Crise política eleva dólar para R$ 3,13

    Publicação da lista de Janot e panelaço durante pronunciamento de Dilma fazem moeda norte-americana atingir a mais alta cotação desde junho de 2004

    O dólar fechou ontem cotado a R$ 3,13, após uma nova expressiva alta, de 2,39% frente ao real, atingindo a maior cotação desde 28 de junho de 2004. Neste ano, a moeda norte-americana acumula elevação de 17,5%. A divisa abriu cotada a mais de R$ 3,10, refletindo a percepção do mercado sobre o agravamento da situação política do país. “É o resultado do sangue do fim de semana”, afirmou o economista-chefe da Itaim Asset Management, Ivo Chermont.

    Ele se referiu à publicação, na noite de sexta-feira, da lista dos políticos que serão investigados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) no âmbito da Operação Lava-Jato, que investiga a corrupção na Petrobras e às suas repercussões, além dos protestos em várias capitais durante o pronunciamento de rádio e tevê da presidente Dilma Rousseff ,no domingo. 

    O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um dos investigados, acusou o governo no sábado de interferir na escolha dos nomes pela PGR, o que o Planalto nega. Ontem, Cunha elevou a temperatura do mercado cambial, assinalando que o “se o Brasil perder o grau de investimento, as reservas cambiais se evaporam”. Um argumento do governo para acalmar os operadores é o fato de que o país ter em caixa US$ 371 bilhões, nível dos mais altos da história. 

    Além do quadro político ruim, o mau humor dos analistas de mercado se intensificou com a divulgação de um relatório da agência de classificação de risco Moody”s, que analisa as repercussões da Lava-Jato para empresas brasileiras. Segundo a agência, a investigação de corrupção da Petrobras vai afetar de forma negativa entes públicos e privados, sobretudo na cadeia de produção de petróleo e gás no Brasil, nos setores de construção e de infraestrutura e no mercado imobiliário do Rio de Janeiro. 

    A Moody”s espera lucros menores para o setor financeiro, especialmente se os bancos públicos forem obrigados a ajudar a Petrobras a contornar as dificuldades de financiamento que a companhia enfrenta. Na avaliação da agência, o governo vai se esforçar para evitar as restrições de crédito da petroleira e também, de modo mais amplo, de outros setores da economia.

    O economista Felipe Chad, analista de investimentos da DXI, ressaltou que, diante desse quadro, os investidores estrangeiros estão vendo, com cada vez mais restrições, trazer recursos ao país, o que pressiona para baixo o câmbio. “O mercado está irritado com a Dilma e com o Brasil.”

    Um fator que agrava o quadro é o fato de que perspectivas de melhora não são facilmente percebidas. “A desvalorização do real reflete a instabilidade política, e isso não vai se resolver da noite para o dia”, notou o gerente de Câmbio da Treviso Corretora, Reginaldo Galhardo. 

    Até a sexta-feira passada, o dólar se valorizava significativamente em relação a outras moedas além do real, em função da possibilidade de antecipação do ciclo de aumento de juros nos Estados Unidos diante dos sinais de recuperação econômica do país. Ontem, porém, o movimento foi claramente do Brasil, tanto que outras moedas também se valorizaram: o euro subiu 1,97% e fechou cotado a R$ 3,39. 

    Segundo Galhardo, da Treviso, as corretoras que atuam no mercado de câmbio não comemoram essa alta. “Muitas pessoas que iriam viajar, por exemplo, mudam os planos. E também várias empresas adiam negócios, áespera de uma cotação menor.” Em um mês, a Treviso teve queda no faturamento de cerca de 15%. 

    A cotação do dólar comercial é distante do que encontra alguém que pretenda comprar um pequeno montante, apenas para viajar. Pessoas físicas tiveram que pagar ontem mais de R$ 3,30. Para quem leva papel moeda, a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) é de 0,38%. Para quem usa cartão, de débito ou de crédito, é bem maior: 6,38%. 

    Os analistas veem apenas uma possibilidade de conter a alta da moeda norte-americana: maior intervenção do Banco CENTRAL (BC) no mercado. Atualmente, a autoridade monetária oferece diariamente 2 mil contratos de swap, o que equivale à oferta de dólar no mercado futuro. Além disso, tem rolado 70% dos contratos que vencem. O aumento da intervenção poderia ocorrer por meio da oferta de um número maior de contratos, pela ampliação da rolagem ou por leilões extraordinários no mercado à vista. Mas a equipe econômica do governo tem dado sinais de que não pretende ampliar a atuação no mercado de câmbio.

     

    Fonte: Correio Braziliense

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