´Copom encerrou atual ciclo de aperto´, diz Megale

    Na contramão do mercado, que na quinta-feira antes do feriado passou a projetar um ajuste entre 0,25 e 0,50 ponto percentual para a Selic em junho, o economista do Itaú Unibanco Caio Megale acredita que o Comitê de política monetária (Copom) fez, na semana passada, o último aumento de juro do atual ciclo de aperto monetário. Para ele, o ambiente contracionista, em parte pelo ajuste fiscal em curso, e a esperada desaceleração na inflação vão permitir que o BC interrompa a sua rodada de correções. Isso não quer dizer, porém, que ele acredite que a autoridade conseguirá levar a inflação para o centro da meta de 4,5% no ano que vem.

    De qualquer forma, a publicação da ata da reunião do Copom na quinta-feira, com as diretrizes que moveram o colegiado a subir a Selic em 0,50 ponto percentual, para 13,25% ao ano na semana passada, deve servir de guia para os agentes financeiros. 

    Megale projeta que o IPCA de abril diminua para 0,70%, o Produto Interno Bruto (PIB) no segundo trimestre caia 1%, os salários subam menos que a inflação no período, e o desemprego continue crescendo. 

    “Todos esses fatores nos levam a pensar que a Selic deve ficar estável em 13,25% pelo resto do ano”, afirma. 

    A seguir, os principais trechos da entrevista: 

    Valor: O BC evitou sinalizar o fim da alta de juros por entender que a política fiscal ainda precisa ser mais contracionista? 

    Caio Megale: Por enquanto não vejo dessa forma. Acho que as decisões de política econômica estão coordenadas neste começo do ano na linha do aperto fiscal. As sinalizações que o BC vem dando são de que o aperto está em linha com os demais ajustes. Não me parece que ele aumenta a taxa de juros porque o fiscal não vai ser contracionista. Com uma atividade que deve recuar 1,5% neste ano e corte de gastos, claramente a política fiscal está caminhando no sentido contracionista. 

    Valor: O BC sobe mais os juros? 

    Megale: Acreditamos que esse foi o último aumento da Selic do atual ciclo. Entendo que o BC não tem razão alguma para definir a ação de junho. Ele vai esperar os dados que sairão até lá. E, na nossa visão, esses dados vão convencer o Banco CENTRAL a não subir mais a Selic. O IPCA de abril deve desacelerar para 0,70%, o PIB no segundo trimestre deve cair 1%, os salários vão subir menos que a inflação, e o desemprego deve continuar crescendo. Todos esses fatores nos levam a pensar que a Selic deve ficar estável em 13,25% pelo resto do ano. 

    Valor: Dado o ajuste que se viu na curva de DI [na sexta], o fim da alta de juros não causaria ruído em torno da comunicação do BC, gerando mais aumento nos prêmios de risco? 

    Megale: O mercado só reclamaria da comunicação do BC se ele dissesse uma coisa e os dados mostrassem outra. O BC não se comprometeu com nada [na quarta-feira passada], e esse é justamente o objetivo dele, para ter tempo para avaliar melhor os cenários. O mercado entende que as decisões de juro vão ser baseadas nos indicadores econômicos. Isso não quer dizer, porém, que achamos que com essa postura o BC vai conseguir levar a inflação para 4,5% no ano que vem. O IPCA deste ano vai ser muito alto, prevemos 8,2% com viés de alta. Mas ainda que não vá para a meta, deve haver uma desinflação importante, para 5,5% em 2016. 

    Valor: Por que o BC não consegue ancorar as expectativas? 

    Megale: Ele não consegue ancorar para 2016, mas sim para 2017. A inércia inflacionária pesa muito e dificulta essa ancoragem da inflação já para 2016. Mas, como disse, o que o mercado espera pelo menos é que haja uma desinflação considerável no ano que vem. 

    Valor: Ainda é possível pensar em corte de juros em 2015? 

    Megale: A possibilidade do corte existe, mas achamos que o que vai nortear as decisões do BC é a persistência. Não só do BC, mas da política econômica como um todo. O BC deve deixar a Selic em 13,25% por algum tempo para promover o rebalanceamento da economia. No nosso cenário, ele só reduz o juro no primeiro trimestre de 2016. Não está descartado um corte ainda neste ano, mas acho que os argumentos mais fortes são para redução apenas no próximo. 

    Valor: Cortando o juro neste ano ou no próximo, provavelmente estaremos na contramão do Federal Reserve, que deve começar a apertar apolítica monetária em breve. Qual o custo disso para a eficácia da política monetária

    Megale: O risco de alta de juro nos Estados Unidos é mais um motivo para o BC ser bastante cauteloso ao avaliar o momento de cortar o juro. Mas esperamos que o Fed seja gradual nesse movimento, sem grandes impactos para os ativos locais. Por isso, achamos que as condições internas de inflação ainda vão ter um peso bastante importante nas ações de política monetária

    Valor: A recente elevação nas taxas de juros de títulos soberanos dos EUA e de alguns países europeus, em especial Alemanha, combinada com a recuperação das commodities pode impor mais pressão inflacionária ao Brasil e limitar o espaço para o BC parar a alta de juros? 

    Megale: Acredito que não. O câmbio serve justamente para amortecer esses impactos. A recuperação das commodities ajudou no alívio do câmbio, o que ajuda a reduzir ou anular a importação da inflação externa. Além disso, estamos num período recessivo no Brasil, e isso reduz bastante essa inflação de fora. Um terceiro ponto é que o mundo está crescendo menos e, ainda que algumas taxas de juros e commodities estejam subindo, não vejo o cenário externo como inflacionário.

     

    Fonte: Valor Econômico

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