BC deixa porta aberta para mudança de rumo dos juros

    Mesmo curto, o comunicado divulgado após o encontro de política monetária trouxe uma sinalização importante: a de que o Banco CENTRAL poderá, a qualquer momento, voltar a mexer na taxa Selic. Essa é a leitura quase consensual de economistas do mercado financeiro. A expressão “neste momento”, utilizada tradicionalmente quando o Banco CENTRAL tem a intenção de mudar sua estratégia, abala a expectativa de uma pausa prolongada dos juros. E deixa a porta aberta para que a autoridade monetária, a depender da evolução da inflação e da atividade econômica, estabeleça um novo plano de voo para a Selic.

    “O comunicado foi muito lacônico. Mas, rigorosamente, acredito que o Banco CENTRAL quis dizer que, se precisar reverter a decisão, ele poderá fazê-lo”, afirma Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos. Para ela, a variável relevante para medir os efeitos do aperto monetário já realizado, que acrescentou 3,75 pontos ao juro básico, é a inflação. “Mesmo que a atividade continue se enfraquecendo, e acho que isso vai acontecer, a política monetária tem de bater na inflação ainda neste ano”, afirma. “E eu estou pensando em preços livres, porque sabemos que os administrados vão subir. Temos que ter sinais mais claros de desinflação nos preços livres.”

    Zeina diz que, neste ano, é possível que surjam medidas de PIB negativo, com enfraquecimento pelo lado da demanda. “Mas a inflação continua muito alta. Então, a “prova do pudim” de que a taxa de juros não está no campo neutro nem expansionista é o rumo da inflação”, afirma.

    Tatiana Pinheiro, economista do Santander, concorda que a inclusão no comunicado da expressão “neste momento” pode antecipar a discussão de uma retomada da alta da taxa Selic. “A expressão pode dar um tom de temporário para alguns agentes do mercado.” Tatiana acredita que o fato de a inflação seguir pressionada pode levar o BC a retomar o ciclo de aperto monetário no fim deste ano, avalia “O BC já havia sinalizado que o tamanho do ciclo de aperto monetário já era grande e os efeitos estavam por vir. Isso aliado ao fato da confiança do consumidor e do empresários estarem em nível baixo potencializaria o efeito sobre a atividade econômica e inflação”, afirma Tatiana.

    Já o economista-chefe da Votorantim Corretora, Roberto Padovani, trabalha hoje com um cenário em que a Selic volta a subir no começo de 2015 e, ao longo do ano, seja elevada em mais 1 ponto percentual. Mas ele reconhece que há riscos importantes surgindo do lado da atividade, que podem influenciar o rumo da política monetária nos próximos meses. “A forte deterioração da confiança dos empresários e dos consumidores é um elemento novo, preocupante, que pode por em risco a recuperação da atividade e, consequentemente, influenciar o rumo da política monetária“, afirma.

    A expressão “neste momento”, portanto, confirma que o BC deverá manter a taxa de juros estável por um tempo, mas que vai acompanhar a evolução tanto da inflação quanto da atividade, que podem impor tanto uma nova elevação da taxa quanto a sua queda. “Ele está deixando a porta aberta, o que não é nada trivial, porque podemos ter tanto um cenário em que a inflação ficará desancorada como podemos ter surpresas negativas do lado do crescimento econômico”, afirma.

    “O que salta aos olhos é o fato de que os indicadores de confiança estarem em níveis tão baixos. E o Banco CENTRAL deve estar olhando para isso”, afirma.

    O economista ressalta que, por outro lado, se as expectativas de inflação continuarem desancoradas, então os juros podem voltar a subir.

    Ao explicitar no comunicado que a manutenção da Selic estava sendo tomada “neste momento” o Copom não se comprometeu com um ciclo mais prolongado de aperto, ao mesmo tempo em que deixou aberta a possibilidade de um ajuste mais à frente, segundo o economista-chefe do Banco J.Safra, Carlos Kawall.

    Apesar da atividade econômica mostrar sinais de desaceleração no segundo trimestre, as expectativas para inflação seguem altas e o ciclo de aperto monetário ainda não repercutiu no mercado de trabalho. Kawall prevê inflação de 6,6% em 2014, acima do teto da meta de 6,5%.

    Nesse cenário, o economista espera uma retomada dos ajustes da taxa básica após as eleições em outubro, com a Selic encerrando o ano em 12%.

    Para o economista, melhor seria o BC ter prolongado o ciclo de aperto monetário. Mas com os sinais de enfraquecimento da atividade, desaceleração da inflação em abril e a perda do ímpeto da economia mundial no primeiro trimestre, que trouxe uma redução da aversão a risco, o BC optou por uma pausa no ciclo. Isso não deve impedir que o BC reduza no câmbio o volume das vendas diárias de dólares.

     

    Fonte: Valor Econômico

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