Por todos esses aspectos – campanhas pessoais a base de dinheiro, desvinculadas de programas, de ideologia e das campanhas majoritárias, coligações esquizofrênicas, filhotismo e pulverização partidária – o próximo presidente da República, seja quem for, terá que negociar com vários partidos (e caso a caso) para formar maioria pontual e, acima de tudo, ficará na mão dos partidos médios (muitos dos quais fisiológicos). Num cenário desses, as chances de reformas estruturais são praticamente nulas. Ou haverá pressão popular ou o toma-lá-dá-cá tende a aumentar.
Por Antônio Augusto de Queiroz (*)
A eleição para a Câmara dos Deputados, além da ausência de entusiasmo nas campanhas, apresenta uma série de características poucos presentes em eleições anteriores.
A primeira é a pouca vinculação com a eleição presidencial. Os candidatos estão concentrados em suas campanhas, sem o mesmo engajamento anterior nas eleições majoritárias.
A razão para tanto é que a eleição para deputado federal está precificada, mercantilizada, e os candidatos não esperam nenhuma influência, seja positiva ou negativa, da eleição presidencial sobre seu desempenho eleitoral.
A segunda, um pouco dependente da primeira, diz respeito às alianças ou coligações para a eleição proporcional, feitas exclusivamente para resultados. Não existe qualquer vínculo programático ou ideológico entre os candidatos e entre os partidos coligados. Prevalece a lógica de “cada um por si e Deus por todos”.
A terceira característica, relacionada com a segunda, é que nunca se viu uma pulverização tão grande nas disputas proporcionais, por força do grande número de coligações. No Rio Grande do Norte, por exemplo, não há hipótese de um partido eleger mais do que um deputado. Ou seja, serão oito partidos com um deputado cada.
A quarta está relacionada com o chamado “filhotismo”, ou seja, com a candidatura de parentes nos casos em que o titular ou chefe político desiste de concorrer ou disputa um cargo majoritário. São muitos os exemplos, mas aqui mencionamos apenas alguns casos de parentesco de primeiro grau.
Ao contrário do que se imagina, essa não é uma característica exclusiva de regiões menos desenvolvidas nem de determinados partidos políticos. Alcança a quase totalidade dos partidos e todas as regiões.
Na região Nordeste, podemos citar casos como os de Garibaldi Alves (PMDB/RN), Cássio Cunha Lima (PSDB/PB) e Wilson Santiago (PTB/PB), que lançaram os filhos, e o senador Vital do Rego (PMDB/PB) e o deputado João Maia (PP/RN), que lançaram irmãos, e o deputado Oziel Oliveira (PDT/BA), que lançou a mulher.
Na Sudeste, lembramos os casos de Anthony Garotinho (PR/RJ), Sérgio Cabral (PMDB/RJ), Newton Cardoso (PMDB/MG) e Nárcio Rodrigues (PSDB/MG), que lançaram os filhos, o senador Zezé Perrella (PDT-MG), que lançou o filho.
Na região Centro-Oeste, podemos mencionar os casos do deputado Armando Vergílio (SD/GO) e de Maguito Vilella (PMDB/GO), que lançaram filhos.
Na Sul, os atuais deputados Vilson Covatti (PP/RS) e João Pizolatti (PP/SC) lançaram também seus filhos.
E, na região Norte, lembramos os casos de Marcelo Miranda (PMDB/TO), que lançou a mulher, de Arthur Virgílio (PSDB/AM), que lançou o filho, de Natan Donadon (PMDB/RO), que lançou a irmã, além do candidato a governador Neudo Campos (PP/RR), que lançou o filho.
O quadro geral – do qual resultará um Congresso com poucos partidos grandes (com mais de 50 deputados) e muitos partidos médios (com entre 20 a 50 deputados), pequenos (com entre 10 a 20) e nanicos (com até 10) – é estimulado pelo interesse dos partidos no horário eleitoral gratuito e no fundo partidário, já que ambos são calculados com base no número de votos obtidos para a Câmara.
Para terem mais acesso a esses benefícios ou para aumentarem sua participação no fundo partidário e no horário eleitoral, os partidos estão menos preocupados em recrutar quadros identificados com princípios republicanos, programáticos ou ideológicos, e mais interessados em puxadores de votos ou em lançar o maior número possível de candidatos para ampliar seus poderes político e econômico.
Por todos esses aspectos – campanhas pessoais a base de dinheiro, desvinculadas de programas, de ideologia e das campanhas majoritárias, coligações esquizofrênicas, filhotismo e pulverização partidária – o próximo presidente da República, seja quem for, terá que negociar com vários partidos (e caso a caso) para formar maioria pontual e, acima de tudo, ficará na mão dos partidos médios (muitos dos quais fisiológicos). Num cenário desses, as chances de reformas estruturais são praticamente nulas. Ou haverá pressão popular ou o toma-lá-dá-cá tende a aumentar.
(*) Jornalista, analista político e Diretor de Documentação do Diap.