EXPECTATIVA DO MERCADO É QUE TAXA BÁSICA DE JUROS SEJA REAJUSTADA HOJE PARA 9,25%; ECONOMISTAS VEEM EXCESSO DE CONSERVADORISMO DO BC
Autor: Douglas Gavras / SÃO PAULO e Fernando Nakagawa / BRASÍLIA
A promessa de condução responsável da política econômica e a meta de inflação menor nos próximos anos são os argumentos da equipe econômica para defender que a queda do juro básico para o patamar de um dígito na reunião de hoje do Comitê de Política Monetária (Copom) será “diferente” da que foi vista nos governos Lula e Dilma. Na ocasião, após cair para um dígito, a Selic subiu logo em seguida.
A expectativa do mercado é que a Selic seja reajustada dos atuais 10,25% 30 ano Para 9,25%. A taxa ficou em um dígito em apenas duas ocasiões desde a adoção do regime de metas para a inflação, em 1999. Primeiro, no governo Lula, quando operou quase um ano abaixo de 10%, até junho de 2010. O segundo momento aconteceu por um ano e meio até o fim de 2013, quando o Brasil experimentou o menor juro recente: 7,25% no governo Dilma. Nos dois casos, a volta da inflação levou a uma correção de rota.
Agora, a equipe econômica argumenta que o quadro poderá ser diferente. Primeiro, porque o regime de metas de inflação foi ajustado com a adoção de referências mais rígidas. Até 2018, a meta será de 4,5%. Depois, passará a 4,25% em 2019.
Outro fator que dá respaldo aojuro baixo é a própria política econômica. Com a chegada de Michel Temer, alguns procedimentos do governo que influenciam a inflação foram alterados. A política de preços dos combustíveis, por exemplo, foi radicalmente trocada e os valores passaram a reagir rapidamente à oscilação do mercado. Isso diminui o risco de manobras, como a contenção de preços no governo Dilma.
“A situação atual é completamente diferente da última vez em que os Juros ficaram em um dígito. No governo Dilma, o ciclo de expansão estava no limite, a hora era de baixar Juros e se insistiu no sentido contrário. Agora o que se discute é que o Banco Central foi lento demais, poderiamos estar com Jurosna casa dos 7% ao ano. O excesso de prudência postergou a recuperação econômica”, diz Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-presidente do BNDES.
Mônica de Bolle, pesquisadora do Instituto Peterson de Economia, em Washington, concorda que o Banco Central perdeu janelas importantes logo que a nova equipe assumiu, para reduzir os Juros. “Tendo em vista o tamanho da recessão, foram excessivamente conservadores, quando se olha a taxa de Juros real, demorou demais para cair, o BC estava sendo mais conservador do que precisava.”
“O País tem quase 14 milhões de desempregados, há enorme capacidade ociosa na indústria. Estamos quase em uma depressão e surpreende os Juros ainda estarem nesse patamar”, diz José Luiz Oreiro, da Universidade de Brasília (UnB).
Em Brasília, o juro de um dígito é recebido com especial comemoração diante da crise que ameaça Michel Temer. Mas o cada vez mais difícil andamento das reformas é tido como ameaça e o BC reconhece a incerteza como ‘Tator de risco principal para a trajetória da inflação”.
Uma estimativa do site Mone You e da Infinity Asset Management aponta que, com os Juros básicos em 9,25% ao ano, os Juros reais no País ficariam em 3,71%, em 12 meses. Economistas ouvidos pelo Estado são mais pessimistas e preveem Juros reais ainda acima de 4%.
A diferença só vai cair quando as reformas estruturais forem feitas, diz de Bolle. “Sem mexer em tributação e na questão fiscal, nada feito. O teto dos gastos não basta, teria de ter havido a Reforma da Previdência.”
ANÁLISE: Sergio Vale
Juro baixo depende da manutenção da agenda econômica
Devolta aos Juros de um dígito, a questão que fica é se dessa vez será sustentável manter a taxa baixa nos próximos anos. Diferentemente da última vez que a Selic baixou forçadamente de 10%, dessa vez há razões para se acreditar que a Selic possa ficar por mais tempo em níveis baixos.
A maior razão de todas é que há uma agenda de política econômica integralmente voltada para permitir que isso aconteça. Há uma combinação que há muito não se via entre políticas monetária e fiscal em busca dessa consolidação. Com todas as dificuldades da caminhada, a conjunção de um esforço fiscal atrelado a uma nova sistemática para a TJLP ajudam a assegurar que os Juros poderão ficar mais baixos, sem comprometer a inflação. Mais ainda, ao iniciar o processo de baixar a meta, o governo também sinaliza com a possibilidade de taxas nominal e real mais baixas.
O trabalho não será fácil, pois há uma eleição no meio do caminho em que facilidades serão vendidas à população em troca do voto. E a equipe econômica será constantemente bombardeada. Tanto a Reforma da Previdência quanto a mudança na TJLP são exemplos que afrontam o velho patrimonialismo e, portanto, serão vitórias históricas quando aprovadas.
Passada a turbulência, a conquista de uma Selic mais baixa está integralmente atrelada à vitória de alguém comprometido com a agenda de reformas. São poucos os candidatos dispostos a comprar essa briga, mas infelizmente em economia não há mágica. Qualquer tentativa de desvirtuar o pouco que já foi aprovado, levará o País devolta ao cadafalso.
ECONOMISTA-CHEFE DA MB ASSOCIADOS
Com queda de juro, renda fixa diminui atratividade
Jessica Alves
Com uma possível queda na taxa de Juros de 1 ponto porcentual, os investimentos que dão retornos próximos ao juro básico vão perdendo a atratividade. Porém, mesmo diante de um cenário bem diferente do ano passado, quando a Selic estava em 14,25%, especialistas ainda recomendam cautela na hora de buscar opções que chegam perto dessa rentabilidade.
“Não tem milagre. O investidor gosta de pensar em retorno de 1% ao mês sem risco, mas era uma situação pontual”, conta Arnaldo Curvello, diretor da Ativa Wealth Management. Ele pondera que o caso Joesley Batista mostra que a volatilidade sempre existe e, com as eleições de 2018 se aproximando, a incerteza tende a aumentar.
Diante de um cenário que obriga o investidor a sair da zona de conforto, mas “sem se jogar de cabeça”, Curvello indica ativos ligados ao crédito de empresas, como CRAs, e fimdos que contenham esses títulos – por exempio, CDBs, LCIs e LCAs. Ele explica que, com a taxa de Juros em queda, o risco de crédito, ou seja, de um calote das empresas, também diminui, deixando essas opções mais vantajosas.
Rodrigo Puga, sócio da corretora Modalmais, aconselha o investidor a experimentar aplicações com mais risco por meio dos fundos multimercado, aplicação que mistura em um mesmo pacote renda fixa, ações ou moedas. Ele orienta o investidor a optar por fundos que apresentam rentabilidade constante em vez de olhar só para o retomo final.
Poupança. A queda da taxa de Juros básica deixa a renda fixa tão desprestigiada que até mesmo a Poupança, opção mais conservadora e conhecida do brasileiro, ganha na rentabilidade se comparada a fundos de renda fixa com mais de 1% de taxa de administração. Segundo levantamento da Anefac, isso se agrava porque, ao contrário da caderneta, que não sofre qualquer tributação, os fundos têm incidência de Imposto de Renda. Para conseguir ganhos melhores, o investidor do fundo tem de abrir mão da liquidez e não economizar tempo para pesquisar taxas menores.
Se o investidor aplicar R$ 10 mil por 12 meses na Poupança, por exemplo, terá acumulado R$ 10.680. Em um fundo de renda fixa com taxa de administração de 1,50%, o mesmo valor renderia R$ 10.629.
Fonte: O Estado de S. Paulo