada não será afetado pela nova legislação trabalhista: a pessoa pode continuar na mesma empresa por 10 ou 50 anos que sairá sem nenhuma mudança, seguindo os parâmetros antigos. A reforma só valerá para contratos firmados a partir do momento em que ela entrar em vigor. Por causa disso, é provável que muita gente passe a ter medo de deixar o emprego. Isso ocorre porque o ser humano teme a mudança. O que posso dizer é que o profissional pode ficar tranquilo: com a reforma, ele não estará perdendo praticamente nada.
Gilberto Bento Júnior, advogado trabalhista e sócio da Bento Jr. Advogados
Desaprovação
Não adianta chorar pelo leite derramado, mas pesquisa feita pela Companhia Ipsos Public Affairs revelou que a maior parte dos brasileiros era contra a Reforma trabalhista.
O levantamento foi feito com 1.200 pessoas de 72 municípios entre 1º e 12 de abril.
Confira os resultados completos:
58% Contra
19% Não sabe
16% Nem a favor/ nem contra
7% A favor
Antes x Depois
Principais mudanças que podem afetar os casos de demissão:
Como era
» Não se pode fazer acordos. Se o trabalhador se demitir ou for demitido por justa causa, não tem direito a sacar FGTS, nem seguro-desemprego nem multa. Se for demitido sem justa causa, recebe multa de 40% sobre os depósitos do FGTS, pode sacar o fundo e tem direito a seguro-desemprego.
» O trabalho intermitente não era regulamentado
» Em casos de demissão em massa, era necessário o envolvimento dos sindicatos
Como ficou
» As regras anteriores continuam valendo, mas empregador e empregado podem chegar a acordo para demissão. Nesse caso, o trabalhador recebe multa de 20% sobre o valor do FGTS, pode movimentar até 80% do fundo e não tem direito a seguro-desemprego.
» O trabalho intermitente é regulamentado, que é o contrato de trabalho em que a prestação de serviços não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em dias ou meses.
» As discussões para demissões em massa passam a não exigir a presença do sindicato.
Fonte: Correio Braziliense