Ajuste fiscal: solução inevitável

    Segundo analistas, a única forma de recuperar a arrecadação será através de cortes no custeio da máquina

    Mariana Mainenti

    Com a atividade econômica a passos mais lentos do que o desejado em 2013, a arrecadação real do governo federal, de janeiro a setembro, acumula um crescimento de apenas 1,3%. O ano registrará a segunda pior receita desde 2009, quando, por conta da crise econômica e de medidas contracíclicas, houve uma queda de 7,2% no mesmo período. Nos nove primeiros meses do ano passado, a expansão foi ainda menor — 1,1%. Mas o patamar atual é muito aquém, por exemplo, do resultado de 2011, quando houve acréscimo de 12% na arrecadação.

    Analistas divergem se a renda continuará desempenhando o papel de motor para a conta fechar no positivo, mas todos concordam que será necessário um ajuste fiscal à frente: e o único espaço para cortes está no custeio da máquina pública. “Com o emprego em patamar elevado, os benefícios sociais e previdenciários também são crescentes. São despesas que permanecem estáveis em proporção do PIB (Produto Interno Bruto). Então, o restante dos custos tem que ficar parado.

    Mas há necessidade de aumentar os investimentos no país, como o salário mínimo e o Bolsa Família. As despesas com saúde e educação também aumentam. A única forma de cortar é reduzir o custeio da máquina pública”, diz o técnico da Coordenação de Finanças Públicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Rodrigo Octávio Orair.

    Ele conta que a economia brasileira está enfrentando um paradoxo. “Se as desonerações têm sido maiores que as onerações, como é possível que a carga tributária esteja aumentando?”, questiona. A resposta, segundo ele, está no bom momento do mercado de trabalho. “Como a massa salarial cresceu muito mais do que o PIB e o emprego formal também aumentou, a arrecadação foi impulsionada”, afirmou.

    Orair destaca que também aumentou a arrecadação sobre as importações, que cresceram, e houve expansão do faturamento e formalização de pequenas e médias empresas. “Esses componentes estão crescendo acima do PIB,daí temos uma receita positiva”, diz. A realidade, no entanto, tem sido menos promissora, tanto pelo aumento das desonerações quanto pela piora do nível de atividade econômica. “Como PIB desacelerando, o lucro das grandes empresas cai e também a arrecadação sobre ganho de operações financeiras”, destacou.

    Para o mercado de trabalho, ele aposta na continuidade da tendência de expansão, fazendo com que a carga tributária permaneça elevada. “Eu acho que não chegamos ao nosso limite de melhoria do mercado de trabalho, uma grande massa de subemprego ainda existe”, opinou. Para Felipe Salto, da consultoria Tendências, pode acontecer uma piora do mercado de trabalho.

    “ Não é um quadro de deterioração rápida,mas de não redução da taxa atual e talvez piora na taxa de desemprego, dependendo da estratégia adotada em 2015. É necessário um ajuste, com mais aperto no curto prazo. A política expansionista levará a uma inflação mais alta, com necessidade de elevação dos juros, um quadro mais adverso para o trabalho”, alertou.

    O economista da Gradual Investimentos, André Perfeito, também crê na necessidade de um ajuste fiscal. “A principal variável que preocupa é o investimento, que está retraindo por contada deterioração das contas públicas. O Brasil está vivendo um momento de transição das taxas de retorno. Mas economia não é ciência exata.

    Se não tivessem sido feitas desonerações, o desempenho do PIB não teria sido pior? O que o mercado quer agora? Que a Selic vá a 15% ao ano? O que o governo pede é confiança, porque fará mais à frente um ajuste fiscal”, acredita.

     

    Fonte: Brasil Econômico

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