Leitos fechados por falta de médicos e diversos outros profissionais de saúde nos hospitais, motoristas deixados à própria sorte nas rodovias devido à escassez de policiais para fazer o patrulhamento, trabalhadores submetidos a situações degradantes longe do alcance das vistas dos poucos auditores responsáveis pela fiscalização. Esses são apenas alguns exemplos das graves consequências da carência de pessoal que atinge os diversos órgãos federais. Cenários que tendem a se agravar devido à decisão do governo de atender até o fim do ano que vem a suspensão de novos concursos, com apenas algumas exceções.
A medida deverá enfrentar a pressão de várias categorias, sufocadas pela sobrecarga de trabalho, em defesa, sobretudo, da qualidade dos serviços prestados à sociedade, como destacou o secretário de Administração da Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), Josemilton da Costa. “É uma situação preocupante. Essa decisão irá prejudicar cada vez mais o atendimento à população”, alertou.
Ao afirmar em entrevista coletiva no último dia 7 que não há previsão de novos concursos públicos no ano que vem, o ministro interino do Planejamento, Dyogo Oliveira, nada mais fez do que reforçar o que já havia sido anunciado em abril, quando do envio do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2017 para o Congresso Nacional. Na prática, o projeto que serve de base para a elaboração do orçamento mantém para o próximo ano, as restrições aos concursos já em vigor neste ano de 2016.
Demandas precisam ser avaliadas
Entretanto, ao aprofundar o assunto por meio de nota divulgada no dia seguinte à fala do titular da pasta, o Ministério do Planejamento frustrou a expectativa dos diversos órgãos, que, atendendo a orientação do próprio ministério, enviaram pedidos de concursos para cerca de 17 mil vagas, na maioria dos casos, visando à simples e necessária recomposição dos seus quadros. Segundo a nota do Planejamento, todas as demandas serão devolvidas.
Josemilton da Costa destacou que as solicitações precisam ao menos serem analisadas caso a caso, para que se verifique quais órgãos não têm condições de esperar muito mais tempo pela recomposição da sua força de trabalho. “Não fazer isso será, em alguns casos, paralisar os trabalhos realizados por esses órgãos”, argumentou. O sindacalista apontou que na Saúde, o quadro de profissionais está defasado em todas as áreas. “Faltam de médicos, enfermeiros e agentes de endemias a servidores da área de apoio”, enumerou. Ele lembrou também que a Receita Federal, que apresentou demanda de concursos para 9 mil vagas (o montante de 17 mil vagas solicitadas não inclui o pedido da Receita, uma vez que o envio da solicitação ao Planejamento ainda não foi integralmente confirmado), é essencial para a obtenção de recursos para o desenvolvimento de políticas públicas e para a prestação de serviços, muitos dos quais estando a responsabilidade do Estado prevista na Constituição.
Com mais de 15 órgãos tendo feito requisições de concurso, o representante do Condsef afirmou que todos tem razões suficientes para terem seus pedidos atendidos. “Quando o gestor solicita o concurso é porque já está instalado o caos, a corda já está no pescoço”, avaliou. A confederação considera um erro apontar o setor público como responsável pelo desequilíbrio das contas públicas e colocá-lo como principal alvo das medidas restritivas. A Condsef defende a adoção de iniciativas mais eficientes e que não sacrifiquem direitos, como a fiscalização e punição aos sonegadores, em um primeiro momento – só ano passado eles foram responsáveis por um rombo de quase R$500 bilhões no orçamento, segundo a entidade – e a taxação das grandes fortunas, além da auditoria da dívida pública.
Da costa afirmou que a realização de concursos faz parte da pauta de reivindicações encaminhada ao ministro interino Dyogo Oliveira e que a Condsef aguarda resposta do Planejamento quanto a pedido de audiência com o titular da pasta para discutir os pontos antecipados no documento. Outras representações sindicais devem seguir o mesmo caminho, como, por exemplo, o Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central (BC), como já apontou o presidente regional da entidade no Rio de Janeiro, Sérgio Belsito. O banco encaminhou ao Planejamento pedido de concurso para 990 vagas e caso não consiga autorização poderá ver o seu quadro chegar a nível crítico já no fim de 2017.
Concursos em 2017 e nomeações em 2018
A Polícia Rodoviária Federal (PRF) talvez viva situação mais grave, já que pode perder até 40% do seu efetivo (cerca de 4 mil dos 10 mil ativos atualmente) nos próximos dois anos. No Instituto Nacional de Seguro Social (INSS), perícias necessárias para a obtenção de benefícios como auxílio-doença estão atrasadas por falta de peritos e em consequência da recente greve da categoria, deixando milhares de cidadãos desassistidos.
Por razões como essa, Da Costa concordou que seria importante que as seleções mais urgentes fossem na pior das hipóteses autorizadas para realização em 2017, com a nomeação dos aprovados acontecendo a partir de 2018, quando analistas já estimam uma melhora da economia do país. “O que não pode é parar os serviços públicos por falta de pessoal.” De acordo com a nota divulgada pelo Planejamento no último dia 8, o impedimento à realização de novos concursos não abrange as carreiras de advogado da União, procurador da Fazenda Nacional, procurador federal, de defensor público da União, diplomata e policial federal, em função da autonomia dos respectivos órgãos para promoverem concursos. A Polícia Federal (PF), que planeja abrir 558 vagas de delegado e perito, entretanto, ainda precisa que o Planejamento garanta a disponibilidade orçamentária para o preenchimento das vagas. Ainda segundo Planejamento, a suspensão de concursos também não se aplica às universidades públicas federais, que poderão contratar novos professores e substitutos dentro da reserva de cargos vagos existente para cada universidade.
Estatais, como os Correios, também podem realizar concursos, conforme a necessidade de reposição dos seus quadros, observado o limite de pessoal definido pelo Departamento de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (Dest). E diferente do que alguns concurseiros interpretaram, as restrições anunciadas pelo governo federal não alcançam estados e municípios, que definem seus próprios critérios para a realização de concursos e preenchimento das vagas. Há porém uma discussão em torno do projeto de lei de renegociação das dívidas dos estados (PLP 257/16), que prevê a suspensão dos concursos nessa esfera como contrapartida a flexibilização do pagamento dos valores devidos à União. A proposta já enfrenta a resistência de diversas categorias, inclusive federais.
Fonte: Folha Dirigida