Assessores percorrem gabinetes após freio colocado por governistas à proposta defendida por Campos Neto
Assessores e técnicos do Banco Central têm percorrido gabinetes no Senado para pedir apoio à PEC (proposta de emenda à Constituição) que amplia a autonomia da autoridade monetária.
A medida é defendida pelo presidente da instituição, Roberto Campos Neto, cujo mandato termina em dezembro.
A ofensiva pela aprovação da PEC ocorre em meio à mobilização de uma ala dos servidores contrária à mudança de autarquia para empresa pública e à resistência de senadores governistas. Apesar de ter autonomia assegurada em lei desde 2021, a autoridade monetária não tem poder sobre o próprio orçamento.
A partir da PEC, o Banco Central passaria de autarquia especial para empresa pública de natureza especial, o que daria maior autonomia financeira, como ocorre no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Um assessor afirma, de forma reservada, que o BC deu início à agenda de visitas no início do mês, após a divulgação do relatório, para garantir que as sugestões feitas por membros da instituição haviam sido incorporadas pelo relator, senador Plínio Valério (PSDB-AM).
Um resumo de argumentos a favor da PEC tem sido levado aos parlamentares. Entre outros pontos, o documento afirma que a proposta vai trazer “economia de gastos fiscais” e liberar R$ 5 bilhões para “outras prioridades do governo, em especial, na área social”.
O texto também diz que a medida vai beneficiar a sociedade, o BC, os servidores, o governo e o próprio Congresso, que cumpriria a “missão de consolidar a autonomia” da instituição e continuaria com o “papel fiscalizatório”.
“Esta é uma proposta que apresenta ganhos em diferentes esferas: a sociedade brasileira, com novas e melhores entregas e inovações que o BC vai ter condições de fazer; o próprio BC, que vai ter as condições necessárias para fazer o seu trabalho de forma mais eficiente”, diz trecho do resumo.
As conversas têm sido conduzidas no Senado pelo chefe do departamento de Estatísticas do BC, Fernando Rocha, o chefe de gabinete da diretora de Relacionamento, Arthur Campos, e o chefe da assessoria parlamentar, Bruno Peres.
Rocha participou da audiência pública na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado na terça-feira (18), entre os convidados favoráveis à PEC.
Por causa do compromisso no Congresso, ele não compareceu à sessão inicial do Copom (Comitê de Política Monetária), durante a qual funcionários do BC fornecem subsídio técnico ao colegiado para a calibragem da taxa básica de juros, a Selic.
Em sua argumentação na CCJ, Rocha disse que a ampliação da autonomia ocorreria “com a devida governança e os devidos controles” e que isso ajudaria a concluir “um longo processo de evolução institucional”.
O técnico também mencionou alguns impactos sobre as estatísticas fiscais do país, uma vez que a autoridade monetária deixaria de compor a conta do governo central, que compreende hoje o Tesouro Nacional e a Previdência Social, além do BC.
Destacou a exclusão do resultado primário do BC, que em 2023 correspondeu a um déficit nominal de R$ 465 milhões, o que tornaria a conta do governo central mais superavitária.
Ressaltou ainda o alinhamento do cálculo da dívida bruta ao padrão internacional. O conceito do FMI (Fundo Monetário Internacional) engloba toda a carteira livre, não apenas as operações compromissadas (venda de um título com o compromisso de recompra em um prazo determinado).
Essas informações constam no material de apoio usado pelo chefe do departamento de Estatísticas –colocado à disposição dos parlamentares na contraofensiva do BC.
A audiência foi convocada depois que senadores governistas levaram ao presidente da CCJ, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), a informação de que o relatório de Plínio seria derrotado se fosse colocado em votação.
Após a sessão de debates, o relator disse que estava “preocupado” com a mobilização. “É o servidor que me preocupa. Embora eles estejam protestando por protestar, já ficou claro que o movimento ali é político e eu não quero me envolver nisso”, afirmou o senador a jornalistas.
Como mostrou a Folha, um parecer feito pela liderança do governo no Senado afirma que a PEC é inconstitucional, cria insegurança jurídica para os servidores e coloca em xeque a fiscalização de instituições financeiras.
Entre outros pontos, a nota técnica afirma que a proposta é ambígua e gera “incerteza quanto ao regime jurídico” ao criar uma empresa pública com funções incompatíveis com a exploração de atividade econômica, como a emissão de moeda e a gestão de reservas internacionais.
Fonte: Folha de São Paulo