Ata gera controvérsia quanto a futuro da Selic

    Política monetária Expectativa dos analistas é que ciclo de aperto se estenda pelo menos até março

    Antonio Perez, Lucinda Pinto e Eduardo Campos De São Paulo e Brasília

    Controversa é um bom adjetivo para a ata do Comitê de política monetária (Copom) divulgada ontem.

    Unidos quanto à interpretação de que o ciclo de aperto ainda se estende pelo menos até março, economistas se dividiram em relação à magnitude da alta da taxa Selic no próximo encontro do colegiado do Banco CENTRAL (BC) O consenso em relação à continuidade do processo de aperto se apoia no fato de que o Copom, embora considere que o “cenário de convergência para a inflação tenha se fortalecido”, afirma que “os avanços alcançados até o momento não se mostram suficientes”.

    Além disso, no cenário de referência do próprio BC – que considera taxa de câmbio em R$ 2,65 e Selic em 11,75% – a projeção para o IPCA em 2015 não apenas permanece acima da meta como aumentou em relação ao encontro anterior do Copom. 

    As divisões sobre o grau de alta da Selic – repetição da dose de 0,50 ponto ou desaceleração para 0,25 ponto – brotam do fato de o BC ter deixado de alertar “que fará o necessário para levar o IPCA para o centro da meta em 2016, mensagem que vinha sendo associada a alta mais forte da Selic. Além disso, o Copom também se mostrou mais confiante que a política fiscal ajude no combate à inflação e traçou um cenário em que a economia cresce abaixo do potencial, o que atenua a alta dos preços. 

    Para o economista-chefe da Garde Asset Management, Daniel Weeks, o Copom deu sinais de que está prestes a encerrar o ciclo de aperto, o que ele considera “um erro”, tendo em vista que o IPCA vai romper o nível de 7% em 12 meses. ” Não parece adequado para um Banco CENTRALque está buscando recuperar a credibilidade”, afirma. 

    Weeks considera que o ambiente global de afrouxamento monetário, com alguns bancos centrais de países emergentes iniciando uma rodada de corte de juros, contribui para a postura mais branda observada na ata. A diferença é que “o mundo lida com um problema de inflação baixa”, o que não é o caso do Brasil.

    Segundo o economista da Votorantim Corretora Guilherme Maia, a ata mostrou o BC “mais sensível” à desaceleração da atividade econômica ao observar que a atividade caminha em um ritmo menor que seu potencial. E isso é compatível com a expectativa de uma desaceleração do ritmo de aperto em março, com alta da Selic em 0,25 ponto, para 12,50% ao ano. “O que vai ficar claro em março é um cenário de decepção com a atividade. 

    Agora, estão todos sensíveis à inflação, mas o hiato do produto é um fator muito relevante para a política monetária“, diz.

    Para o ex-diretor do BC Mario Mesquita, que atualmente comanda a equipe de economistas do Banco Brasil Plural, a ata do Copom sugere que o atual ciclo de aperto monetário está perto do fim, já que a economia cresce abaixo do seu potencial. Em relatório enviado ontem a clientes, Mesquita também destaca o parágrafo 22 da ata, no qual o Copom se junta a outros bancos centrais ao avaliar que a queda dos preços internacionais do petróleo o ajudam na tarefa de conter a inflação. Na ata, o comitê afirma que “independentemente do comportamento dos preços domésticos da gasolina, a evolução dos preços internacionais tende a se transmitir à economia doméstica tanto por meio de cadeias produtivas como a petroquímica, quanto por intermédio das expectativas de inflação”.

    Apesar disso, as leituras de inflação elevadas e seus efeitos sobre as expectativas, assim como as projeções do Copom, apontam na direção de mais aperto.

    “Portanto, não podemos considerar a reunião de março como algo já decidido”, afirma Mesquita.

    “Por enquanto, mantemos a projeção de alta de 0,25 ponto e pausa do ciclo, assumindo que, se inflação se mover rumo a 4,5% no próximo ano, sem necessariamente alcançar seu destino, o Copom ficará feliz”, diz.

    Mas há quem não considere que a ata sugira um Copom mais propenso a diminuir o ritmo de aperto. É o caso do economistachefe do BancoABC Brasil, Luis Otávio de Souza Leal, para quem o BC evitou dar ênfase, na ata, ao ambiente externo deflacionário e ao movimento de queda do preço do Petróleo. “O BC tinha a possibilidade de colocar um peso maior no ambiente externo e não o fez”, afirma. “Reconheço que cresceu a chance de uma dose menor, de 0,25 ponto, vir em março, mas ainda acredito que o ritmo será mantido.” O economista chama a atenção para o fato de o documento ter sido enfático em sua projeção de convergência da inflação para 4,5% em 2016. E, com o cenário atual de piora da inflação, Leal considera “difícil imaginar” que o Copom vai desacelera o ritmo de alta da Selic.

    A ausência da expressão “o que for necessário”, usada no Relatório de inflação, é vista por Leal como uma maneira de evitar excessos na expectativa para o futuro da política monetária. “A inflação deve subir ainda mais neste começo de ano e talvez o BC tenha querido evitar que o mercado avançasse para apostas em uma aceleração do ritmo”.

    Embora a ata possa ter soado “dovish” (menos inclinada ao aperto), o economista-chefe do BTG Pactual e ex-diretor do BC, Eduardo Loyo, mantém a projeção de alta da Selic até 13% no atual ciclo de aperto. “A distância entre as projeções do Banco CENTRAL para a inflação em 2016 e a meta de 4,5% não vai dar suporte a um abrandamento antes disso [da Selic atingir 13%]”, diz Loyo, em relatório enviado a clientes. 

    Em meio às divergências dos economistas, os investidores no mercado de juros futuros da BM&F ampliaram levemente as apostas em alta da Selic em 0,25 ponto em março, para 12,50% ao ano.

     

    Fonte: Valor Econômico

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