Há razões para esperar um crescimento menor do PIB este ano.
Previsões econômicas, embora essenciais para a tomada de decisões, são um verdadeiro convite para o fracasso. Mesmo grandes economistas perdem, por vezes, a oportunidade de se manterem calados quando consultados sobre o futuro.
Mas não há muito como ser diferente.
Esses são, infelizmente, os ossos do nosso ofício. A despeito de toda dificuldade, insistimos na tarefa de “aprendizes de Mãe Dináh”, ainda que sob posse de técnicas estatísticas bastante consagradas.
Trazendo esta discussão para a realidade da economia brasileira, temos aqui diversas instituições trabalhando na árdua tarefa de realizar previsões, muitas delas participando do Sistema de Expectativas de Mercado, criado em 1999 pelo Banco CENTRAL.
O Sistema de Expectativas de Mercado coleta diariamente as previsões das diferentes instituições a respeito da evolução futura de indicadores econômicos, a partir dos quais são produzidas diversas estatísticas. O Relatório Focus, publicado toda segunda- feira no site do Banco CENTRAL, resume as estatísticas apuradas por tal Sistema.
De acordo com o último dado disponível, a mediana das expectativas aponta para um crescimento da economia brasileira de 0,12% em 2014 e de 0,38% em 2015. Assim sendo, cabe perguntar: será mesmo que vamos crescer mais em 2015 do que em 2014? Existem pelo menos quatro motivos para desconfiar que 2015 será um ano pior (e não melhor) do que 2014 em termos de crescimento do PIB. A saber: Em primeiro lugar, porque 2015 será um ano de ajuste fiscal.
Como já anunciado pela nova equipe econômica, a política fiscal perseguirá uma meta de superávit primário de 1,2% do PIB em 2015, o que representa uma forte contração fiscal se consideramos que o resultado primário de 2014 deve ficar próximo de zero (ou até mesmo negativo).
Parte desse ajuste, aliás, já começa a sair do papel, com as mudanças anunciadas nas regras de concessão de benefícios como seguro-desemprego, pensão por morte e abono salarial.
Em segundo lugar, porque 2015 será o ano em que aparecerão com maior intensidade os impactos dos apertos monetários efetuados em 2014 (quando a taxa de juros iniciou o ano em 10% e encerrou em 11,75%). De fato, existem defasagens na transmissão da política monetária, com o impacto máximo no produto se dando cerca de quatro a cinco trimestres após um choque de política monetária no caso do Brasil.
Ademais, são esperadas novas elevações de taxa de juros em 2015, caso o Banco CENTRAL esteja realmente disposto, conforme anunciado, a trazer a inflação de volta para a meta em 2016. Caso este cenário se concretize, pode- se esperar mais impacto negativo sobre a demanda agregada e, consequentemente, sobre o produto em 2015, ainda que a maior parte desses impactos se dê apenas em 2016, por conta das defasagens descritas.
Em terceiro lugar, porque tivemos um aumento na TJLP, de 5% para 5,5% em dezembro de 2014, após anos sem elevações nesta taxa, sendo que novas rodadas de aumento não estão descartadas.
Isso é importante, pois elevações na TJLP têm efeito similar a um aperto monetário, dado que fração importante do crédito no país (cerca de 20%), em particular do BNDES, sofre influência direta desta taxa.
Em quarto lugar, porque temos os preços das commodities em queda no mercado internacional, com perspectivas de reduções adicionais. Isso não seria motivo para preocupações não fosse o fato de haver forte correlação entre as taxas de variação dos preços internacionais de commodities (por exemplo, o índice CRB) e do PIB brasileiro, com as taxas de variação do CRB precedendo no tempo as taxas de variação no PIB.
Obviamente, os quatro motivos listados acima não esgotam as fontes de contração do PIB.
Apenas ganham destaque pela importância que têm na determinação da dinâmica econômica do país. Porém, nem tudo é motor andando de marcha à ré.
Também existem fontes de expansão para o nível de atividade, conforme veremos a seguir. Tais fontes, no entanto, não deverão ter força suficiente para alavancar nosso crescimento.
Componentes autônomos de demanda poderiam contribuir positivamente para o PIB de 2015. Por exemplo, o investimento em infraestrutura (via concessões) é tido como uma aposta.
Porém, neste momento, essa aposta fica cercada de dúvidas diante dos impasses vividos pelas grandes empresas de infraestrutura do país devido à Operação Lava Jato.
Outra possibilidade de expansão poderia ocorrer via exportações líquidas, que reagiriam a uma taxa de câmbio mais depreciada.
No entanto, as exportações líquidas têm peso pequeno na demanda agregada no Brasil, o que torna difícil explicar uma aceleração do crescimento com base apenas neste canal de transmissão.
Além do mais, nossos principais mercados de exportação de manufaturados devem sofrer desaceleração (ou mesmo queda) no nível de atividade em 2015, impedindo maior vigor das exportações.
Por fim, outra possível fonte de crescimento, conforme argumentado por alguns, reside na ampliação do investimento, fruto de uma eventual redução da incerteza no país. Talvez essa seja a maior dúvida, dado que, nos últimos anos, os erros de previsão estiveram muito associados ao comportamento da formação de capital fixo. Entretanto, não é fácil conceber um comportamento pujante para o investimento no contexto de uma economia que cresce pouco (efeito acelerador) e no cenário em que a Petrobras, empresa com peso relevante no investimento, passa por intensa dificuldade.
Em síntese, são fortes os argumentos para se esperar uma desaceleração do crescimento neste ano. Obviamente, não é um fato que a recessão já esteja contratada, pois tudo pode acontecer, inclusive nada, como gostava de repetir um ex-ministro da Fazenda do país. Fazer previsão é sempre uma atividade arriscada. Na dúvida, vale apertar o cinto.
Ricardo de Menezes Barboza é economista do Grupo de Conjuntura Econômica do IE-UFRJ e professor de Macroeconomia da Coppead-UFRJ.
Fonte: Valor Econômico