Governo surpreende ao anunciar que pode abrir quase 70 mil postos de trabalho no próximo ano. Em 2013, ainda há mais de 21 mil chances em diversos níveis. Mas especialistas dizem que o país precisa de mais 600 mil servidores
SIMONE KAFRUNI
Quem ambiciona entrar para o serviço público não pode reclamar da falta de oportunidades. Somente o governo federal pretende preencher 66.678 postos de trabalho em 2014, segundo prevê a proposta orçamentária encaminhada na semana passada ao Congresso. Com as mais de 21 mil vagas ainda abertas em concursos este ano, incluindo certames em governos estaduais, são quase 90 mil oportunidades até o final do ano que vem. Algumas inscrições terminam hoje (veja quadro), mas ainda há tempo para quem quer disputar uma chance de garantir estabilidade no emprego e ter salários normalmente mais altos do que os pagos pela iniciativa privada.
Com a obrigação de economizar para conter os gastos públicos e reequilibrar a economia do país, o governo surpreendeu ao anunciar a abertura de quase 70 mil vagas no ano que vem. Entretanto, há quem diga que mesmo este montante será insuficiente para suprir a real necessidade de servidores. “Havia a expectativa de que, em 2014, o governo reduziria o número de certames. Mas o país precisa de serviços públicos de qualidade. Teremos eventos importantes, como a Copa do Mundo e as Olimpíadas, e, além da infraestrutura, são necessários mais funcionários”, afirmou o professor de Direito Penal para concursos Gladson Miranda.
Na avaliação de Miranda, as manifestações que tomaram as ruas do país em junho mostraram a indignação da população com a precariedade do serviço público. “Acho que o governo se deu conta disso e há expectativa de que sejam abertas cada vez mais vagas”, analisou.
De olho nas oportunidades, as salas dos cursos preparatórios estão lotadas. O estudante João Paulo de Lima Senísio, de 26 anos, decidiu encarar as aulas há um mês. Estuda o módulo introdutório e ainda não escolheu a carreira que pretende seguir. “Quero algo nas áreas judiciária ou policial. Hoje, eu trabalho na iniciativa privada e me decepcionei com a insegurança e a baixa remuneração. Quero estabilidade. Fiquei surpreso com a abertura de tantas vagas, pois a expectativa era de que fossem cortar concursos. Espero ter tempo hábil para estudar”, afirmou.
Interesse
Presidente do Grupo VestCon, Ernani Pimentel disse que, apesar de se surpreender com as 66,6 mil vagas prometidas pelo Executivo federal, a real necessidade do país é de 10 vezes mais servidores. “Hoje, o Brasil precisa preencher pelo menos 600 mil vagas para ter um serviço público de qualidade. A população não aguenta mais ser mal atendida, ficar esperando por soluções que não chegam porque não há pessoal qualificado. Faltam médicos, policiais, fiscais”, alertou.
Pimentel ressaltou que, no primeiro ano do governo Dilma Rousseff, foram feitas 20 mil contratações sem seleção. “Quem foi que disse que concurso para funcionário é gasto público? É investimento!”, disse. Na opinião dele, a falta de concursos suficientes para atender a real necessidade do país só se justifica porque há interesse de partidos em empregar seus correligionários. “Hoje, 40% dos cargos públicos são comissionados, ocupados por indicação, e dos 60% restantes, 20% são de pessoas sem concurso”, destacou.
Vida tranquila
Por isso, o presidente do grupo Vestcon defende a aprovação do projeto, em tramitação no Congresso, que pretende criar a Lei Geral de Concursos Públicos. “Ela prevê que a contratação será somente via certame e estipula um prazo mínimo entre o edital e a prova. Quando os prazos são muito curtos, os apadrinhados comecem a estudar antes e ficam em vantagem em relação aos outros candidatos”, disse. Outra determinação é que todos os aprovados sejam contratados.
As colegas Miriam Alencar Rodrigues, de 32 anos, e Camilla Mendonça, de 31, frequentam juntas a escola Gran Cursos para o certame de auditor fiscal do Ministério do Trabalho, com provas marcadas para o próximo domingo. Na reta final, as duas se dedicam exaustivamente aos estudos. Miriam, que está noiva e vai se casar no fim do ano, espera ser aprovada para garantir uma vida mais tranquila. “O serviço público tem algumas regalias. Além da estabilidade, há planos de aposentadoria melhores. Não vamos poder contar com o INSS (Instituto Nacional de Seguridade Social) no futuro”, salientou.
Camilla se revolta com o que considera número pequeno de vagas. “Eu não entendo as intenções do governo. Um estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) diz que a necessidade do país é de 5 mil novos auditores fiscais. O Ministério do Trabalho solicitou 600 vagas, e o governo aprovou apenas 100. Enquanto isso, a população fica sem atendimento”, lamentou. Ela lembra que, hoje, faltam profissionais da categoria na maioria das cidades brasileiras. Os auditores fiscais do Ministério do Trabalho atendem denúncias trabalhistas e fazem as rescisões de contrato de trabalhadores não sindicalizados.