Autor: Ribamar Oliveira e Sergio Lamucci
O aumento das projeções para o Déficit primário dos próximos anos levou a uma piora na dinâmica esperada para a dívida pública brasileira, tanto por parte do governo como por analistas do setor privado. A equipe econômica, porém, continua a prever uma trajetória mais favorável, ainda que tenha passado a estimar números mais elevados. Para 2020, por exemplo, a nova projeção oficial para a Dívida bruta subiu de 77,7% para 81,1% do PIB, enquanto a previsão do Santander pulou de 84% para 92% do PIB. Um dos principais termômetros de solvência do setor público, o indicador fechou junho em 73,1% do PIB.
Nas contas do governo, a Dívida bruta crescerá nos próximos três anos em relação ao PIB, de acordo com o projeto enviado ontem pelo Executivo ao Congresso. Na projeção anterior, ela começava a cair a partir de 2020.
Segundo o projeto de mudança da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que deverá passar pelo crivo dos parlamentares, a dívida pública bruta chegará em 2018 a 78,7% do PIB, ante 76,9% da previsão anterior. Em 2019, o número aumentou de 77,9% para 80,6% do PIB. Já para este ano, a estimativa é de que a Dívida bruta alcance 75,7% do PIB, com um crescimento da economia de 0,5% e inflação de 3,7%. Agora, o governo projeta uma expansão do PIB de 2,5% em 2019 e de 2,6% em 2020. A estimativa para 2018, por sua vez, caiu de 2,5% para 2%.
O ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, disse que o aumento da projeção para a Dívida bruta é um sinal da “situação grave em que se encontram as contas públicas”. Segundo ele, o problema revela a necessidade das reformas, em particular a da Previdência. “É preciso enfrentar a principal despesa do governo, a da Previdência.” Sem isso, disse Dyogo, o país não vai estabilizar as contas públicas.
As estimativas da economista Tatiana Pinheiro, do Santander, indicam uma trajetória de alta mais acentuada para a Dívida bruta. Ela manteve a projeção para 2017 foi em 77,2% do PIB, elevando a de 2018 de 81,9% para 84% do PIB e a de 2019, de 83,4% para 88,9% do PIB.
Anunciadas na terça-feira, as novas metas fiscais representam uma deterioração de R$ 200 bilhões, ou 2,6% do PIB, para o Déficit primário (que exclui gastos com Juros) do governo central entre 2017 e 2020, destacou Tatiana. “Essas mudanças nas metas para o resultado primário são más notícias para a dinâmica da dívida”, resumiu a economista. O nível dos Juros e o crescimento do PIB são as outras variáveis fundamentais para definir a trajetória do endividamento público.
O Santander adotou como projeções para o Déficit primário até 2020 as novas estimativas do governo para o setor público consolidado, que inclui, além da União, Estados, municípios e estatais, com exceção da Petrobras e da Eletrobras. Para 2017, o número continuou em 2,5% do PIB, a previsão com que Tatiana já trabalhava. No caso do período de 2018 a 2020, o buraco esperado aumentou, com o anúncio das novas metas pelo governo. Para o ano que vem, o Déficit primário subiu de 1,8% para 2,3% do PIB; para 2019, pulou de 0,5% para 1,8% do PIB; e, para 2020, passou de um superávit de 0,9% para um Déficit de 0,6% do PIB.
Essas mudanças produzem um efeito bastante negativo sobre a dinâmica da dívida, que já não era favorável. Para lembrar, o endividamento bruto equivalia a 51,5% do PIB no fim de 2013. Em três anos e meio, já subiu mais de 21 pontos percentuais do PIB.
Nas contas do Santander, o resultado primário será zerado em 2021, e o setor público terá um número positivo, de 0,5% do PIB, apenas em 2022. Os superávits a partir daí vão ocorrer por causa do crescimento – de cerca de 3% de 2020 em diante – e da implementação de reformas fiscais, segundo Tatiana. Nesse cenário, o resultado primário deve ser positivo em 1,5% do PIB em 2023 e atingir 2% do PIB em 2024 e 2025. Nos cálculos da economista, o superávit necessário para estabilizar o endividamento está na casa de 2% a 3% do PIB.
A Dívida bruta, por sua vez, continua a subir até 2023, batendo em 96,3% do PIB, e cai lentamente a partir do ano seguinte – fica em 96,2% do PIB em 2024 e em 96,1% do PIB em 2025, estima Tatiana. São números muito acima da média dos países emergentes. Para o Fundo Monetário Internacional (FMI), a média do endividamento bruto desse grupo de economias deve ficar em 48,6% do PIB neste ano. “De acordo com nossos modelos, o efeito da Selic na casa de um dígito será suplantado pelo impacto de um Déficit primário em média de 1,8% do PIB nos próximos anos”, disse Tatiana. A projeção do Santander para a Selic no fim deste ano, de 8,5%, está em processo de revisão. Hoje, a taxa está em 9,25% ao ano, e as previsões dos analistas ouvidos pelo Banco Central (BC) apontam para uma Selic de 7,5% no fim de 2017. No projeto enviado ao Congresso, o governo indicou que espera que a Selic chegue a 8% ao fim de 2018 e 2019, mas suba para 8,3% no fim de 2020. A projeção anterior era de Selic em 9% para o fim de todos esses anos.
No caso da Dívida líquida, que desconta ativos do país como as reservas internacionais, o Santander divulgou projeções até 2020, e o resultado tampouco é animador. Para o banco, o endividamento líquido, que fechou o ano em 44,9% do PIB, vai bater em 66% do PIB em 2020 – antes, a projeção era de 61% do PIB.
“Essa trajetória ascendente para a relação entre a Dívida bruta e a Dívida líquida e o PIB aumenta as chances de uma revisão do risco de crédito soberano”, disse Tatiana, avaliando que pode haver um novo rebaixamento do rating do país pelas agências de classificação de risco. “Nós consideramos a implementação de reformas estruturais a única solução”, afirmou Tatiana. “Em nossa opinião, os mercados esperam que o debate no Congresso sobre medidas estruturais recomece a partir de setembro. Se esse calendário de eventos não ocorrer, nós poderemos ver um prêmio de risco maior sendo incorporado aos preços de ativos novamente.”
O projeto do governo traz ainda estimativas para o Câmbio e para a receita primária nos próximos anos. Para o dólar, a previsão de R$ 3,40 por dólar em 2018, R$ 3,50 em 2019 e R$ 3,50 em 2020, sempre para o fim de cada um dos anos. Já a estimativa do governo para receita primária se mantém constante em 20,14% do PIBem 2018, 2019 e 2020. Em 2017, atingirá 20,8% do PIB. (Colaborou Cristiane Bonfanti, de Brasília)
Fonte: VALOR ECONÔMICO