PERSPECTIVAS

     Depois da desenfreada explosão desses aparelhinhos portáteis que cabem na palma da mão, capazes de realizarem inúmeras funções, dentre elas, tirar fotos e até mesmo possuir a humildade de permitir a comunicação oral entre duas pessoas simultaneamente, fico pensando aonde poderão chegar os meus sonhos e as minhas fantasias.        Explicando: é que noto que a cada diminuição do número de polegadas das telas, mais se ampliam às perspectivas de vida por trás delas.          Na infância, o máximo de amplitude das conquistas – excetuando-se os sonhos, é claro – estava na tela natural que se descortinava até aonde a vista podia alcançar. Nada mais. E olha que meu pai era chegado a arroubos de grandeza. Nos piqueniques que promovia para família em fazendas e bosques nos levava até o topo de uma montanha e repousando a mão nos nossos ombros fazia aquela famosa previsão: – "Meus filhos, um dia tudo isso será de vocês!".         Os limites impostos pelas telonas dos cinemas na adolescência, não foram capazes de impedir que galopando e trocando tiros em parceria com o John Wayne derrubasse um sem número de malfeitores, conquistasse os carinhos e beijos de amante da Sophia Loren ou que me tornasse o quinto dos Três Mosqueteiros.         As 29 polegadas das telas das tevês me permitiram torcer e dar voltas olímpicas na área da minha casa junto aos heróis esportivos brasileiros, assistir na fila do gargarejo as premiações do Oscar sentado no sofá da minha sala e, de dentro do palco armado na Praia de Copacabana, acompanhar os "Rolling Stones" incendiar um milhão de pessoas cantando "Satisfaction".          Da minha mesa de serviço, através da tela de um visor de 14 polegadas, posso – além de trabalhar – sobrevoar a minha rua, pagar contas nos bancos, conversar com amigos na Austrália sobre Friburgo e dar um passeio de mãos dadas por Viena que, com um pouquinho mais de imaginação e bom gosto, pode ser em companhia da Scarlet Johansen.          Por isso é que toda vez que assisto pessoas hipnotizadas pelos visores dos aparelhos celulares, como se todo o universo estivesse ali contido, desisto de comprar o aparelho. Posso vir a achar que sou Deus, Todo Poderoso, Criador e Senhor do Céu e da Terra.

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