Alex Ribeiro, Eduardo Campos e Edna Simão | De Brasília
As projeções divulgadas pelo Banco Central (BC) no seu Relatório de Inflação (RI) apontam uma chance de 90% de a inflação ficar abaixo do piso da meta, de 3%, neste ano e que ainda há algum espaço para a continuidade do ciclo de distensão monetária no começo do ano que vem. Mas os números mostram que, caso não haja melhora no cenário inflacionário, o Comitê de Política Monetária terá que fazer uma elevação moderada nos Juros na virada de 2018 para 2019 para garantir o cumprimento das metas dos anos seguintes.
Num momento em que analistas do mercado discutem se o adiamento para 2018 da votação da Reforma da Previdência levará à interrupção do ciclo de distensão monetária, o diretor de política econômica do BC, Carlos Viana de Carvalho, disse que o momento em que esse projeto é aprovado não é o ponto mais importante, e sim a disposição dos mercados de financiar o Déficit público diante da percepção de que há empenho do governo e Congresso para enfrentar a questão.
“Temos de olhar um amplo conjunto de informações, e a tramitação das reformas faz parte disso. Não tem timing específico de eventos específicos. Não há ligação mecânica com a condução da política monetária”, disse Viana, que foi questionado sobre o tema mais de uma vez. O diretor reforçou posição do presidente do BC, Ilan Goldfajn, que em entrevista ao Valor disse que as reformas não são um cenário binário. “Nada do Copom é binário. Olhamos o conjunto de dados e a situação econômica”, disse Ilan.
O relatório reafirmou a sinalização de desaceleração moderada no ritmo de cortes de Juros na próxima reunião do Comitê de Política Monetária, de fevereiro, em relação à baixa de 0,5 ponto percentual decidida em dezembro, quando a meta para a taxa Selic caiu de 7,5% ao ano para os atuais 7% ao ano. Também voltou a afirmar que essa sinalização está mais suscetível a mudanças no cenário econômico e nos riscos para a inflação do que indicações anteriores. Repetiu, ainda, que depois de fevereiro deverá agir com mais cautela.
Todas as projeções de inflação apresentadas no RI sugerem que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficará em 2,8% no fim de 2017, com risco de 90% de furar o piso da meta, de 3%. Se isso de fato ocorrer, o presidente do BC terá que escrever uma carta aberta ao ministro da Fazenda explicando os motivos e apontando ações que serão tomadas para fazer corrigir esse desvio.
Para 2018, o BC estima IPCA de 4,2%, mesmo valor previsto para o fim de 2019, e para 2020 a prognóstico é de 4,1%, no cenário que trabalha com a trajetória de Juros e Câmbio prevista pelo mercado para esse período. O mercado prevê que os Juros encerrem em 7% em 2018 e subam a 8% em 2019, permanecendo nesse patamar.
De acordo com Viana, o comportamento dos preços dos alimentos, que registra deflação de cerca de 5% no acumulado do ano, explica o desvio do IPCA com relação à meta. O BC, por princípio, não reage aos choques primários de preços, atuando somente quando esse evento pontual se espraia para outros setores da economia. De fins de 2016 para cá, os Juros básicos caíram de 14,25% no fim de outubro para os atuais 7%.
O RI mostra que o processo desinflacionário, depois de a inflação chegar a um pico de 11,7% em 2015, teria chegado ao fim e que uma recomposição do preço dos alimentos aliado à retomada da atividade vai promover uma convergência da inflação à meta.
No relatório, o BC voltou a enfatizar os riscos que podem fazer a inflação ficar tanto acima quanto abaixo das projeções, o que em tese poderia levá-lo a cortar mais ou menos os Juros – e até mesmo subi-los.
Do lado positivo, destacou o risco de a inflação baixa de alimentos e produtos industriais se espalhar ainda mais para outros preços da economia, além das chances de a inflação baixa de 2017 se propagar para 2018. Segundo o relatório, para 2018 a probabilidade de a inflação ficar abaixo do piso está em 18%. Do lado negativo do balanço de risco está a possibilidade de uma frustração das expectativas sobre as reformas e a reversão do cenário externo favorável para economias emergentes. De acordo com Viana, os dois lados do balanço de riscos são tratados de forma simétrica pelo colegiado.
Num dos cenários de projeção apresentados pelo BC no relatório, a inflação chegaria a 4,4% em 2019 e 4,4% em 2020 se os Juros ficarem em 7% ao ano por todo esse período. A inflação projetada supera as metas, estabelecidas em 4,25% para 2019 e 4% em 2020. A inflação se aproxima das metas, ficando em 4,2% em 2019 e em 4,1% em 2020, caso os Juros subam para o patamar de 8% ao ano entre fins de 2018 e começo de 2019.
Viana explicou que essa projeção do mercado para a Selic reflete o entendimento de que a política monetária se encontra em patamar estimulativo, ou seja, incita a recuperação da economia ajudando a levar a inflação à meta. Mas, segue Viana, as políticas estimulativas não ficarão assim para sempre, por isso seria necessária uma normalização da política monetária. “Essa normalização acontece de duas formas. Uma é alta dos Juros e outra é a queda da taxa estrutural. Isso é uma leitura do mercado que pelo menos parte da normalização acontece via taxa de Juros.”
Para Antonio Madeira, economista da MCM Consultores, o documento do BC indicou a possibilidade de a taxa Selic cair abaixo dos atuais 7% ao ano já a partir do início de 2018. O economista chama a atenção para as simulações para o comportamento da inflação até 2020 feitas pela autoridade em cenário de diferentes taxas de Juros. Segundo Madeira, as projeções indicam que, mesmo com o juro na mínima histórica, as pressões sobre preços “continuam tranquilas” pelos próximos anos.
“Podemos ter uma nova rodada de surpresas e o BC pode estender o ciclo”, diz Daniel Weeks, economista-chefe da Garde, que projeta inflação de 2,7% no acumulado de 12 meses até o fim do primeiro trimestre. Por ora, o especialista não aposta numa queda mais intensa da Selic, para além de 6,75%. O que as perspectivas de inflação garantem no momento é o fato de que o “BC não deverá subir juro tão cedo, provavelmente nem no final de 2018”. (Colaboraram Sérgio Tauhata e Lucas Hirata, de São Paulo)
Fonte: Valor Econômico