Há coisas que realmente devem ser lembradas, de quando em vez, para que não as esqueçamos, embora jamais nos façam sentir saudade. Parece uma incoerência, mas não é não. Especialmente em se tratando da política e dos políticos brasileiros.Quando Sarney foi consagrado Presidente da República, em eleição indireta, após a morte de Tancredo Neves, a política econômica foi conduzida de tal forma que de repente passamos a travar um íntimo contato com o tal dragão inflacionário. O dragão tinha a forma de espiral. Foi nos engolindo, engolindo, até que o governo decidiu mudar a política econômica. Eu disse “mudar”?! Vá lá que seja.Mudou, trocando também o nome da moeda, e aí começou uma série de troca-troca que perdurou até alguns anos atrás. De nada adiantou, mas o povo sempre sentiu os efeitos mais duros, mais cruéis dessas transformações aloucadas. Jogavam o dólar para uma cotação bem baixa, tudo artificialmente fabricado, e tentavam nos iludir com um “fortalecimento” da moeda do dia. A inflação acabou por retornar, aliás de onde não partira, apenas se escondera nas habituais mentiras de fisionomias sérias e respeitáveis que assumem cargos para além de sua competência. E, ainda assim, numa manobra política, concederam um ano a mais de mandato a quem sequer fora eleito pelo povo. E a ditadura já ficara para trás.No clamor popular por mudanças, visto que a tal inflação já alcançava o astronômico patamar de 80%, surgiram os “messias politiqueiros”, da nova democracia, com pose e fórmulas mágicas que, conforme anunciavam aos berros, seriam a salvação da pátria. Lula e Collor foram até o último ato daquele melodrama tupiniquim. O mais experiente, não obrigatoriamente o melhor, acabou por engolir o principiante, valendo-se de recursos os mais abjetos e imposturas variadas. O nosso povo embarcou naquela canoa furada porque adora emoções fortes. Viu no tal “Caçador de Marajás”, carioca egresso do nordeste, a correção de rumo que o país necessitava para entrar nos trilhos. Mesmo acusado de que iria meter a mão na poupança popular (menos na dos amigos mais chegados, é óbvio…), nossa boa gente o entronou. Claro que sua esperança descarrilou logo no dia seguinte.Collor jurara que jamais faria o que acabou por fazer, sem nenhuma cerimônia, com a maior cara de pau, com hino nacional e tudo o mais, e D. Zélia, a dama de ferro (enferrujado, pois) do Brasil, a ditar regras e prometer o que não iria conseguir levar a efeito. Mas, e daí, por aqui não acontece nada mesmo com eles, não é verdade? A dupla Collor – Zélia trocou novamente a moeda e o cruzeiro voltou aos nossos bolsos. Esperem, eu disse aos nossos bolsos?? Perdão, voltou, mas para os cofres do Banco Central, já que o confisco fora amplo, irrestrito e geral (menos para uns poucos, repito…). Generosamente eles nos permitiram ficar com cinqüenta cruzeiros em nossas contas!! Quanta bondade, não?E eles saíram daquela reunião, com TV e tudo, totalmente impunes, sem algemas, mesmo adotando um método “bolchevista” num regime dito democrático!! Num país realmente sério não haveria a mínima hipótese de aquela tragédia popular acontecer, mas… Também, as forças que colocaram a escada para que eles alcançassem o poder tudo podiam, tudo faziam, e se deixarem, ainda fazem.O cruzeiro não durou muito e teve que ser rebatizado de cruzeiro novo, com novo plano econômico (ou mágico??!!) empurrado goela abaixo a um povo pasmo, indefeso, e já desrespeitado em seus direitos constitucionais quando do cataclísmico confisco. Mas, seguros de que possuíam a força, que eram intocáveis, indestrutíveis, acabaram por desafiar as mãos e cabeças que ajudaram a colocá-los no trono. Aí se deram mal, muito mal. Aliados aos emergentes “caras pintadas”, os mesmos que lhes haviam colocado a escada para alcançarem o poder acabaram por retirá-la. O tombo foi muito grande, mas ainda deu para se ouvir a arrogância pedindo socorro: “Não me deixem só!!” A partir dali, enquanto o povo ainda contabilizava seu prejuízo ante tantos planos mirabolantes e fracassados, das Minas Gerais vinha um novo discurso, uma nova postura, um novo governo: Itamar Franco.Seu Ministro da Fazenda e equipe criaram então o Plano Real e a moeda voltou a mudar de nome. Haja batizados no âmbito da economia! A lata de lixo da Casa da Moeda já não cabia mais de tanta sobra de moeda e dinheiro em papel sem valor. Barbaridade. E o dólar voltou a ser socado para baixo com um certo toque de artificialismo, como sempre. Só os economistas explicam, e sentem prazer nisso… Com o sucesso inicial do Plano Real um Ministro acabou por se tornar Presidente da República. FHC chegou lá. A esperança do povo novamente se renovou. E Lula amargava mais uma derrota no campeonato brasileiro para o Planalto. Ao se avizinhar o término do primeiro mandato de FHC percebia-se haver várias promessas de campanha que não tinham saído do papel, ou das boas intenções. Mas a economia mostrava equilíbrio e certa solidez, embora o desemprego aumentasse.Economistas, da direita à esquerda, afirmavam que FHC teria que desvalorizar o real. Ele, como soe acontecer, pois a impunidade os garante, asseverou tratar-se de campanha política do contra para evitar sua reeleição. Sorriu vitorioso pois sabia que o povo acreditaria nele. E acreditou mesmo. Lembram que umas 3 semanas após a reeleição de FHC o real foi realmente desvalorizado, e bastante, perante o dólar? Certamente alguns ganharam muito vendendo antes e recomprando depois… o dólar.Mas como para o povo até o real já é difícil de segurar, não pode se dar ao luxo dessas brincadeirinhas abençoadas pelo tal de mercado. E foram mais 4 anos de um segundo mandato muito pálido, meio inexpressivo, que deveria ter respeitado uma opinião pública que o reelegeu ainda no primeiro turno. Entretanto já dissera D. Zélia que… “o povo é apenas um detalhe”. Pelo visto ela externou o que outros camuflam. Mais recentemente, enfim, Lula deu a volta por cima, ou subiu a … serra. Os mais conservadores acharam que qualquer um esmagaria o “sapo barbudo”, expressão criada antes por Brizola. Erraram, não foi José? Lula chegou lá. Era a opção que restava ao povo e criaram coragem, deixando o preconceito de lado: votaram no PT.Bem, o pacote de promessas foi muito grande, só não sei se calcularam bem a duração do mandato, se consideraram antes todas as pedras do caminho, etc. O fato é que nesses primeiros tempos do governo da esperança tem-se somado acertos e erros. O mais importante, me parece, é não haver… omissão. A cara do poder mudou na imagem televisiva mas, há quem diga que, administrativamente falando, perduram muitas semelhanças com o governo passado. Se for para sedimentar o terreno e mais adiante plantar tudo, ou grande parte, das promessas eleitorais, tudo bem, pois seria muito frustrante que Lula e o PT nos presenteasse com mais uma dessas lembranças que não deixam saudades.
Inicial LEMBRANÇAS QUE NÃO DEIXAM SAUDADES