HÁ SIM PESSOAS INSUBSTITUÍVEIS

    Durante boa parte de minha vida eu ouvi alguns dizerem que não há pessoas insubstituíveis, enquanto outros defendiam que elas existem sim. Cheguei a acreditar mesmo que ninguém seria insubstituível, hoje já não creio nisso e tenho fortes motivos para ter mudado de opinião. Nos trinta anos que trabalhei no Banco do Brasil era muito comum dizerem que fulano ou beltrano eram ótimos funcionários, ou ótimos chefes, porém não eram insubstituíveis. Muita gente acreditava nisso convictamente e eu também achava que a assertiva tinha sua razão de ser. Afinal por melhor que este ou aquele colega desempenhasse muito bem a função que lhe era atribuída um dia ele mudaria de cargo e outro logo viria para o seu lugar. Era uma rotina inevitável. Vi isso acontecer diversas vezes e na maioria dos casos realmente os que assumiam não decepcionavam. Eu mesmo exerci diversas funções e mais pra frente, ainda no BB, diversos cargos, alguns de responsabilidade em Departamentos diferentes. Quando eu mudei de cargo ou função nem sempre pude depois saber como se saiu o meu substituto, mas em outros casos comprovei que eram elogiados. Isto não me diminuía, de forma alguma, quando muito fazia justiça aos substitutos, claro. A última vez que tal mudança se deu foi pouco antes de minha aposentadoria. Eu trabalhava no Gabinete da Presidência da PREVI, do BB, com o meu amigo professor Amaro como Presidente. Ao meu lado outro colega da antiga, o nosso bom Lula, o Luiz Carlos, que era o Chefe de Gabinete. No ano de 1986 eu decidi me aposentar e alguém iria ocupar meu cargo quando eu saísse lógico.  Fiquei sabendo muito tempo após que outro grande amigo da antiga ocupara a função que eu exercera até me aposentar. Foi o Orlando Barcelos, gente da melhor qualidade e meu amigo até hoje. Realmente eu não era nem pretendia ser insubstituível. Depois soube que ele se desincumbiu muito bem daquele cargo. Competência não lhe faltava, pelo contrário. Se mudarmos nosso foco para o campo da literatura, da música e/ou das artes em geral, acredito que aí se aplique a máxima de que alguém seja insubstituível. É claro que sempre haverá aquele ou aquela que, por seu imenso talento, por sua criatividade, pela trajetória que tiver deixado dificilmente um dia alguém poderia, ou poderá tomar o seu lugar, digamos assim, no cenário em que atuou. Ainda outro dia eu ouvi um comentarista dizer, num debate na rádio CBN, que existem sim pessoas que são insubstituíveis mesmo quando se vão dessa vida. Entre seus argumentos ele citou dois exemplos que acredito possam ser unanimidade em opinião. E não será uma “unanimidade burra”, (como diria o saudoso Nelson Rodrigues) com certeza que não. Ele se referia, em particular, a esses dois “monstros”, no melhor dos sentidos, falecidos recentemente: Chico Anísio e Millôr Fernandes.  O trabalho que Chico Anísio desenvolveu durante toda sua vida no humor ninguém antes o alcançara e jamais alguém chegará sequer , como se diz, ao seu calcanhar. Tivemos grandes humoristas no passado, é verdade, cada um dentro do seu estilo, todavia Chico Anísio teve o grande mérito de criar inúmeros personagens além de se preocupar sempre em abrir espaço para dar trabalho a colegas que eventualmente estavam sem emprego. Além de tudo o bom Chico fez escola.  Quando vejo o tal “humor” que hoje é tão apregoado e praticado especialmente em TVs como a Globo, pelo amor de Deus, dá mais vontade de chorar do que de rir. Só faço exceção a uns três da antiga que ainda permanecem ali se submetendo a script nem sempre à altura do talento deles, mas, que fazer? Trabalhar é preciso.  E há dois, ditos humoristas, que “inventaram” o programa “Os caras de pau”. O título diz bem o que penso deles, até porque já houve um filme (anos 80) com dois atores americanos que trabalharam numa série de dois ou três filmes de sucesso com o título “Os irmãos cara de pau”. Até o tipo dos dois atores principais os brasileiros resolveram imitar, e muito mal imitado. Que lástima. Quanto a Millôr Fernandes coloco aqui o que disse no velório dele seu irmão Hélio: “Millôr vai reabrir a discussão sobre duas palavras: genial e insubstituível". Ele estava certo. É o que penso também. Quantos pronunciamentos eu li e ouvi de pessoas que nos merecem o maior respeito afirmando ser ele mesmo insubstituível. Millôr só existiu um, jamais haverá alguma cópia fiel, jamais. Na nossa literatura e na MPB temos vários escritores, poetas, compositores, alguns emergidos de níveis sociais menos favorecidos que passaram por esta vida deixando sua marca indelével. E não são poucos. Serão sempre insubstituíveis. Para citar nomes e ser justo eu precisaria de muito mais que um texto desses. Já na política, por exemplo, creio ser muito difícil a gente encontrar alguém realmente insubstituível, no melhor sentido desta palavra. Tão difícil que algumas poucas linhas já pareceriam um infinito vazio de nomes ou um deserto de incertezas e corrupção. Mas a corrupção seria uma marca só dos políticos? Vejam o que disse certa vez o nosso grande Rui Barbosa: “No Brasil existem muitos eleitores corruptos exigindo políticos sérios e honestos”. Aqui vai carapuça para todos os tamanhos e gostos. Eleitores do Brasil, por favor, calma na hora de levantar e apontar o vosso dedinho para qualquer político, sim? Lembrem sempre do Rui Barbosa. E para encerrar permito-me lembrar outro brasileiro que também será sempre insubstituível na sua verve humorista e inigualável, o nosso querido Luis Fernando Veríssimo. Certo dia ele escreveu: “Brasil, esse estranho país de corruptos, sem corruptores.” Depois disto confesso que peço o meu chapéu e me recolho a minha insignificância ou “insignipartência”. Tchau.

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