Um dia depois de dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrarem que a inflação de maio ficou mais alta do que o esperado, o Banco Central voltou a subir o tom de sua comunicação de política monetária, avisando que será necessário “determinação e perseverança” para evitar que a forte alta de preços no curto prazo se transmita para horizontes mais longos. A inflação preocupa e deve ser combatida com rigor. Mas seria um erro – e seguramente os membros do Comitê de Política Monetária (Copom) estão cientes disso – calibrar os juros apenas com os olhos no passado.
A variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) em maio, de 0,74%, superou a média das expectativas de mercado calculada pelo Valor Data, de 0,58%. Com isso, a inflação acumulada em 12 meses chegou a 8,47%, aumentando o risco de o IPCA chegar a elevados 9% neste ano.
Um exame mais atento dos dados, porém, mostra que o índice subiu sobretudo devido à correção de preços administrados, incluindo contas de luz, água e loterias, e às altas sazonais de preços de produtos “in natura”, como o tomate e a cebola.
Uma fonte qualificada da equipe econômica ouvida pelo Valor, em reportagem publicada na edição da última quinta-feira, alertou que, neste momento, “o que o mercado precisa fazer é o julgamento de tendência” da inflação. Sob essa perspectiva, houve melhora, embora ainda insatisfatória. Cálculos feitos pelo banco Goldman Sachs apontam que a média dos núcleos de inflação se desacelerou entre abril e maio, de 0,74% para 0,68%.
Na quinta-feira, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC divulgou a ata de sua mais recente reunião, do começo do mês, que subiu a taxa básica de juros em 0,5 ponto percentual, para 13,75% ao ano.
O documento reafirma o compromisso com o cumprimento da meta de inflação, de 4,5%, em 2016 e reconhece que ocorreram progressos desde que começou o ciclo de alta da taxa básica, em abril de 2013, que já acumula 6,5 pontos percentuais. Mas pondera que os avanços não são suficientes, numa indicação de que não considera sua missão já cumprida.
O Copom, na ata, atribui peso relativamente pequeno aos dados divulgados nas últimas semanas, que apontam uma preocupante desaceleração da economia. É o caso da queda de 1,5% no consumo das famílias no primeiro trimestre registrada nas Contas Nacionais e da eliminação de mais de 97 mil empregos formais em abril, capturada nas estatísticas do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
O documento apenas assinala, de passagem, que “o consumo privado mostra sinais de moderação” e que “o consumo das famílias tende a se estabilizar, devido a fatores como emprego, renda e crédito”. Sobre o mercado de trabalho, o Copom reconhece que os dados “confirmam” um início de processo de distensão, com a ressalva de que será preciso observar estatísticas por um período mais longo de tempo para avaliar suas repercussões nos reajustes salariais e na inflação.
O IPCA mais alto que o previsto em maio e o tom mais conservador do Banco Central levaram o mercado financeiro a precificar, com 95% de chance, uma alta adicional de 0,5 ponto percentual na taxa Selic em julho, seguida de uma outra dose de 0,25 ponto percentual em setembro.
Se há exagero na dose de juros precificada nos mercados será possivel saber em uma ou duas semanas, quando o Banco Central divulgar o seu relatório trimestral de inflação, contendo as suas projeções oficiais para a variação do IPCA neste ano e, sobretudo, no ano que vem. Na última edição do documento, de março, os modelos econômicos do BC apontavam inflação entre 4,9% e 5% em dezembro de 2016, o que já estava muito perto do centro da meta.
Será uma grande surpresa se, depois de o Banco Central reforçar sua artilharia de política monetária e de a economia dar amplos sinais de enfraquecimento, as projeções para 2016 não chegarem bem mais perto da meta, se não estiverem exatamente nela.
De qualquer forma, o foco do BC deve ser nas perspectivas futuras da inflação, e não no passado, sob pena de exagerar na dose de juros para conter a inflação e impor sacrifícios desnecessários à economia.
Fonte: Valor Econômico