Em comunicado, instituição diz que alta nos juros foi feita para garantir, “a um custo menor”, uma inflação mais baixa em 2015 e 2016
Célia Froufe / brasília
Três dias após a reeleição da presidente Dilma Rousseff, em decisão inesperada, o Banco CENTRAL decidiu ontem elevar ataxa básica de juros da economia (Selic) para 11,25% ao ano. Desde abril, a Selic estava estacionada em 11% ao ano.
A ação do BC, duramente criticado pelo mercado por deixar o índice oficial de inflação (IPCA) grudado no teto da metade 6,5%por muito tempo, tenta deixar claro, de forma mais contundente, que não despreza as pressões inflacionárias e que buscará trazer o IPCA para o centro da meta de 4,5% no novo mandato de Dilma Rousseff. O IPCA acumulado em 12 meses está acima do teto da meta.
Apesar do marasmo da economia,pesou na decisão de ontem a necessidade de carimbar que o único mandato do BC, o controle dos preços, está mantido. Principalmente, depois que o Banco passou a admitir que a contenção dos gastos públicos, via política fiscal, não tem contribuído para aliviar a política de juros. Além disso, a instituição passa por um momento de recuperação de sua imagem, após desgaste sofrido durante a campanha eleitoral.
O papel do BC, sua autonomia e independência estiveram no centro da campanha eleitoral. A presidente Dilma atacou, em seus programas, propostas feitas pelos candidatos da oposição. Insinuava até que um BC fora do controle do Palácio do Planalto seria entregar o poder aos banqueiros sobre juros, empregos, preços e salários. E que isso tiraria comida da mesa dos brasileiros.
Segundo o comunicado divulgado após a decisão, o Comitê de política monetária (Copom) considerou “oportuno” ajustar as condições monetárias para garantir, a um custo menor, um cenário mais “benigno” para a inflação em 2015 e 2016. Nos cálculos apresentados pelo BC em setembro, a possibilidade de estouro da meta este ano estava em 37% – e, para o próximo ano chegava a 31%.
A decisão surpreendente, no entanto, não foi unânime. Cinco membros do comitê, incluindo o presidente ALEXANDRE TOMBINI, votaram a favor da alta dos juros.Três outros defenderam a estabilidade da taxa. Para explicar a decisão, o Copom apresentou o comunicado mais longo desde agosto de 2011, quando promoveu o chamado “cavalo de pau” na política monetária, ao reduzir a Selic em meio ponto porcentual, para 12% ao ano.
Cálculos. Com a decisão, os economistas já vão refazer os cálculos para as projeções de vários indicadores e definir as apostas para a próxima reunião do Copom, marcada para o início de dezembro.Até porque havia unanimidade entre os analistas do mercado financeiro de que a taxa seria mantida ontem. Pela última pesquisa Focus, essa alta para 11,25% ao ano era aguardada apenas para janeiro de 2015, primeiro mês do próximo mandato de Dilma.
Um fator que será fundamentalpara o BC nas próximas decisões de política monetária é o comportamento do dólar. Ainda mais depois que o Federal Reserve (Fed, o Banco CENTRAL dos Estados Unidos) anunciou ontem que não continuará com seu programa de compra de ativos. Embora amplamente esperada, essa decisão do Fed pressiona as moedas de países emergentes, como o real.
Além disso, a divulgação é vista como um prenúncio de que a alta dos juros por lá está mais próxima. O anúncio se deu antes do nício da segunda parte dareunião do Copom e se encaixa no teor do alerta feito pela diretoria do BC no Relatório Trimestral de Inflação de setembro sobre a a versão ao risco que se instalou no mercado internacional.
Alterações. Do lado doméstico, a elevação da taxa se deu em meio a indefinições sobre a permanência dos membros do Copom em seus cargos. Apesar de haver um convergênciano mercado sobre a permanência de TOMBINI à frente do BC, aguarda-se a oficialização pela presidente Dilma. Os diretores tiveram que lidar com um fator externo na reunião, que são os rumores sobre os possíveis desligamentos de seus cargos. Muitos estão “incomodados” com essa situação de indefinição, apurou o Broadcast, serviço em tempo real da Agência Estado.
Há um consenso, no entanto, de que nenhum deles baterá o martelo sobre o rumo de suas carreiras antes da definição na alta cúpula da instituição. Antes disso, é aguardado o novo nome para o Ministério da Fazenda em substituição a Guido Mantega. O Banco CENTRAL é subordinado à Pasta. Em casos de um possível descumprimento da meta de inflação, por exemplo que pode ocorrer este ano -, o presidente do BC tem que dar satisfação pública ao ministro da Fazenda.
PARA LEMBRAR
Polêmicas na campanha
O aumento da taxa básica de juros apenas três dias depois de fechadas as urnas da eleição presidencial contrasta com o discurso da presidente reeleita Dilma Rousseff, que durante toda a campanha fez questão de dizer que não tomaria medidas impopulares na economia. Chegou a afirmar que o projeto de Aécio Neves, candidato do PSDB à Presidência, plantava “inflação para colher juros”.
O economista Armínio Fraga, indicado por Aécio Neves como seu futuro ministro da Fazenda caso vencesse as eleições, foi um dos principais alvos dos ataques. A campanha de Dilma fez questão de lembrar o período em que Fraga comandou o Banco CENTRAL, na gestão de Fernando Henrique Cardoso na presidência, quando a taxa de juros chegou a 45% ao ano, em meio a uma grave crise cambial que o País atravessava.
Em um dos debates, Dilma criticou a proposta de Aécio de baixar a meta de inflação para 3%. “Eu considero muito grave a proposta de 3% de taxa de inflação, por que vai repetir a velha história: para ter 3%, vocês vão triplicar o desemprego para 15% e levar a taxa de juros a 25%. A receita é a mesma: recessão, recessão, recessão. E o resultado é o mesmo: desemprego, arrocho salarial e juros altos.”
O debate em torno da independência do Banco CENTRAL, proposta defendida por Marina Silva (PSB) para combater a inflação, foi alvo da propaganda mais polêmica da campanha de Dilma. Uma encenação com atores simulava uma reunião de banqueiros e ligava a proposta de Marina de dar independência ao Banco CENTRAL à falta de comida na mesa das famílias.
Fonte: O Estado de S.Paulo