Para analistas, governo deveria rever aumentos já autorizados

    MEDIDAS ANUNCIADAS SÃO INSUFICIENTES PARA AJUSTAR GASTOS COM PESSOAL

    Autor: GERALDA DOCA geralda@bsb.oglobo.com.br

    -BRASÍLIA- As medidas anunciadas pelo governo para reduzir o peso da folha de salários dos servidores federais estão na direção correta, mas são insuficientes para ajustar os gastos com pessoal, avaliam especialistas em contas públicas. Eles afirmam que elas deveriam fazer parte de um pacote maior, diante do quadro fiscal agudo, que abrangeria reavaliação dos reajustes programados dos funcionários, redução das contratações e revisão das carreiras para permitir salários menores no ingresso.

    Para reduzir despesas e enxugar o quadro de pessoal, o governo trabalha em três frentes: vai abrir um Programa de Demissão Voluntária (PDV), reduzir jornada de trabalho e salário e incentivar licenças não remuneradas. A expectativa é obter adesão de pelo menos cinco mil servidores e fazer uma economia anual de R$ 1 bilhão.

    Segundo o professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Nelson Marconi, as medidas propostas pelo governo são de gestão e têm pouco efeito do ponto de vista fiscal. Não cobrem nem de longe o gasto que o governo terá com os reajustes dos servidores, acordados entre 2015 e 2019 — um impacto total de R$ 22 bilhões.

    —Não é com o PDV e com a redução de jornada que o governo vai reduzir o impacto dos reajustes na folha — destacou o professor.

    Ele acrescentou que, tecnicamente, a equipe econômica deveria suspender o reajuste salarial prometido às categorias. Mas reconheceu que, politicamente, isso seria complicado, pois precisaria da aprovação do Congresso.

    Os reajustes programados foram acordados com os sindicatos das categorias no governo anterior, quando a projeção da inflação ainda estava elevada. Os percentuais constam de leis aprovadas pelo Congresso.

    Claudio Hamilton, coordenador de Finanças Públicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), destacou que os acordos foram fechados em bases rígidas e negociados com condições generosas, sem a preocupação com queda de receitas no futuro. Ele sugere que o governo proponha uma negociação com os sindicatos para espaçar os aumentos.

    — Por motivo de força maior, esses aumentos deveriam ser revistos — observou.

    DESPESA AUMENTOU 11%

    Hamilton destacou que a despesa com a folha subiu 11% em termos reais entre janeiro e maio deste ano, na comparação com o mesmo período do ano passado. Para ele, um dos motivos foi o aumento salarial. Ele também chamou a atenção para o fato de o atual governo continuar contratando: em 2016, foram feitas 15.728 contratações:

    — O que destoa é que o governo continua contratando e dando aumentos por conta de decisões do passado.

    Para o especialistas em contas públicas Raul Velloso, o PDV deveria ser o rodapé de um pacote de medidas de ajuste. Segundo ele, a expectativa do governo em obter cinco mil adesões ao PDV e uma economia de R$ 1 bilhão por ano pode ser frustrada, porque a medida vem num momento ruim, de recessão e alta do desemprego.

    — As pessoas vão pensar várias vezes se vale a pena perder direitos como estabilidade e aposentadoria em troca de uma indenização. Elas não sabem quanto tempo o dinheiro vai durar no bolso e quando vão conseguir um novo emprego.

    Já a redução da jornada tem potencial para atrair maior número de servidores, porque, neste caso, não haverá perda de direitos, explicou Velloso. Ele afirmou que muita gente tem interesse em trabalhar meio expediente e aproveitar o tempo livre para estudar e arrumar um emprego alternativo. Além disso, quem aderir terá um ganho adicional de meia hora diária. A medida é a principal aposta do governo, que diz não ter projeção de economia por se tratar de uma proposta inédita.

    Segundo José Roberto Afonso, professor do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e pesquisador do Ibre/ FGV, o teto de gastos exige que o governo corte gastos antes considerados “intocáveis”:

    — É a primeira vez que ao menos se tenta alguma redução significativa do gasto com pessoal da União. Isso é inédito e elogiável.

    Fonte: O GLOBO

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